Google+ Estórias Do Mundo: janeiro 2011

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Homohistória (Introdução)

Eu ia escrever um texto sobre o Egito, mas me dei conta que antes de começar a falar sobre relações homoeróticas no passado é preciso deixar claro um conceito antes. Uma idéia importantíssima que se não for levada em consideração toda vez que falamos de relações amorosas e sexuais entre dois homens ou duas mulheres pela História da humanidade pode destruir totalmente o seu argumento. O fato é: não existem gays na História Antiga ou na História Medieval, ou mesmo na História Moderna. Entre os homens que faziam sexo na Atenas clássica, os amantes guerreiros espartanos, os eunucos persas, os homens-mulheres do Egito, os sacerdotes de Astarté, as alunas de Lesbos, Gilgamesh e Eridu, os homens retratados no Kama Sutra, não existem gays. Não existem gays nos mosteiros medievais e nem sendo acusados pela Inquisição. Não existem gays entre os humanistas, Michelângelo e Leonardo da Vinci não são gays. Como também não os são os meninos castrati, nem os atores japoneses do teatro Kabuki. 
Os primeiros homossexuais só aparecem no século XVIII como doentes a serem tratados, junto com as mulheres histéricas e os que traziam consigo um infeliz complexo de Édipo, ou sendo processados na Inglaterra como foi Sir Oscar Wilde, os primeiros gays só aparecem no primeiro raiar do século XX, na noite alemã, perseguidos nos Estados Unidos, lutando por direitos na Inglaterra, usando couro e bigodões. 
Ser gay é mais do que a relação homoerótica entre duas pessoas, ser gay é uma identidade e uma cultura compartilhada por um grupo social característico do Ocidente. Sendo assim, não podemos chamar outras pessoas que membros de outra cultura e de outro tempo por uma identidade social que é utilizada nos últimos dois séculos (XX e XXI, a saber). Fazer isso é o crime capital para a História chamado anacronismo.
Fazer com que pessoas de outro tempo e espaço se comportem tal qual nós nos comportamos hoje é um erro bastante comum na verdade, que acontece porque sempre pensamos o outro através de nossa própria vivência, isso você pode chamar de egocentrismo, eu prefiro chamar de lente cultural, como diz Geertz. É comum, mas é algo que devemos combater. Em nós mesmos e esse já é um exercício.
Ao perceber de que relações sexuais, no passado, acontecerem entre dois homens ou duas mulheres isso não os torna imediatamente gays. O termo que devemos usar aqui no caso, como já utilizei antes, são relações homoeróticas por acontecerem entre pessoas iguais (homo). E porque não os torna? Porque elas se davam de forma distinta das que se dão hoje. 'Tá, eu não estou dizendo que eles enfiavam seus pênis em outros lugares mágicos, apesar que na Grécia havia o sexo interfemural (não sabe o que é isso, vai ter que esperar eu falar sobre a Grécia então), mas o relacionamento entre estas pessoas se dava diante de outras regras que não são as mesmas que seguimos hoje no mundo contemporâneo. Eles não são gays, mas posso garantir que é uma fato que sempre existiram relações homoeróticas entre homens e mulheres, os registros históricos estão aí para provar e pretendo apresentar alguns deles para vocês por aqui agora. Sigam-me os bons.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

O Sonho E A Interpretação



O Sonho


Tenho um sonho que costumeiramente se repete desde que vim morar em Belo Horizonte. Eu sonho com minhas antigas escolas, onde cursei o ensino fundamental ou médio. No sonho eu deveria voltar, apesar de já ter concluído a faculdade, voltar porque eu não havia sido aprovado em disciplinas como Física ou Biologia. E tinha que refazer os cursos ao lado de crianças. Em alguns casos, sonho com professores que tive na escola ministrando aulas para mim, também alguns colegas de escolas em que trabalhei, mas costumeiramente são os próprios professores que tive na faculdade, no mestrado ou no doutorado - ou seja, professores de história -, sendo todos eles gays, todos, os professores que me ensinam Física ou Biologia. No sonho, inclusive, eu tenho sempre que explicar a um destes professores, que me conhece, o que faço ali,  dizendo que falta uma disciplina apenas para eu me formar, para eu completar meus estudos, mesmo já estando formado na universidade, lembrando que sempre preciso assistir apenas às aulas daquela disciplina para finalmente me formar.


