Google+ Estórias Do Mundo: setembro 2014

terça-feira, 30 de setembro de 2014

Sobre Experiências, Traições e Afins

, em Natal - RN, Brasil
Eu tenho uma curiosidade imensa daqui do meu lado da vida, de onde observo vocês, sabe? O que significa ser traído? Porque eu observo as pessoas e todas temem a traição de uma forma tão intensa, algumas pessoas chegam perto das raias da fobia, porque se esquivam de relacionamentos, de contatos com outras pessoas, ou mantendo relacionamentos superficiais, temendo que um dia possam vir a ser traídas. É um pavor que eu não entendo. De fato, não entendo. Eu sei que o argumento vai aparecer aqui então deixem-me dizer que onde falo, de onde estas questões surgem. Em primeiro lugar, todos sabem que minha experiência com namoros é praticamente nula, somente um que durou seis meses com o Tato (oi, Tato), portanto eu não tenho ideia do que é sentir-se traído e principalmente do sofrimento que isto pode causar em alguém. Minha falta de experiência com o assunto é real e por isso apelo a vocês para que me expliquem, eu não estou brincando, é uma dúvida real. Então, por favor, não respondam que se eu tivesse um namorado eu ia entender. Eu não tenho, e talvez por isso eu não entenda, talvez! Afinal exista a possibilidade que a minha concepção sobre traição seja real, apesar de nunca testada empiricamente.
Minha concepção de vida, filosófica, política, acadêmica formada através dos livros que li (porque, repito, minha experiência com tudo isso é puramente intelectual) em que eu não considero que a posse sobre alguém seja basilar ao amor, isto é, nunca acreditei em minha vida que para eu me sentir amado ou para que eu amasse alguém, eu teria que ser fiel e pertencer somente a uma pessoa. Em teoria, eu seria facilmente adepto do poliamor, nunca fui uma pessoa ciumenta, nunca acreditei que a base de um relacionamento saudável seja a fidelidade e sim a lealdade, e qual a diferença entre os dois? Fidelidade é você nunca se relacionar com outras pessoas, lealdade é você nunca enganar a outra pessoa, você pode ser fiel e nunca ter sido leal (por exemplo, mentindo sobre o trabalho, sobre a condição econômica, etc) e você pode não ser fiel, mas ser completamente leal (como em relacionamentos abertos). Obviamente, eu nunca pus nada disso a prova, afinal meu namoro a distância com o Tato (Belo Horizonte/MG - Cabo Frio/RJ) não é o melhor exemplo dado as inúmeras idiossincrasias que um relacionamento via MSN tem per si
Lembro também dos grandes traidores que eu conheci em minha vida, meu irmão mais velho e agora o Le Garçon Blond, (citarei apenas dois exemplos, mas não que eu não conheça outros mais), estes são sempre assombrados pelo fantasma da traição. Toda conversa sobre relacionamento com o Le Garçon sempre termina com ele falando sobre fidelidade e ele demonstrando que não confia em ninguém. Meu irmão mais velho perseguia suas namoradas e queria saber onde elas estavam o tempo todo porque ninguém poderia enganá-lo. Mas ambos traem continuamente as pessoas com quem se relacionam. É outra dúvida: pela minha experiência intelectual parece haver uma ligação entre aqueles que mais traem e aqueles que mais tem medo de ser traídos, isto procede ou minha amostragem está viciada? Eu inclusive conheço dois casos de pessoas que sempre traíram e temiam absurdamente serem traídos que ao casarem-se e finalmente dedicarem-se realmente a uma vida fiel perderam o medo de serem traídos também. Então, esta lógica faz sentido?
Estas perguntas são porque eu vejo este medo irracional das pessoas e eu fico aqui pensando comigo: por quê? Dói tanto assim que a pessoa prefere se privar de tudo o de bom que um relacionamento traz (companheirismo, amizade, sexo, amor, felicidade) por causa de uma possibilidade que pode vir a não se realizar? Ou estas pessoas tem um concepção de amor errada (afinal amar algumas pessoas eu já amei mesmo, uma única vez correspondido de 3), elas sentem que a precisam possuir a pessoa e é este sentimento que quando é rompido dói tanto, como quando uma criança mimada não tem aquilo que quer? É o ego magoado que dói tanto? Uma vez me disseram que se eu tivesse vivido estes amores que tive em sua completude, isto é, se o namoro com o Tato não tivesse sido a distância, ou se o Anjo em Belo Horizonte ou se o Menino Bonito aqui em Natal tivessem correspondido aos meus sentimentos eu não pensaria deste jeito. Será? Fico com minhas dúvidas, será que vocês podem ajudar-me?

