Eu estava parado na porta que dava para o quintal. Na lateral da pia. Faca. Tábua de carne. Tomates secos. Cebolas. Dentes de alho. As mãos molhadas para não ficar com nenhum cheiro. Eu pico os igredientes. O tomate apenas na metade. Quero pedaços no molho. Cebolas deixo os aneis, finos, mas perceptiveis no prato. O alho, pouco e em pequenas lascas. A água para o macarrão começa a borbulhar lentamente. O vento frio entrava e acariciava minha pele e meu cabelo. Azeite na panela, um pouco de sal, despejo o macarrão. Suficiente para duas pessoas. Uma bela pasta. Tudo ferve. Tudo se aquece.
Em outra panela, caldo de carne preparado por minha mãe no dia anterior. Pedi para ela reservar um pouco para esta noite. Tudo estava combinado já. Sabia que ela viajaria ontem, hoje eu teria a casa toda para mim. Cuidei de tudo. Tudo estava arrumado. Almofadas no chão da sala. Na mesa de centro duas taças de vinho tinto. Copos para água. Pratos. A louça especial da minha mãe. Queria tudo especial. Queria tudo perfeito. Velas! As velas! Acesas. Aromáticas. A vendedora dizia que elas eram afrodisíacas. A casa estava perfumada.
O macarrão fervia. Cabelo de anjo porque gosto da textura que fica no prato. Os tomates junto do caldo de carne ganhavam consistência. O molho pedia urucum, pimenta e quase nada de sal. Corro no quintal e pego, na chuva, protegido por um guarda-chuva, folhas de hortelã, cebolinha e salsinha, não tem pimentão verde ou amarelo. Droga! Vai faltar um outro tom no molho. Ele vai ficar muito vermelho. Na panela ele já estava cada vez mais vermelho sangue. Mas eu sabia que no fim ele terminaria bordô. Estava na hora de acrescentar duas taças de vinho tinto no molho. Parei de picar as verduras que peguei no quintal e peguei o vinho. Havia pouco, mas ele traria um. Eu pedi. Ele perguntou se deveria trazer algo. E eu avisei: um vinho tinto. Apesar que eu não precisava dizer isso. Despejei o vinho.
A cozinha cheirava bem. O vinho fez com que o cheiro alcançasse as gotas de chuva lá fora. Preocupei-me se o cheiro naum ia brigar com as velas na sala e liguei o purificador. O barulho do purificador não deixava mais com que eu escutasse a música que saia das caixas de som do meu computador no meu quarto. Elis. Ó Elis. Neste instante, com a chuva forte, a campainha toca. Corro. Ele esta lá na porta. Todo molhado. Sorrindo um sorriso luminoso. Segura uma garrafa de vinho, nevada, gelada. Eu corro e abro o portão. Ele entra, passa a mão no cabelo molhado e sorri. Não há ninguem na rua. Casas fechadas por causa da chuva grossa. Eu o beijo ali. Ele me aperta e me molha. Eu não me importo, teremos a noite toda.
Agora a cena real: Eu fiz o mesmo prato que descrevi ai. Macarrão com tomates secos. Delícia. Para duas pessoas, eu e meu irmão que comeu assistindo Homem Aranha 2 na sala. Enquanto eu comia diante do computador matando de inveja o Segredo e o Imperfeito. A chuva caía, mas não havia ninguém com sorriso luminoso me esperando sob a chuva. Maldade isso? Humor negro, podemos dizer.