A Interpretação


Acredito que os sonhos repetidos expressam desejos que você mantém, não ncessariamente escondidos, mas um desejo ou crença profunda que se marca no seu subconsciente. No caso, meu desejo por amor. Mas não o desejo de ter uma pessoa ao meu lado, o desejo de sexo ou uma carência, isso meu subconsciente transforma em sonhos eróticos e bruxismo, respectivamente. Meu desejo de amor é a falta de uma experiência única que me tornaria completo, completo em minha existência. Que fique claro, no entanto, que não quero dizer com isso que sou um ser humano incompleto, que só achando minha alma gêmea, minha metade andrógina, eu ficarei inteiro novamente, não é isso. O que sinto falta é da experiência em minha existência, na minha formação como ser humano. Na escola da vida, sendo bem clichê, eu pulei algumas aulas. Aos quase trinta anos ainda me sinto uma criança que tem muito o que aprender ainda.



sábado, 22 de janeiro de 2011

Epílogo

, em Belo Horizonte - MG, Brasil
Hoje, dia 22 de janeiro de 2011, completo três anos vivendo em Belo Horizonte. E qual o balanço desses anos? Vim para BH com dois sonhos a realizar, além do meu doutoramento, é claro! Eu pretendi aqui ser independente financeira e emocionalmente de minha família; além disso, certo de que em Natal era impossível conhecer alguém capaz de se interessar por mim, achei que mudando de ares, de cidade, as coisas poderiam acontecer diferente. 
Bem, long story short, nenhum desses sonhos se realizou. No entanto, isso não foi necessariamente ruim. Sobre minha família, por exemplo, eu me tornei ainda mais dependente. Admito hoje que se as coisas tivessem acontecido como eu esperava quando vim para cá, agora três anos depois, eu já teria perdido o contato completamente com a minha família. Eu os encarava como pessoas com o qual eu não tinha a menor ligação, além de sanguínea, e acreditava que não tinha porquê manter algum relacionamento com eles. Mas os problemas financeiros que tive aqui provaram que apesar da falta de carinho que as relações entre eu e meus pais, e eu e meus irmãos, se realizam, eles estariam lá por mim.
Foi surpreendente. O afastamento, a mudança de cidade, fez com que eles percebesse que se não me tratassem de uma outra forma eu poderia simplesmente ganhar o mundo e nunca mais vê-los. Minha família é, na verdade, muito próxima, todos os tios, primos, avós, irmãos, moram todos no Rio Grande do Norte, sempre em cidades próximas, isto faz com que as pessoas não percebam que sentem falta uns dos outros, pois nunca estão verdadeiramente distantes. Meus irmãos e meu pai foram quem mudaram mais radicalmente. Meus irmãos agora me abraçam e, outro dia, meu pai falou: "Eu te amo, viu filho?", não sem reafirmar que era minha mãe que exigia que ele dissesse aquilo, mas ele disse. Mudanças radicais.
Já o sonho amoroso, bem, acho que nesse campo foi o que eu aprendi mais. Percebi que não era Natal, exatamente, que impedia alguém de gostar de mim, aprendi que não era a cidade o motivo para a minha infelicidade amorosa. Em Belo Horizonte, a mesma coisa aconteceu. Aqui também, apesar da cidade diferente,  nada fez com que alguém se interessasse por mim, verdadeiramente, e  ao ficar ciente disso, eu testei outros limites, explorei até onde eu sou capaz de ir no que se refere ao sexo, porém, não conheci o amor, além da tela do computador.
Exatamente como em Natal, a coincidência de uma distância também de exatamente 10h, o único namoro veio pela internet. Entre as cententas de pessoas que conheci na capital mineira, nenhuma foi capaz de se interessar por mim e isso me ensinou que o problema não está em mim ou na cidade em que eu estou. Não importa! Simplesmente não é para acontecer. Talve não seja para acontecer por agora, talvez nunca venha a a acontecer, isso eu ainda não sei responder. Mas essa é a verdade. 
Mas ente as centenas de pessoas (e não, não é exagero) eu fiz algunas amigos, alguns que provavelmente levarei para a vida toda; outros que no entanto não os verei nunca mais, passaram e o dia que, se por acaso, cruzar novamente com ele, provavelmente nem os reconheça mais. É o que dá conhecer tantas pessoas, não é?, nem todas ficam.
Meu período em Belo Horizonte está se encerrando, este é o último ano da temporada mineira deste blog, e não tenho novos planos para o futuro, quer dizer, eu preciso de um emprego agora, né?, depois de tanto estudo. Mas não espero mais tanto do meu futuro, não sei onde estarei em 2012, qual será a nova temporada a começar?

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Afinal, Somos Amigos.