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Preconceito Bipolar

, em Natal - RN, Brasil
Tem coisas neste nosso mundo gay que eu não entendo como ainda acontecem. A gente está ai, quase na segunda década do século XXI, e eu ainda tenho que escrever texto sobre o preconceito que homens gays tem dos bissexuais. Sabe?, para mim, é simplesmente absurdo, tanto quanto a homofobia internalizada e o preconceito contra efeminados, os motivos são tão óbvios que devíamos estar focando em combater o porque disto existir e não gastar tanta energia repetindo discursos comprados. Último dia 23 foi o Dia da Visibilidade Bissexual, o dia foi criado em 1999, por três ativistas dos direitos bissexuais nos Estados Unidos, eles alertavam que depois de Stonewall, a comunidade gay e lésbica havia crescido em força e visibilidade política, enquanto o mesmo não havia acontecido, na mesma proporção, com a comunidade bissexual. Em muitos modos eles ainda continuavam invisíveis sobretudo porque quando vê-se um casal andando de mãos dadas tacha-se logo que os membros são ou héteros ou gays, dependendo do gênero que percebe-se das pessoas, nunca imagina-se que algumas daquelas pessoas possa ser bissexual. O evento foi concebido como uma resposta ao preconceito e a marginalização que pessoas bissexuais sofrem tanto das comunidades hetero como gay.
Repete-se, sobretudo no mundo gay, que os bissexuais são pessoas indecisas. Que não decidiram e que precisam fazer isto. A origem deste preconceito é bem clara, na verdade. Muitos meninos gays adentram na vida homossexual assumindo uma imagem bissexual porque acreditam que assim, entrando aos poucos, digamos, eles são menos gays. Acreditam eles que por mais que se envolvam com homens, na verdade eles gostam mesmo é de mulher, e conseguem, nesta fase de transição, aceitar o rótulo de bissexuais, afinal estes são ainda homens de verdade porque esta terrível categoria (e isso é deliciosamente irônico) é sempre aquela definida por causa das mulheres que existem em sua vida. O preconceito gay se baseia neste personagem: o homem gay cheio de preconceito contra si mesmo que assume o rótulo de bissexual para ser menos gay. Este problema existe, é real!, e precisamos lidar com ele ao discutir o preconceito homossexual com este grupo com o qual dividimos nossa sigla política. Para boa parte da população gay, todo homem bissexual é na verdade um homossexual que está enganando sobretudo a si mesmo. 
Mas a realidade é muito mais complexa. Não existem somente estes dois blocos antagônicos de sexualidade, a heterossexualidade e a homossexualidade. Citando a escala Kinsey, entre os dois estava exatamente a bissexualidade. Existem pessoas sim que se interessam por ambos os gêneros e que não estão mentindo para si. Existem homens e mulheres que se sentem atraídos tanto pelo seu mesmo gênero quanto ao seu oposto. Eles existem e cabe a nós aceitá-los, mas também cabe a nós criar um ambiente livre de homofobia que não faça com que um homem gay se sinta mais confortável definindo-se como bissexual do que como gay, que ele se sinta mais seguro mantendo uma relação com mulheres somente para não sentir-se um não-homem. É necessário para combater o preconceito contra bissexuais combater a definição de homem, raiz da homofobia, que define este ente como aquele que tem relações sexuais com mulheres. Quanto mais distanciarmos a definição masculina desta relação sexual com o gênero oposto (o que também causaria uma bem-vinda redefinição do que é ser gay para além do ato sexual)  e também afastarmos a imagem negativa dos gays e lésbicas, os jovens não precisarão utilizar o rótulo bissexual para suportar a sua transição de saída do armário. 
Toda a questão se resume, principalmente quando pensamos na invisibilidade bissexual (questão que eu não imaginava que existia, mas faz muito sentido), a uma definição que é absolutamente necessária para que abracemos a diversidade sexual humana com toda a sua gama de possibilidades. Desde já temos que ter a consciência que o fato de um homem fazer sexo com outro homem, namorá-lo ou mesmo amá-lo não o faz necessariamente gay, como o fato de um homem fazer sexo com uma mulher, namorá-la ou amá-la não a faz heterossexual, porque ser gay, ser hetero ou ser bissexual precisam ser definidos para além da relação que a pessoa tem com outras pessoas, isto é, para além de um rótulo externo, para serem definidos, em contrapartida, para as identidades que construímos interiormente. Somos gays, heteros ou bissexuais porque nos identificamos assim, esta identidade sexual, como a identidade de gênero, não podem ser construídas através de símbolos externos. Tendo esta consciência é preciso adotar o exercício de somente definir pessoas depois de conhecê-las realmente, o problema do preconceito é que ele sempre pressupõe coisas antes de realmente perguntar e isto sempre causará problemas. Precisamos de parar de ter preguiça para conhecer as pessoas no lugar de jogá-las dentro de nossas gavetinhas de gays, heteros ou bissexuais, somos mais do que isso, felizmente!








