por
Sebek*
Meus caros, uma pequena invasão aqui se faz necessária, apresento-vos o meu querido Sebek, este paulistano querido, que me apresentou o centro histórico da cidade e fingiu que tocou na cerveja no Bar da Loca meses depois. Ele tem algo para falar-lhes e tem minha benção!
[para ler esse post, o autor recomenda a audição
de Mother's Talk, do Tears for Fears]
Bom, começar uma reflexão dessa envergadura demandou, para mim, muitas elucubrações sobre o tema com amigos, e várias observações empíricas vivenciais. Confesso que, diante desse mundo que vivemos, com todas os preconceitos, o meu relacionamento com os gays efeminados - porque "a" é uma preposição de negação - sempre foi complicado, talvez por querer me autodefender do esteriótipo, resguardar o meu armário ou algo assim, mas desde uns tempos pra cá venho repensando esse assunto, tudo isso graças a uma sequencia de palestras que venho acompanhando no Café Filosófico da TV Cultura que fala sobre a masculinidade e a feminilidade.
Ouvi a psicanalista, Maria Rita Kehl, afirmar, entre outras coisas, baseada em Lacan, Jung, além de outros pensadores e na experiência empírica que, ambas as identidades são uma oposição entre si. Percebe-se, que existe uma masculinidade imanente no feminino e uma feminilidade imanente no masculino. Fiquei refletindo o que isso poderia significar e acabei percebendo que a origem do nosso preconceito contra os efeminados está calcado na forma Rousseauniana de educação que ainda não nos libertamos. Nós, indivíduos do gênero masculino, somos educados para sermos masculinos a partir da negação de tudo o que é feminino, você percebe isso se prestar um pouco de atenção na forma como foi educado pelos seus pais, esse é a forma Rousseauniana de educar, o paradigma de educação social desde o século XVIII que, agora - a partir da metade do século XX - e, por conta de grandes mulheres (elas também grandes prejudicadas por esse metodo), como Simone de Beavoir, ele começou a ser questionado.
Acontece, porém, que através dessa forma Rousseauniana, acabamos por ganhar como 'prêmio' uma sensível repulsa a tudo que é feminino em nós e nos seres do gênero masculino e, aliando isso à nossa natural busca por alguém que nos complete similarmente, propiciamos o star up desse nosso preconceito para com os efeminados, que, no caso, por alguma coisa natural que não sabemos bem o porque ainda, parecem não terem conseguido (e viva o gerúndio!) responder totalmente a esse estimulo da educação rousseauniana para a oposição ao feminino.
Apesar de tudo isso justificar a existência do preconceito, penso que por sermos vítimas direta ou indiretamente do preconceito da sociedade 'heteronormal', deveríamos repensar aquilo que nos foi imposto por educação. Não existem verdades absolutas, nem o nosso modo de pensar tem que estar estático. A flexibilidade faz bem para as outras pessoas e para nós mesmos. Tenho, particularmente, buscado esse caminho: flexibilizar, crescer, evoluir, porque afinal de contas, qualquer tipo de restrição e preconceito é um atraso de vida mesmo que debaixo de qualquer capa ou véu que se esconda, principalmente aquela velha capa do "só não me atrai sexualmente" .
O mundo já está tão repleto de hipocrisias, que, não acho válido, nós reforçarmos essa característica virulenta e putrefata da sociedade adicionando uma pior que as anteriores simplesmente abrigados debaixo daquela capa velha e esfarrapada da falta de 'atração sexual'.
Certamente, não é fácil vencer essa mistura perniciosa (educação rousseauniana + atração pelo que é mais másculo) que são o botão ativador do preconceito contra os efeminados, mas é, talvez, uma responsabilidade, quiçá um dever, para nós gays, que somos vitimas e tanto tentamos vencer o preconceito da sociedade heteronormal para com os homossexuais. Não estaríamos nós, reproduzindo o preconceito dos héteros contra os homossexuais, sob uma nova ótica? Qual respeito teria a causa gay se formos hipócritas de lutar tanto pra sermos aceitos pela sociedade e, ao mesmo tempo, segmentarmos os efeminados num gueto? Não acabamos, indiretamente, justificando o direito dos fundamentalistas religiosos defenderem seu ponto de vista de exterminar a homossexualidade da face da terra agindo assim?
Não sou efeminado, mas, a bem da verdade aprendi, depois de me apaixonar perdidamente por um efeminado lindo, inteligente,'moço pra casar' que ninguém manda no coração, nem mesmo a atração sexual. Um dos meus melhores amigos gays é efeminado e foi quando perdi a vergonha de andar com ele que aprendi a ser mais homem, exatamente porque aprendi a ser mais eu, mais seguro de mim mesmo, mais aberto às possibilidades e menos fincado nos meus preconceitos. Penso que dei um passo para ser um homem completo e não, apenas, um protótipo de macho, que, no fundo, é apenas um viés de se autoenxergar como animal (e irracional, diga-se), em oposição à essência que nos faz tão grandiosos: o fato de sermos seres humanos racionais.
O preconceito começa na nossa decisão de continuar a sua manutenção e não lutarmos, o mínimo que seja, conosco mesmo, para vencê-lo. Penso, que o preconceito em qualquer escala começa e termina quando eu quero, dependendo da minha força de vontade de empreender uma batalha contra ele. Por isso, arrisco-me a dizer, que o preconceito contra os efeminados, é culpa particular minha, sua, de cada um de nós. Durma-se com esse barulho!