, em Belo Horizonte - MG, Brasil
Saímos para beber na casa dele, comemorávamos o fim de um trabalho que levara dois anos para ele concluir, compramos cervejas, vodca, suco de tomate e pimenta, ainda havia meia garrafa de martini na casa dele que eu havia deixado lá de outras bebedeiras, afinal, somos amigos. Ele queria fazer molho teriaki com empanados de frango para acompanhar as bebidas, outros amigos também foram convidados, mas uma noite de quinta-feira em Belo Horizonte não é um dia para comemorações de alguém que prometia, naquela noite, só parar quando estivesse completamente bêbado. E eu o acompanhei, claro que o acompanhei, afinal, somos amigos. A vodca e o suco de tomate do Bloody Mary descia queimando por sua garganta,  para mim é como beber molho de tomate, então me mantinha no pack de Stella Artois, a tv ligada mudava da novela para o Big Brother para um outro programa que o seguiu, era a Globo que ele assistia enquanto eu bebia e conversava com amigos pelo twitter. Dividíamos impressões e brindávamos a um trabalho terminado. A noite durou tanto quanto o álcool e vários cigarros permitiram. Eu já havia terminado todas as cervejas e mais a meia garrafa de martini quando deitamos, os dois bêbados na cama dele. De casal, para quê se dar ao trabalho de arrumar outro quarto, outra cama, vamos dormir juntos, como já fizemos antes, afinal, somos amigos. Quando ele falou que estava com tesão, de pau duro, e queria sexo. Rimos juntos, afinal, somos amigos. Eu, brincando, falei que queria ver e peguei no pau duro e ele pediu para ver o meu também e eu disse que não estava tão animado quanto ele, mas deixei que ele visse e ele elogiou, dizendo que era um pau bonito, elogios que amigos fazem, afinal, somos amigos. Foi quando uma proposta surgiu. Uma idéia de fazermos sexo, sem compromisso, sem ligações emocionais, só porque ele estava com tesão e eu não era passivo há mais de um ano. Ele pediu: "Deixa eu te comer?". Pensei na proposta por alguns segundos e pensei: "Porque não? Afinal, somos amigos!". Ele, antes de qualquer coisa acontecer, ainda teve crises de consciência afinal eu quero um relacionamento sério e de lá não ia, obviamente, acontecer nada mais do que sexo, tranquilizei-o dizendo: "Eu sei o que estou fazendo aqui, não sou nenhum menino, somos apenas amigos". Gozamos, e viramos cada um para seu lado da cama, ainda amigos, mas com um elogio dele ecoando: "Nossa! Que bunda gostosa que você tem, hein, amigo?"

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Cristandade: I Carta de São Paulo Aos Coríntios

Eu sei que falar da Bíblia é mexer em vespeiro, e que eu vou acabar bem atacado aqui, porém, eu sou historiador e fiz um juramento em nome da verdade e não posso me furtar a opinar sobre um assunto que fere gravemente todos. Sei também que vão me aparecer com aquele discurso de que futebol, política e religião não se discute, para mim isso é balela, é de quem quer evitar atrito e não parecer antipático, opiniões e interpretações estão aí para serem ditas. Então, espero dar a vocês, meu leitores, alguns argumentos para rebater os argumentos de religiosos por aí. Começo, não por acaso, pelos versículos mais importantes contra os relacionamentos homoeróticos em toda a Bíblia, escrita também pelo evangelista mais importante. São Paulo é, sem dúvida, o homem que definiu as regras que a Igreja seguiria dali em diante. Uma tradução recente, de 2004, distribuida gratuitamente nas ruas das grandes cidades brasileiras, ganhei a minha na porta da UFMG aqui em Belo Horizonte, traduz o texto desta maneira:

1COR 6:9 Ou não sabeis que os injustos não herdarão o reino de Deus? 
Não vos deixeis enganar: nem fornicadores, nem idolátras, nem adúlteros, 
nem efeminados, nem homossexuais,
1COR 6:10 nem ladrões, nem gananciosos, nem beberrões, nem injuriadores, 
nem roubadores herdarão o reino de Deus.

Vou ignorar os problemas de tradução, como a inclusão de uma palavra inexistente na época que o texto foi escrito, homossexuais, e as óbvias consequências políticas da presença de uma palavra como esta dentro de um texto sagrado. O problema com a Bíblia  não é o texto sagrado, em si, é sua tradução do grego e hebraico, para o latim, primeiramente, e depois para as linguas vulgares (português, inglês, francês, italiano, etc), a tradução para estas linguas modernas é filtrada pelo posicionamento politico e intelectual do tradutor, além da distância, muitas vezes ignorada pelo tradutor do universo cultural em que São Paulo escreveu, e o nosso universo cultural atual. Traduzir como processo de escritura é muito mais um processo no qual o texto precisa ser refeito, para aproximar-se do sentido original, do que um processo de substituição de uma palavra pela sua correspondente. O texto grego, do qual é extraído o seguinte texto, diz assim (tradução minha):


1COR 6:9 h ouk oidate oti adikoi qeou basileian ou klhronomhsousin mh planasqe oute pornoi oute eidwlolatrai oute moicoi oute malakoi oute arsenokoitai
Não sabes que os injustos não receberão a parte que lhes cabe no Reino de Deus, não tome isso por errado, nem os que se prostituem, nem os idolátras, nem aquele que comete adultério, nem os molengas, nem prostitutos

1COR 6:10 oute kleptai oute pleonektai ou mequsoi ou loidoroi ouc arpageV basileian qeou klhronomhsousin
nem os ladrões, nem os ricos, nem os bêbados, nem os excessivamente maledicentes, nem os vorazes receberão a parte que lhes cabe do Reino de Deus