terça-feira, 23 de setembro de 2014

Le Garçon Blond (prendre trois)

, em Natal - RN, Brasil


Foxx: Ah, por falar em sexo, tô comendo Le Garçon quando ele tem vontade de sexo. Funciona assim: ele me liga quando dá vontade, dá e depois vai embora.
Rodrigão: (risos) Aquele que o namorado fez um escândalo? 
Foxx: Sim, aquele.
Rodrigão: Para quem não queria mais saber de homem, 'tá comendo bem você hein?
Foxx: Ah, eu estava na secura, precisava de alguém para descarregar esta energia. 
Rodrigão: (risos) Acho que você está certíssimo! Descarrege mesmo! Encha o cara da sua energia.
Foxx: Eu não o procuro, sabe? Quando ele quer, ele vem, e não existe nenhum envolvimento meu com ele.
Rodrigão: De fato, uma forma boa de você não se envolver é deixar que ele te procure... mas e o namorado dele?
Foxx: Até onde eu saiba, sobre o namorado, eu acho que terminou depois do escândalo, porém eu sei que ele está conversando com mais cinco outros caras, porque ele acha que eu não vejo as mensagens que ele responde chamando os caras de "amor" na minha frente pelo WhatsApp... ele, de fato, se acha o grande cafajeste do mundo. O bichinho ainda tem tanto o que aprender nessa vida.
Rodrigão: Ele é novinho...
Foxx: É, tem 19 anos apenas. 
Rodrigão: É uma criança... Mas e daí? Deixa ele ser jovem, deixa ele ter 19 anos, nada como ser desejado por um garotão que tem uma bundinha linda.
Foxx: A mais gostosa! E sim, eu concordo, que ele é uma criança, mas não vejo problema nenhum nisso não.
Rodrigão: Ele é um ordinário, mas que mau tem para você né? Ele que vem atrás! 
Foxx: Ah, Rodrigão, eu não vejo problema nenhum! Porque meu único objetivo com este relacionamento é apenas gozar na bunda dele mesmo. 
Rodrigão: Sim, sim, esse é o objetivo. Então coma, farte-se e pronto.
Foxx: Se eu não me iludo com a ideia de que ele pode vir a gostar de mim, não há como haver problema. Só haveria sofrimento se eu ainda sonhasse que é possível alguém vir a me amar, quando eu não pressuponho que isto possa acontecer, eu nunca sofro. Mesmo se eu me apaixonar, não espero, em hipótese alguma que ele venha a nutrir algum sentimento por mim. Eu sirvo apenas para matar a carência e o tesão dele quando surgem, ele cumpre para mim basicamente o mesmo sentido.
Rodrigão: É que ele é um moleque, também não é? Não é um cara apaixonante.
Foxx: Não, Rodrigão, eu que não sou.



sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Creta: Os Amores Perdidos

, em Natal - RN, Brasil
Um dos poemas mais importantes dedicados a Apolo é o Hino Homérico. Os hinos constituem de uma coletânea reunida durante a época helenística de 33 poemas, escritos em hexâmetros e dirigidos a um deus. Segundo Luiz Cabral, a maioria é proveniente do século VII a.C., mas alguns são mais recentes. Seu autores denominavam-se aedos, cantores, que dedicavam-se a atividade nômade de cantar os poemas pelas diversas cidades gregas, participando de competições musicais no contexto das festas religiosas. Como funcionava entre os aedos, havia um modelo de hino que compreendia uma fórmula inicial (a invocação ao deus e a declaração de quem é o poeta), seguido por um mito curto ou extenso e uma fórmula final (com a despedida e o kairé, adeus, ao deus). É importante também saber, e os estudiosos sobre os Hinos Homéricos demoraram para entender isto: estes poemas foram escritos para serem cantados; são canções que eram apresentados ao vivo para uma plateia formada por nobres guerreiros e suas famílias. Isto é de extrema importância para entendê-los.
Na primeira parte do Hino, o aedo descreve o nascimento de Apolo em Delos até sua apoteose em Delfos. Começa com o deus já adulto, entrando no Olimpo, como arqueiro sublime, que inspira temor a todos. Leto, sua mãe, é quem o recebe e o conduz para seu lugar entre os imortais, enquanto é recepcionado pelo rei dos deuses, Zeus. Depois o cantor descreve suas circunstâncias do nascimento divino, conta que Leto, filha do titã Ceos, foi amada por Zeus e grávida foi perseguida pela rainha dos deuses, Hera. Conta da peregrinação da deusa para parir as crianças gêmeas, Apolo e Ártemis, do abrigo na ilha Ortígia, do juramento em nome do Rio Estige de consagrar a ilha em nome de sua filha, e depois em Delos em que a deusa promete consagrar a ilha ao deus. Conta do parto de nove dias e nove noites para o nascimento de Apolo, da assistência das deusas Dione, Reia, Icneia, Têmis e Anfitrite e também da jovem Ártemis, até a chegada da deusa dos partos, Ilítia, que Hera havia proibido de sair do Olimpo para acudi-la. O poeta também canta que ele fora então banhado pelas deusas, envolto em faixas e ornado com uma coroa de ouro, e antes de mamar, tomou o néctar e comeu a ambrosia das mãos de Têmis, ganhando assim sua imortalidade. Conta o hino que ele imediatamente tornou-se adulto, libertou-se de suas faixas, e bradou reivindicando o seu arco, e declarou-se porta-voz da vontade de Zeus, refulgindo sua luz.
A segunda parte do hino, ou Sequência Pítica, Apolo está no Olimpo, tocando sua lira e presidindo o coro das Musas. Canta-se também como ele percorre a Terra, fundando seu culto, tentando estabelecer um oráculo em Telfusa, outro nas encostas do monte Parnaso, na cidade de Delfos, também a morte do monstro Tífon e da serpente Píton. Em seguida, começa a procurar seus primeiros sacerdotes, disfarçado de delfim, capturou um navio vindo de Cnossos, em Creta, e levou-os para seu templo em Delfos, onde impôs-lhes obediência, prescrevendo os rituais que deveriam ser realizados e ensinando-lhes seus oráculos. Profetizando: "Outros homens, depois desses, como líderes tereis./ E com a força deles, obedientes heis de ser" (v. 542-543). Por ter se revelado a eles como delfim, era invocado aqui sob o epiteto de Apolo Delfínio. Explica Luiz Cabral que esta referência é o testemunho de uma conquista insular da Grécia, da invasão dos cretenses no continente.
O Hino ao deus que representa o modelo do ideal grego é de uma imensa complexidade, afirma Luiz Cabral que inúmeros detalhes são enigmáticos e a data e o objetivo da composição ainda são motivos de controvérsia. O poema afirma-se como obra do homem cego de Quios, isto é, Homero ("Moças, qual é para vós o mais doce dos aedos/ que sói aqui vos visitar, e qual mais vos delicia?/ Vós todas, unânimes, respondei com distinção:/ 'É o homem cego, que habita a pétrea Quios;/ pois são seus cantos sempre os mais exímios'.",  verso 169-173), o que o historiógrafo grego Tucídides e o poeta Aristófanes confirmam, mas acredita-se que sua fixação definitiva de obra do rapsodo Cinetos de Quios, escrito entre 504-501 a.C., publicando-a em Siracusa como se o texto fosse de sua própria autoria. A canção apolínea é a mais antiga da coletânea, e sua primeira parte, chamada de Hino Délio, costuma ser considerada a primeira a ter sido composta, ainda no século VIII a.C..   
Neste poema, o poeta não se esquiva de relatar os amores que o deus pítio teve com homens que Luiz Cabral, o maior especialista brasileiro no tema, chama de "identificação com os jovens". Ele canta: 


"Entre elas, Ares e o vigilante Argifonte
dançam, enquanto o Puro Apolo a lira pulsa,
com passadas altas, gráceis, se movendo; à sua volta,
flâmeo fulgor: fulgem-lhe os pés e a túnica impecável.
Leto de tranças áureas e Zeus sagaz
alegram o nobre coração ao contemplarem
o caro filho a dançar entre os deuses imortais.
Como hei de celebrar-te, a ti, que louvam tantos hinos?
Devo cantar-te em tuas conquistas, em teus amores,
como vieste a cortejar a Azântida donzela:
junto com Ísquis, filho do teossímil Elato, hábil equite?
ou junto com Forbas, da tribo de Tríops, ou com Erecteu?
ou com Leucipo, ou com a esposa de Leucipo...
(...)"
v. 200-214.

Infelizmente falta uma parte do poema, que complementa esta lista. É possível que o texto tenha sido censurada por algum leitor cristão séculos depois, chocado com o que ele poderia entender como licenciosidade. Não sabemos, mas é comum em textos antigos encontrarmos ele cheio de lacunas, não seria também impossível que o papiro somente tenha estragado exatamente nesta parte, afinal não sobram muitas cópias para que possamos compará-las. Existem inúmeros poemas gregos que nos restam apenas duas ou três linhas por causa disso. Salvaram-se então três amantes do deus no Hino: Forbas, Erecteu e Leucipo.
Mas é necessário explicar os nomes que aparecem nesta lista: "como vieste a cortejar a Azântida donzela:/ junto com Ísquis, filho do teossímil Elato, hábil equite?", fala sobre a história de Corônis, em que ela, temerosa que o deus a abandonasse quando ele começasse a envelhecer, casou-se com Ísquis causando o ciúme mortal do deus; "ou junto com Forbas, da tribo de Tríops," fala sobre o mito do filho de Triopas e Hiscila, herói da ilha de Rodes: quando o povo da ilha de Rodes foi vitima de uma praga de serpentes (em algumas versões, de dragões), um oráculo avisou que eles procurassem a ajuda de um homem chamado Forbas; este, amado por Apolo, havia recebido o dom de combater as serpentes e limpou toda a cidade, recebendo veneração da ilha pelos ródios como herói. Após sua morte, o deus para render-lhe homenagem elevou-o aos céus na forma da constelação de Serpentário ou Ophiuchus, tornando-o imortal. 
As duas últimas citações comportam-se de forma distinta porque não chegaram a nós os mitos aos quais elas fazem referências. Este é um problema comum a história, nem tudo do passado chega até nós. Vejam: sobre "ou com Erecteu?", fala sobre um dos primeiros reis de Atenas, filho de Pandion e Zeuxipe, neto de Erictônio, o filho de Hefestos e Gaia, a própria terra. Apesar desta citação, não chegou a nós também nenhuma referência sobre algum caso amoroso entre o príncipe ateniense e o deus, existe uma relação entre Creúsa, filha de Erecteu, que é possuída por Apolo e tem um filho, Íon, porém a expressão "he ama" que aparece tanto para a donzela cortejada como com Forbas, repete que a relação deveria ser com o próprio rei ateniense não com a filha deste. Em "ou com Leucipo, ou com a esposa de Leucipo...", a expressão se repete, apesar de haverem cinco heróis com este nome, não nos restou nenhum mito que conta sobre uma relação entre Apolo, um herói e sua esposa. Infelizmente, estas duas belas histórias foram perdidas.