Compare-se os trechos em negrito. malakoi que é traduzida por efeminado, deveria ser traduzida por molenga, no sentido de "aquele que foge da batalha", "covarde", efeminado até, mas no sentido de "aquele que não cumpre as suas obrigações de homem por não participar da guerra como os outros homens". arsenokoitai já significa, ao pé da letra, "aqueles que fazem sexo com homens", contudo, para o universo grego em que Paulo vivia significava exatamente prostitutos, sobretudo os prostitutos sagrados de deusas como Afrodite e Astarté que além de se prostituírem eram sacerdotes de deusas pagãs, dado que a prostituição comum é nomeada por pornoi e também condenada. 
O problema, no entanto, é que a tradução da Bíblia é considerada, tanto nas Igrejas Católica quanto as Protestantes um momento de iluminação que só pode acontecer com um membro iniciado, as Igrejas só admitem a tradução de um membro de suas próprias fileiras, e, convenhamos, se ele aprendeu a vida toda que o malakoi deve ser traduzido como "efeminado", se ele acredita nisso, porque ele vai vasculhar a história e literatura grega? E não é dificil: existem inúmeros momentos na tradição literária grega que nos foi legada em que o sentido original de malakoi continua sendo usado e traduzido corretamente. A pergunta que deve ser feita, ao fim, é a quem interessa manter a mesma tradução da Bíblia apesar que qualquer dicionário de grego dizer que ela está enganada? Questionem-se, pelo amor de Deus!




sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

"Só Amanhã de Manhã"

, em Belo Horizonte - MG, Brasil
Ele havia sumido tempo o suficiente para eu esquecer seu nome bíblico e apagar seu telefone TIM da minha agenda. Eu já havia esquecido o som de sua voz quase efeminada e os músculos do seu corpo magro. Na última vez que ele havia deitado em meus lençõis, havia erguido-se de súbito no momento em que me neguei em ser passivo com ele. Naquela vez, ele apenas disse que estava tarde, que tinha que ir, que sua mãe o esperava. E foi. Mais rápido do que consegui argumentar.
Agora, mesmo assim, ele voltara a minha cama, com seu nome bíblico, seu telefone TIM, sua voz quase efeminada, e os músculos do seu corpo magro. Falara no MSN, hoje já havia sido excluído, mas não bloqueado, que deveríamos repetir e eu concordei. Ele então voltara, para cavalgar meu membro túgido e despesar seu gozo nos pêlos negros do meu peito que agora insistem em tornar-se, apesar dos meus quase trinta anos, em brancos. Gozou sorrindo, jogando a cabeça para trás, e gemendo alto. E como era apenas isso que ele queria, gozar com um pau duro dentro dele, gozou, se levantou e vestiu sua roupa. Novamente rápido, antes que eu pudesse argumentar qualquer coisa. "Preciso ir, se eu não pera este último ônibus que sai agora a 2h"... e eu, com um sorriso amarelo, de quem se vê usado, complemento: "só amanhã de manhã".

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

"Quem Inventou o Amor?"