    terça-feira, 16 de setembro de 2014

    Contra-producente

    , em Natal - RN, Brasil
    Estávamos no Casa Nova, era uma sexta a noite e nos encontrávamos cercados da fina flor da sociedade gay natalense. Já falei deste bar antes. Caro, em que os viados desta exercitam o esporte que mais gostam: exibir o quão bem sucedidos são. Deve ser falta de auto-estima precisar tanto despertar inveja nos outros. Seu sucesso só existe se outros o cobiçam.  Eu com certeza devo soar muito diferente de todos eles ao ter consciência de meus fracassos. Eu estava acompanhado de um amigo que conheci em Belo Horizonte, ele estava aqui a trabalho e nos encontramos ali para conversar.
    - Esse aí é o meu tipo.
    Apontou meu amigo. Era um cara maduro, por volta de 40 anos, imaginamos. Com o corpo musculoso, mas não olhava para nós. De fato, muito bonito. E ele perguntou:
    - Qual o seu tipo, Foxx?
    - Ah, eu lá tenho tipo! Se gostou de mim, eu gosto dele. Sou bem eclético para dizer a verdade. Porém, é mais comum eu ficar com garotinhos, meninos novinhos entre 18 e 25 anos, é o tipo de homem que normalmente se interessa por mim. Eu não tenho vergonha de admitir...
    Ele bebia cerveja interessado no que eu dizia. Eu continuava.
    - Eu fico com os homens que querem ficar comigo. Eu tenho um tesão bem grande, por exemplo, por loiros, mas a maioria de homens que eu fiquei são negros. Inclusive, meu único namorado. 
    - Pois eu gosto de caras mais velhos, e também com barba, esse rosto másculo me deixa excitado.
    falou meu amigo mineiro sorrindo para o cara na outra mesa. 
    - E você sabe que seu tipo atrai normalmente homens mais velhos não é?
    - É?
    - Sim, você tem cara de garotinho!
    - Ah, mas eu uso barba exatamente para aparentar ser mais velho.
    - Não 'tá funcionando, amigo! 
    - Não?
    Rimos juntos. 
    - Não! E assim... obviamente não é todo homem maduro que gosta de garotinhos... mas os que gostam de homens mais velhos não vão olhar para você. Não com essa cara de 19 anos que você tem. Sinceramente, acho que você tem que investir neste nicho: homens mais velhos que gostam de garotos mais novos. Investir em ser esse garoto mais novo, já que você foi abençoado com este presente da eterna juventude. 
    Ele sorriu para mim. Eu continuei falando:
    - Outra coisa: usar barba é totalmente contra-producente!
    Ele riu alto e tomou um gole de cerveja.

    sexta-feira, 12 de setembro de 2014

    Le Garçon Blond (pendre deux)

    , em Natal - RN, Brasil
    Sabendo que ele tinha namorado, continuei conversando com ele. Ele sempre me dizia coisas como que queria encontrar alguém para namorar, que era um rapaz sério e eu fingia que acreditava nele. Dava corda apenas. E ele falava, notei que este era o jogo dele. Ele gostava de me fazer sonhar com ele, gostava de me fazer acreditar que ele era o cara perfeito. Ele conversava sempre comigo no fim da noite, aparecia sempre domingo, ou seja, era nos momentos que ele estava carente por algum motivo que ele queria ouvir que eu estava interessado nele, que o desejava, que o achava bonito. Mas o problema destes cafajestinhos é que eles acham-se inteligentes demais e acabam por cometer pequenos erros. E, um dia, eu recebo uma mensagem pelo Whatsapp: "Ei, você é um antigo namorado do Garçon? Pois saiba que nós agora estamos namorado, eu pediria que você deixasse de mandar mensagens para ele". Eu gargalhei sozinho, ao ler. Recortei nossas mensagens mais antigas, na qual ele fala que era solteiro. E enviei para o tal namorado. Enfatizando a data e dizendo: "O que ele me contou é que era solteiro". Ele respondeu dizendo que não acreditava. Sou muito paciente, para dizer a verdade, e escrevi: "Olha, meu amigo, você tem todo o direito de não acreditar, mas quem está sendo traído aqui não sou eu, ok?". E mandei mensagem para ele. "Seu namorado acabou de mandar uma mensagem reclamando de eu escrever mensagens para você. Você achou mesmo que poderia nos enganar? kkkkkk". Ele, obviamente, não teve coragem de responder.
    Pelo menos não por duas semanas. No Facebook, pelo menos, o namoro havia acabado. Foi a primeira coisa que eu olhei antes de sequer responder sua mensagem pelo WhatsApp. "Menino, o que foi aquilo do seu namorado?". Ele começou a mentir. "Ele não era meu namorado, é um maluco que acho que gosta de mim, ele pediu me celular emprestado e viu nossas mensagens e ligou para você". Eu, simplesmente, não acreditava que ele estava mentindo com tanta cara de pau. Ele demorou duas semanas para inventar essa desculpa? Não falei sobre a rede social, era uma excelente fonte de informações, que ele poderia controlar se eu comentasse. Eu imaginei que ele deveria estar solteiro agora, mas seu comportamento não mudava em nada. Continuava falando sobre ser um homem sério, que estava procurando um relacionamento para casar, e me convidou para sair. Na verdade, sabendo que eu morava sozinho, convidou-se para fazer-me uma visita em um sábado a tarde. Disse-lhe então: "É sério que você não tem namorado? Eu não fico com caras que tem namorados, entende?". Ele jurou. "Cara, sou solteiro sim. Não tenho namorado!". Eu sabia que era mentira, mas resolvi aceitar. "Tá, aparece ai, que horas você quer vir?".