"Quem inventou o amor?" é uma pergunta retórica que inúmeros poetas têm se feito, no entanto, ironicamente, ela tem sim uma resposta. Johann Wolfgang von Goethe. Goethe, escritor alemão do século XIX, inventou o amor, e não somente como nós o conhecemos hoje, inventou um sentimento até então inédito na história da humanidade.
Duvida? Então deixe-me explicar. Até o livro de Goethe, Os Sofrimentos do Jovem Werther, de 1774, não existe registro histórico algum sobre o amor. A palavra, se existente,  significa um outro sentimento, uma outra relação com o outro, distinta desta inaugurada pelo pai alemão do romantismo. Em muitas linguas a palavra amor não existia, um exemplo é o grego antigo que possuí eros, que pode ser melhor traduzida por relação sexual, ou phília, que deve ser traduzida ou por amizade ou mesmo uma relação de interdependência, e num grego mais recente, agape, que deve ser traduzido por uma doação espiritual. Talvez se argumente aqui, que a palavra pode não existir, mas a ideia provavelmente já existia. Historicamente, isso é uma falácia. A História e a Antropologia têm provas de que, quando uma palavra não existe dentro de um sistema cultural, isso quer dizer que o conceito preso a ela também é inexistente, é exatamente para poder exprimir conceitos novos que as palavra surgem, é isso, explica a Linguística, que explica porque uma língua se desenvolve, porque novas ideias e conceitos são introduzidos no universo cultural. 
Mas o que é o amor? Definamos então. O amor, como nós o conhecemos hoje, é um sentimento de bem-querer que se distingue dos outros pelo seu componente de eternidade. Ele, pressupõem todos, surge para ser eterno, se não o é, não era "amor de verdade". Era exatamente esta ideia que até Goethe ninguém conhecia. Até o romantismo as pessoas faziam sexo e contraíam casamento para reunir a propriedade de duas famílias, Goethe inventou em Werther que essas duas relações deveriam ser permeadas por um sentimento sublime de afeto entre as duas pessoas que fazem sexo ou as duas pessoas que se casam. Não é por coincidência que a ideia de homossexual surge no mesmo período, distinto do heterossexual. Pensem comigo, se antes ao amor, um homem poderia perfeitamente fazer sexo com outro homem e depois casar-se com uma mulher; após o amor, o comportamento social que era exigido dele, era que ele fizesse sexo apenas com quem ele amasse, se ele gostava de fazer sexo com homens necessariamente ele era obrigado a amar apenas homens para, um dia, casar-se com um homem com o qual o seu afeto duraria eternamente. A oposição hetero - homo se funda exatamente quando se proibe que os homossexuais possam amar outra pessoa que não pertença ao mesmo gênero que ele. 
Talvez, aqui, também, vocês argumentem que obviamente os homens já possuíssem o sentimento, a capacidade de amar alguém, eternamente, porque esta é uma característica inata, natural, que o ser humano, através dos tempos, sempre possuiu. Desculpem afirmar, mas este argumento é um sofisma grosseiro! Quanto mais me dedico a História, mais percebo que nenhuma característica humana é inata. Absolutamente tudo o que consideramos características imanentes de um ser humano são constructos sociais que nos são repassados por meio da tradição. Essa capacidade de gostar, de relacionar-se socialmente, realmente é pré-histórica, afinal os "homens das cavernas" viviam em bandos, mas essa associação visa a proteção do grupo, o desenvolvimento desses laços (de amizade, parentesco, afeto) são uma necessidade do grupo social para manter-se coeso. 
O amor, como o definimos hoje, todavia, não é uma "evolução" deste processo, mas uma guinada radical para um nível psicologizante da relação social. O amor não é importante apenas, agora, para a sobrevivência do grupo social, ele é garantia de existência do próprio indíviduo. Afinal, diz Vinícius, quem não amou, não viveu. O amor, novo deus tirano, é junto com a individualidade, construída ainda mais tarde, centros da vida contemporânea e capitalista, e tudo isso por causa do sucesso que os sofrimentos daquele jovem de colete amarelo fez na Europa ainda na Época Moderna. 
Você, meu caríssimo leitor, pode então agora dizer: "'Tá, o amor é um invencionisse de um alemão maluco! E agora o que a gente faz? Dá pra escapar?". Bem, definitivamente este não é o nosso objetivo aqui. Até porque não acredito que seja possível, a não ser que você possa apagar um século e meio de História. Somos filhos de nosso tempo e, sendo assim, imersos em nossa historicidade, só podemos reagir a própria vida através da percepção que a tradição nos lega através da arte, da escola, dos romances, das novelas, das relações sociais, do que aprendemos com nossos pais, que aprenderam com os pais deles, etc. E o amor é parte deste homem que o século XXI conheceu. Só nos resta nos render a este deus tirano e colocar rosas (vermelhas, por favor) em seu altar.

sábado, 8 de janeiro de 2011

Nas Primeiras Horas de 2011 (parte 1)

, em Belo Horizonte - MG, Brasil
A comemoração do meu Reveillon começou bem cedo naquele dia 31. Eu e o Rafa convencemos os mineiros e anti-sociais do Braccini e o Wander a, finalmente, nos encontrarmos e sairmos do virtual. Porque se vocês não sabem, mineiros são bichos difíceis de sair das tocas virtuais, você precisa ter muita calma, senão eles se assustam e fogem. Sabe, é como caçar passarinho, tem que preparar a armadilha, e quando eles se aproximarem você puxa o alçapão. Contudo, apesar da chuva, e de todos os lugares fechados na cidade por causa do Ano Novo, encontramos um café aberto e ficamos jogando conversa fora. Foi no café que o Bê, meu amigo, nos encontrou e nos despedindo do Braccini e Wander. Fomos então eu e o Rafa  até a casa do Bê onde nos aprontaríamos para as festividades de Reveillon.  
Os planos para a noite de Ano Novo era primeiro ver os fogos no Alto de Santa Lúcia, que apesar da chuva e o frio intenso, foi lindo. E me desculpem a metáfora (mais gay ever) mas parecia que tinham jogado glitter sobre a cidade. Do Alto de Santa Lúcia podemos ver toda a cidade, da região sul até alguns municípios vizinhos como Confins, então, nos últimos momentos de 2010, você via pessoas mais adiantadas que começavam a disparar seus fogos, até, a meia-noite, toda a cidade ficar iluminada pelos fogos de artifício. Ficamos os três lá por volta de dez minutos, quando nos dirigimos a segunda parte da noite. A festa de Reveillon na casa do namorado de um amigo, Bold, namorado do Rei.
Chegamos, e na porta ainda, enquanto eles nos abraçavam e desejavam felizes um bom ano novo, um dos convidados, o Vítor, vira para mim, e antes de desejar Feliz Ano Novo, aponta um convidado que eu não conhecia e diz: "Que acha? Trouxemos para te apresentar". Eu, que nessas situações perco totalmente a falta de vergonha que Régulos me deu, corei e apenas sorri. No apartamento, enquanto bebiamos vinho, champagne, cervejas e alguns copos de martinis, ele volta para mim e pergunta: "Que achou?". Travado, novamente apenas sorri, foi quando Rei, direto e exigindo uma resposta, pergunta: "Então, é o seu número?".  E realmente era. Bach tem olhos claros e um corpo bonito, é um tantinho efeminado, mas quem não é né? Bem mais alto que eu, definitivamente, era alguém que chamava atenção. Ele então anuncia: "Deixe comigo!". E saiu. 
Continuei com meus amigos, entre pernis, tortas de frutas vermelhas, tiramisú e salgadinhos, e algumas taças de martini, quando o Rei volta e me pega pelo braço e me convida: "Vamos ali, moço, dar uma voltinha". E me faz sentar junto ao grupo que o tal Bach estava. Conversavam sobre música e tópico era Kate Perry. Já cheguei dizendo que preferi o primeiro cd, que ela se vendeu ao mercado fonográfico; ele, não entendeu muito bem o que eu queria dizer com aquilo, mas afirmou que as músicas do segundo eram mais pop e ela havia alcançado um patamar digno de Britney e Lady Gaga. Conversamos algum tempo, contudo, logo, ele se volta para os outros e continua a conversar com os amigos dele, ele era amigo do dono da casa, e o Rei começa a me fazer caretas indecifráveis sentado do meu lado. Não aguento e falo: "Eu realmente não estou entendendo o que você quer me perguntar". E levanto, vou preparar outro martini para mim e, minutos depois, Rei aparece atrás de mim. "Então, rola?". Eu confirmo, corado, mas confirmo. Ele sorrindo volta a sala dizendo novamente: "Deixa comigo!".   

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

De Coração Aberto


Tenho ouvido criticas e mais criticas ultimamente. Reclamam do personagem que eu criei. Aqui no blog e na vida. Alguns comentários perguntam porque não mostro o meu rosto, porque não dou minha cara a tapa; outros dizem que sou chato e que este blog só serve para eu bancar de vítima. Que este blog só serve para eu reclamar. Dizem que preciso de tratamento psiquiátrico, que meus traumas de infância definem toda minha vida. Que preciso urgente de terapia. Dizem que vivo de auto-piedade, e que não tenho auto-estima. Aparecem rótulos e definições. Dizem: "Você devia parar de fazer isso", "Você não devia ser assim". 
E eu tento. Juro que tento. Controlo meus sentimentos, controlo meus medos e frustrações, me calo. Jogo tudo para debaixo do tapete, porque os sentimentos, os medos, as frustrações continuam lá. E elas doem. Doem inclusive fisicamente, porque nosso coração precisa mostrar que está dolorido e machucado, e se as lágrimas não caem, a dor se torna física. Caímos doentes. Dores em membros fantasmas. Mas estou impossibilitado de falar porque os amigos e os leitores cansaram de ouvir que "está tudo na mesma", e eu também cansei de falar. Não que eu fizesse drama e apenas fingisse ser a vítima da situação, mas do que adianta eu agora dizer q era vítima mesmo? Quem aqui vai acreditar? Ninguém! 
Mas ficar calado dói. O que quero sim é rasgar as máscaras e aparecer nú, em pêlo, para todos. Quero chorar e ver minhas lágrimas molhando meu rosto e minha barba. E foda-se se você e qualquer outro acham agora que eu só quero aparecer, garantir atenção, bancar o coitadinho, foda-se! Desculpem, mas mesmo sabendo que muitos sofrem mais do que eu, e eu sei, não sou nenhum parcóvio!, como Caetanto já disse uma vez: "cada um sabe a dor e a delícia de ser quem é". Infelizmente nenhum de vocês consegue entender porque me dói tanto estar sozinho. Infelizmente meu canto não tem eco e, no fim, mesmo gritando à multidão eu continuo sozinho. 
E como me dói estar sozinho... e como me dói a certeza de que isso não vai mudar... mas isso vocês não querem ouvir, porque é só o Foxx reclamando da vida, fazendo drama e bancando a vítima. "Vai se tratar, Foxx". Eu sei. Eu sei.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Deus Me Livre

O que se passa na cabeça de alguém que acha que pode usar você? 
Que simplesmente levanta e veste a própria roupa, anunciando que tem que ir, após gozar? 
Que te beija e se afasta, voltando aos seus amigos, como se você não significasse nada? 
O que se passa na cabeça dessas pessoas? 
A elas não interessa a tua intimidade, e muito menos o teu nome? 
A elas não interessa quem você é apenas tua boca, teu pau, teu cu? 
O que se passa na cabeça dessas pessoas? 
Essas pessoas não se interessam de fato pela tua companhia, apenas por um orgasmo fácil?
Essas pessoas vivem somente em um hedonismo cruel que não leva em consideração o outro?
O que se passa na cabeça dessas pessoas?
Elas não tem coração, emoção, só tesão?
Quem são essas pessoas?
E, Deus me livre delas. 

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Promíscuo, Ser ou Não Ser?