    terça-feira, 9 de setembro de 2014

    Walking Dead

    , em Natal - RN, Brasil
    Ludo: Sabe, Foxx, eu estava aqui pensando sobre seu problema com namoros. Eu REALMENTE acho que seu problema é o lugar. Eu considero você um ursinho, sabe? Em São Paulo existem 'gangues' disso. Bares só para isso e etc. 
    Foxx: Sim, sou de verdade.
    Ludo: Em Natal, com certeza não tem. Em BH, eu não sei.
    Foxx: Em Belo Horizonte tem um: o Mineiro Bill.
    Ludo: Natal é o pior lugar que eu já morei na minha vida!!! Eu levava uma ou duas cantadas na Vogue, quando saía por aí, e daí quando eu voltava para casa, a pé, e três ou quatro carros paravam na rua me convidando "para dar uma volta". Todos homens casados com mulheres. É nojento. Degradante. Pútrido.
    Este lugar que você mora não combina com você. Não combina com sua alma e não aceita o seu corpo. Você é uma flor sufocando no meio do deserto.
    Foxx: Sim, eu concordo. Mas não dá mais p'ra sair daqui.
    Ludo: Eu queria MUITO que você tivesse empolgação e saísse daí, mas eu sei como é difícil. Então, eu fico aqui, torcendo quando posso. 
    Foxx: Eu não mudaria nenhuma palavra sobre o que você disse, Ludo. Nem sobre a cidade, nem sobre mim. Se eu tivesse alguma empolgação, entusiasmo, eu talvez visse algum motivo para ainda tentar. Mas meus sonhos foram todos destruídos, eu só continuo caminhando em frente para não ficar parado mesmo, mas eu não tenho nenhum lugar que eu quero chegar. Quando deixei Belo Horizonte e retornei para Natal, eu estava vindo para meu túmulo. Estou há dois anos nesta vida de zumbi.

    sexta-feira, 5 de setembro de 2014

    Creta: O Antigo Amante

    , em Natal - RN, República Federativa do Brasil


    Dentro do ciclo apolíneo, após cometer o assassinato da Píton, em uma versão, e dos Ciclopes, durante a guerra entre os deuses e os Titãs, em outra, o deus da luz e das artes se isolou na corte do rei Admeto para purificar-se do pecado contra a vida que havia cometido por nove anos. Admeto era filho de Feres, rei da cidade que levava seu nome, e Periclímene. Participou na juventude da caçada ao javali de Cálidon e da expedição dos Argonautas em busca do velocino de ouro, dois importantes ciclos entre os heróis gregos. Ao retornar a sua cidade natal, jovem ainda, tornou-se rei porque o pai abdicou do trono em sua honra e, nos primeiros anos do seu reinado, o deus Febo Apolo pediu exílio em sua casa, tornando-se pastor do seu gado e, conta-se também, que eles teriam se apaixonado. 
    O Hino a Apolo escrito por Calímaco foi um dos poucos textos que nos sobraram que descrevem o relacionamento entre o rei e o deus. É no parágrafo 47, traduzido abaixo que encontramos a referência:

    [47] Febo e Nômio podemos chamá-lo, desde que, quando por Amfrísios, ele cuidava de éguas domesticadas, atingido pelo amor do jovem Admeto, cuidava do seu rebanho de gado, de abelhas, nem faltava às cabras do rebanho, sobre o qual como eles se alimentam, Apolo lançava seu olho; nem sem leite que as ovelhas, que também não eram estéril, mas todas teriam cordeiros em pé; e ela que nua em breve seria mãe de gêmeos.