Uma critica comum, sobretudo, aos homossexuais masculinos é a acusação de que todos são promíscuos, o que torna seu comportamento um risco a saúde, a sua própria saúde, e a saúde do corpo social ao espalhar doenças sexualmente transmissíveis dentro do grupo heterossexual também. Essa crítica foi inclusive absorvida pelos homossexuais também que passaram a se questionar, a criticar e a discriminar aqueles que tem um comportamento sexual que foge ao padrão heterossexual, isto é, monogâmico.
Isso é necessário explicar. A monogamia é uma invenção heterossexual, cristã e burguesa. Durante toda a Antiguidade e boa parte da Idade Média, o conceito de monogamia era inexistente no Ocidente; como o é até hoje no mundo islâmico e em boa parte dos países orientais, como Índia, Rússia e Uzbequistão, com excessão de países como o Japão, que têm intríssecas relações com o Ocidente. Nesses países é comum que um homem, dado suas condições financeiras, possa ter sim mais de uma esposa. Notemos aqui, que, mesmo aonde a poligamia é permitida, ela só é permitida para homens (a excessão se faz em algumas tribos africanas onde a poliandria acontece). Durante a Idade Média, para citarmos alguns exemplos, apesar de um rei casar-se normalmente com uma única mulher, era permitido a ele que mantivesse concubinas que poderiam gerar-lhe filhos bastardos, que poderiam ascender ao trono, caso a rainha não lhe concedesse um filho varão. Qualquer homem, na verdade, tinha este privilégio. Contudo, é a partir da Idade Moderna, quando o sacramento do casamento é reafirmando dentro da Igreja Católica, dentro das Reformas visando combater o protestantismo, juntamente com a ascensão burguesa e a necessidade de controle da herança (seja ela a fortuna de um comerciante ou o trono de um país), que a monogamia torna-se importante dentro do mundo ocidental.
A monogamia tornou-se então um tabu até ser desafiada, na década de 1960, pelos hippies. O movimento hippie criou a ideia de amor livre e liberação sexual. Ele ia de encontro aos valores burgueses da classe média como as críticas religiosas ao prazer, uma contestação profunda sobre a ideia de pecado, sobretudo o pecado da carne. Politica e socialmente, ele rompia com a subordinação feminina. Permitia a mulher ser dona do próprio corpo, de garantir a mulher o direito ao prazer sexual, e com a introdução da pílula, permitiu que a mulher pudesse usufruir do prazer sexual sem correr o risco de ficar grávida. Desse movimento, as relações homoeróticas foram libertadas do pecado da sodomia. Para explicar, sodomia são todos os pecados sexuais que não geram filhos, sexo oral com uma mulher, sexo anal com uma mulher, também são consideradas sodomia, contudo, a sodomia perfeita é o sexo anal com um homem com ejaculação. Libertos do pecado, libertos da obrigação social de gerar filhos, os gays, a partir desta década resolveram fazer sexo onde, como e com quem quisessem. Os gays, neste momento, pensavam: "Nós não somos heterossexuais, porque repetir então um valor que só faz sentido dentro da cultura deles?". Era um momento em que ser gay queria dizer, necessariamente, negar todos os valores que a sociedade burguesa, de classe média e heteronormativa os impunha. São atacados com veemência os condeitos de Família, se discute se o padrão pai-mãe-filho-filha é a família perfeita; o padrão de Gênero, o visual andrógino é buscado; e a Monogamia. Naquele momento, fazer sexo com quinze pessoas em uma noite era um ato político. Mas que fique claro, o Amor Livre hippie não advogava simplesmente um número múltiplo de parceiros sexuais ou relacionamentos sexuais a curto prazo, é importante reforçar que ele pretendia que as relações sexuais não fossem reguladas nem pela lei (lembre que ser gay era crime punido com prisão na Inglaterra, por exemplo, até 1970) ou pela Igreja.
Contudo, apesar disso, não podemos negar que todo homossexual - comumente - advém de uma família heterossexual, então é educado para seguir os padrões heteronormativos. A utopia hippie não previra isso. Não previra que conforme as gerações se renovam, são os padrões heterossexuais que se renovam com eles, suplantando as "conquistas" homossexuais. Foi assim, em meio a explosão da AIDS, que os homossexuais passaram novamente a criticar-se, uns aos outros, por causa do que seria, agora, um comportamento de risco. Argumento que foi também utilizado por grupos anti-homossexuais, os quais passaram a afirmar que a AIDS era um castigo divino que visava extinguir aquele comportamento anti-natural. Era, por fim, um argumento homofóbico que passou a ser repetido dentro das fileiras homossexuais, afinal uma teoria católica começava a ganhar força nesse momento. Existe, dentro da Igreja Católica, um grupo que aceita os homossexuais como homens, filhos de Deus, porém homens e mulheres cujo corpo é testado por Deus pelo pecado da luxúria, ao qual eles devem resistir. Surge então a ideia de que o homossexual assexuado, que não tem relações sexuais, que não tem relacionamentos, pode ser aceito entre as fileiras heterossexuais, isto é, surge a ideia de que o homossexual que não aparenta ser gay, isto é, não é efeminado nem promíscuo, tem o direito a sua própria vida.
Além disso, outra questão importante é quando comumente fazemos a diferenciação de que homens gays são promíscuos enquanto mulheres lésbicas são sempre monogâmicas. Quando se conta isso, normalmente, explodem milhares de explicações (pseudo)científicas sobre a necessidade masculina de perpetuar seus genes, e isso explica o comportamento de homens em geral de serem infieis. Vou até retirar os parênteses: pseudo-científicas mesmo. Se essa necessidade humana fosse real, se nossa necessidade sexual fosse um impulso genético, mulheres não fariam sexo com homens magros, com óculos, carecas, baixos, etc., estes genes já teriam sido estirpados há muito tempo do nosso código genético. Como eu explico?
A sociedade heteronormativa é, por essência, machista. E nesta sociedade machista em que gays e lésbicas são educados, aos meninos é ensinado que eles devem ser "machos" e ser macho está necessariamente associado a nunca, em hipótese alguma, disperdiçar uma chance de fazer sexo. Esse comportamento heterossexual é sim introjetado dentro dos homens gays e eles, como aprenderam a se comportar, agem de acordo com a forma que a sociedade, através de seus pais e familiares, os moldaram. Do outro lado, estão as meninas educadas para preservar a sua "honra", sua virgindidade, até o casamento, para o marido, para um único homem. É óbvio que ao tornarem-se mulheres e reconhecerem que são lésbicas, este mesmo padrão machista é repetido por elas em um ciclo que, provavelmente se elas vierem a ter filhos, repetiram com seus próprios filhos.
Não estou aqui, com este texto, para dizer: "sejamos todos promíscuos", não cabe a mim dizer o que cada um deve fazer com sua própria vida, porém me interessa com esse texto, e com essa nova coluna de História que eu tenho escrito aqui no blog demonstrar que conceitos que muitos consideram como naturais e imutáveis são padrões historicamente construídos por grupos sociais e, portanto, podem sim ser desafiados, modificados e, principalmente, que não podem ser impostos como Verdade, ou melhor, como O Correto. Espero com essa coluna dar subsídios para que qualquer um construa suas próprias verdades. 

sábado, 1 de janeiro de 2011

Ser Racional

Aprendi, em muito anos, nos trinta que já carrego em minhas costas, a pensar o mundo de forma racional. Iluminista, aprendi a sublimar emoções, extirpar paixões. Voltaire e Rousseau foram meus guias tortuosos nos caminhos do coração. Aprendi com Emílio. "As paixões são uma infinidade de ilusões que servem de analgésico para a alma", que a adormecem e entorpecem os sentidos. Afinal, como um solitário, entre meus livros, eu procurei finalidade em tudo o que via e a causa em tudo que sentia, e tentava assim, a partir de um fim, por uma causa, entender o porquê de minha vida seguir por este ou aquele caminho. Apelei para a astrologia, quiromancia e cartomancia, à regressões e a magia, mas tudo porque eu queria entender porque aquele caminho, aquela trilha, aquela vida, eu exigia uma explicação.
Viciado no racionalismo, nas tabelas, gráficos e estatísticas, na probabilidade matematicamente calculada, e exigindo que a vida humana, a minha vida amorosa, fosse possível de ser explicada, entendida, decifrada por estes códigos falhos. Afinal, o que é a ciência e a razão senão uma deusa pagã colocada no lugar do próprio Cristo por esses filósofos setecentistas? Uma deusa que cobra uma fé ainda mais cega, porque a ela não cabe questionar. Não se questiona a verdade. E foi sob o altar dessa deusa que eu acendi meu insenso e prostei-me com lágrimas nos olhos. Eu racionalizava. E a psicologia explica. Explica a racionalização como um processo psíquico em que o sujeito constrói explicações que ele considera racionais para perdoar suas ações. E era isto que eu fazia. E é isto que estou fazendo agora nesse texto.
Mas, voltando a minha vida amorosa, constatar que nenhum homem nunca será capaz de gostar de mim não é um simples relatar dos fatos. Eu minto quando digo isso. Minto para mim mesmo e para todos. É apenas, e nada mais, do que uma racionalização estatisticamente comprovada - é verdade, já que a maioria dos homens que passou pela minha vida realmente não se interessou por mim -, porém, mais importante se ela é verdadeira, passível de ser comprovada, são os objetivos que eu tenho por trás dessa afirmação.  Digo isto, construo esta racionalização para evitar que eu me machuque, que eu tente de novo, que me decepcione. Uma explicação que me impede de querer mais, de sonhar com mais, de desejar mais. E, medo de me machucar, não é um bom argumento para eu continuar sustentando essa quase-verdade.
Quando eu dizia, que desistiria de homens, porque eles não se interessavam por mim, eu dizia porque eu realmente acreditava que dizia a mim uma verdade, mas agora, após uma conversa esclarecedora com um amigo, percebendo essa racionalização, colocado de frente a ela, não sei mais se esse passo é o mais correto. Não porque eu passei a ver os homens que se interessavam por mim, não, eles não existem; mas desistir deles seria pelo motivo errado. Minha promessa de Ano Novo precisou ser repensada ainda antes dos fogos estourarem numa noite chuvosa de Belo Horizonte. Afinal, uma coisa é tomar uma decisão porque é a correta; outra coisa é tomar porque você teme as consequências.