    Apesar de Junito Brandão propor que foi a extrema deferência com a qual foi tratado pelo rei que o fez o deus manter sua gratidão, algumas referências falam que é paixão de Apolo por Admeto o faz ajudá-lo nas mais incríveis tarefas, mesmo depois que o exílio termina. Por exemplo, quando o rei decide se casar com Alceste, a filha de Pélias, rei de Iolco, foi o deus quem ajudou-o na tarefa imposta pelo rei para dar a mão da princesa em casamento. Pélias exigiu que o noivo se apresentasse em um carro puxado por uma parelha antagônica: um leão, símbolo da valentia e da força; e um javali, tradução de poder espiritual. O deus de Delfos concedeu-lhe um carro puxado pelos animais (o que, com certeza, representa uma iniciação dentro dos mistério dentro da religião apolínea) e com isso o rei de Feres recebeu em felizes núpcias a bela Alceste. 
    Febo também salvou Admeto de uma morte prematura quando as Queres sorteiam seu nome para a morte. Apolo embriagou as senhoras do Destino e as fez prometer que se alguém tomasse o lugar do jovem rei, sua vida não precisava ser extinguida. Em sua glória, o deus apareceu a seu antigo amante e contou o que havia conseguido para ele. No entanto, infelizmente nem seus idosos pais, nem seus amigos ou irmãos quiseram fazer este sacrifício, somente Alceste, sua amada esposa, prontificou-se quando o deus contou a forma como poderia salvar sua vida. Na tragédia Alceste, de Eurípedes, é Herácles, que era amigo de Admeto desde a expedição dos Argonautas quem salva a bela rainha da garras de Tânatos, a morte, já diante do túmulo. Porém as versões mais antigas afirmam que foi a rainha dos mortos, Perséfone, que admirada com tamanho amor que Alceste demonstrou pelo marido a enviou de volta a vida para que o amado do deus não sofresse. 
    É interessante notar que o relacionamento entre Apolo e Admeto não inviabiliza de maneira alguma o casamento e o verdadeiro amor que este último vem nutrir depois pela princesa de Iolco. O amor entre o antigo amante divino e de Alceste é real e reconhecido pelas divindades também (Herácles e Perséfone) demonstrando o quanto a sexualidade aqui não estava dividida entre distantes polos rotulados como homossexual e heterossexual cuja experiência em um lado impossibilitaria a vivência de qualquer coisa na sua contraparte, isto é, na sociedade creto-micênica as experiências homoeróticas e heteroeróticas podem ser vividas pelo mesmo indivíduo sem nenhum problema, na verdade, elas só demonstram fases distintas da vida de um mesmo homem, sendo as relações homoeróticas voltadas normalmente à juventude enquanto é reservado à maturidade (sobretudo pensando na geração de descendentes) os relacionamentos com o gênero oposto. 

    terça-feira, 2 de setembro de 2014

    Le Garçon Blond (prendre un)

    , em Natal - RN, Brasil
    Tarde de domingo, um sol escaldante banhava o bairro de Ponta Negra com uma luz que exigia a presença de óculos escuro no rosto de qualquer um que ousasse sair a rua. Eu estava ministrando um curso sobre Astrologia Cármica por ali, e sai para comer com duas das minhas alunas porque voltaríamos a tarde para a segunda parte das aulas. Eu não o vi quando entrei, somente quando sentei no fundo do restaurante, o vi me observando lá do outro lado. Ele sorriu para mim com alguns dentes tortos. Era branquinho, com olhos apertados e corpo sarado. Cabelo arrumado para cima e pele lisa, sem pêlos ou aquela sombra de barba de quem tem muita testosterona no corpo. Rosto imberbe é a descrição correta. Ele me observava de frente a mim e eu calculava que ele não teria nada mais do que 19 anos. Um rapazinho. Almocei sobre seus olhares e levantei para pagar a minha conta, mas antes parei para tomar um chá e, por acaso, perto dele. Ele então se apresentou. O significado do nome dele é loiro. E eu sorri. Ele perguntou se já nos conhecíamos e eu disse que sim. Dias atrás (eu lembrei quando ele se aproximou), ele tinha me pedido meu telefone no ônibus, mas não ligara. Ele lembrou, mas não se envergonhou, só concluiu: "Pois desta vez eu vou ligar sim" e pediu, novamente, o telefone, o que eu dei, movido pelo meu sentimento de não querer ser o sabotador de minha vida amorosa. Ele me escreveu, no Whatsapp, no fim da tarde. Falou que ter me encontrado de novo era coisa do destino e que dessa vez ele não ia deixar passar, precisava me conhecer melhor. E eu senti cheiro de cafajeste. Ele se disse solteiro e falou sobre trabalho e eu, como quem não quer nada, perguntei-lhe o nome completo. E joguei no Facebook. E estava lá: em um relacionamento sério desde o dia anterior. Dezenove aninhos, achando que conhece a vida, e que sabe como enganar a raposa aqui, mas porque não brincar um pouco com ele?