Google+ Estórias Do Mundo: "Aparente Mediocridade e Repressão"

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

"Aparente Mediocridade e Repressão"

, em Belo Horizonte - MG, Brasil

Sentamos naquele teatro, de paredes cobertas de cobre, com os  viados bem-nascidos de Belo Horizonte. Tudo para ouvir Caio. E naquele deserto de almas, naquele deserto de almas também desertas, a ironia se fez presente. Aqueles bem-nascidos vestindo suas justas calças Calvin Klein e camisetas pólo da Zara que apertavam seus músculos conseguidos em alguma academia na Savassi ou em algum bairro com nome de santo, que nunca beberam espumante nacional em copo de plástico, nem ouviram velhos boleros em espanhol, que nunca ouviram sutil llegaste a mí como una tentación llenando de inquietud mi corazón, nem Dalva de Oliveira ou Ângela Ro Ro, acostumados a suas carreirinhas de pó e música eletrônica da The Week, ou de Buenos Aires, ou de Miami, não importa! Aqueles belos viados, bem-nascidos, que juntos despertam os olhares curiosos das moças, que cochicham sem eles perceberem. Moços bonitos. Todos sempre acham, e muitas mulheres (e homens) ficam nervosos quando eles surgem, sempre bonitos, sempre perto de outros tão bonitos quanto eles. Talvez, e faço essa minha teoria, o bonito de um estimule o bonito do outro e vice-versa, mas o bonito de fora, porque tenho minhas dúvidas, se eles são algo mais que só bonitos. Só bonitos estes bem-nascidos. Até porque esses bem-nascidos nunca choraram se sentindo sós, pobres, feios, infelizes, confusos, abandonados, bêbados ou tristes, bem tristes, completamente tristes. A eles, por serem bem-nascidos, nunca um Atento Guardião da Moral vai dedicar-lhes a pena para acusa-los de desavergonhada relação anormal ou de aberração psicológica doentia. Não, nunca aqueles que são os  viados bem-nascidos. Nem se falassem, eles, altivos, perceberiam. A ironia é que Caio é tudo isso, é espumante nacional, velhos boleros, choro convulsionado, feiúra, confusão, abandono, e tristeza, Caio fala sobre tristeza, a tristeza que não toca aqueles que são bem nascidos, a tristeza de verdade. Mas io que é isso de "verdade", ó Caio?  Porque pensei cá comigo que todos ali dentro tinham a nítida sensação de que seriam infelizes para sempre. Pergunto a você Caio Fernando de Abreu, eles foram?

Texto cheio de referências ao conto Aqueles Dois de Caio Fernando de Abreu.

27 comentários:

  1. Boa noite! Eu me senti deveras lisonjeado por ler um trecho antes de todo mundo, rs! Achei meio sagrado isso. Eu nunca li nada de Caio Fernando de Abreu, aliás, eu tenho um débito vergonhosamente colossal com produções artísticas / literárias nacionais. Mas adorei a cadência do texto que acabei de ler, o estímulo imagético que ele suscita no leitor, o jogo de palavras, uma esfera mais poética do que o que eu geralmente leio por aqui. Em relação ao conteúdo, eu fiquei a pensar se de fato são bem-nascidos os 'viados' mencionados ou se a fuga nas drogas, a fuga no culto às belas (?) formas e à ostentação não são índices do contrário... Vc me impressiona cada dia mais, Mr Foxx! Abraços!

    ResponderExcluir
  2. Salve irmão tamos junto ai na caminhada.
    To seguindo teu blog,segue ai tbm.
    http://hiphopactivistface.blogspot.com/
    fmz

    ResponderExcluir
  3. Triste do homem que não aprecia um bolero espanhol.

    ResponderExcluir
  4. Magnífico Foxxito!!! Você está cada vez melhor, e fazendo referência ao Caio Fernando de Abreu, conseguiu nos transportar para dentro desse escrito, belo, cruel e verdadeiro.
    Abraços rapoza :*

    ResponderExcluir
  5. Seus textos sempre tão profundos! Sempre quando leio os seus textos imagino cada cena. É como se eu revivesse passagens de minha própria vida!! Muito obrigado por essas sensações.

    ResponderExcluir
  6. acho egoísmo achar que a tristeza não é de todos.

    podem ser tristes justamente por não terem vivido justamente isso que vc diz despertar a tristeza.

    pode haver muita sensibilidade escondida debaixo de uma gola V ou um completo vazio sob aquele que escutou Dalva de Oliveira.

    essas coisas, sinceramente, acho que nascem cm a gte, não depende de ser rico ou ser pobre.

    ResponderExcluir
  7. Mas é claro que foram infelizes. Pelos restos de sua vida.

    Esse conto é o meu favorito do Caio. Foi a primeira vez que o li. Terminei com lágrimas nos olhos.

    bjão!

    ResponderExcluir
  8. Eu tive que ler o conto de Caio antes de comentar o seu. Lindo!

    E realmente estas bichas bem nascidas serão infelizes. Pro resto das vidas. Não por serem bem nascidas, mas por não se interessarem por nada além da redoma.
    Por não conhecerem Tu me Acostrumbraste, por não saberem de Carlos Gardel. Por ficarem dentro de suas repartições e músicas eletrônicas.

    Adoro estar por aqui, por conhecer pessoas como vc, diferentes, expoentes, sensíveis.
    Isso sim é ser bem nascido. Alguém nascido pra mostrar o bonito de dentro, que é muito melhor do que qualquer bonito de fora!

    bjo Fox!

    ps: tava nervoso no face hj cedinho?

    ResponderExcluir
  9. Foxx,
    estupendo! Adorável!

    Suspeito, sou, porque em geral tenho gostado de tudo que você escreve.
    Me agrada, sobretudo, seu lado escritor, cronista, que nos mostra [uma vez mais] aqui neste texto.

    Se, como historiador você já nos leva à reflexão, como cronista crítico me leva não só a refletir, mas a gozar o prazer de ler algo que penso, mas não posso, porque sem o mesmo talento, escrever. Aí, o diferencial entre escrever e ser escritor. Você, espero já saiba, tem tudo pra estar na segunda turma.

    Escreva mais, sobre suas observações do mundo!

    Ah... Esses moços, pobres moços, ah se soubessem... Talvez saibam, e sofram como todos, apenas tenham outras formas de enganar sua própria dor. Material e socialmente mais confortável, mas nem por isso menos dolorosas suas dores...

    Obrigado!

    ResponderExcluir
  10. Seu comentário

    "sabe o que é pior? eu dava tudo pra sentir algo parecido com isso."

    lá no blog Tanta Coisa resumiu magistralmente mil argumentos, sensações e idéias sobre o que é ser humano, sentir, amar!

    Falou tudo, com quase nada! Talento, meu caro, muito talento!

    ResponderExcluir
  11. Eu, sofri com uma especie de "tristeza" sendo o tipo de pessoa que eu sou. Alguns amigos me dizem: "nossa, você é tão legal, mas é isso que te ferra (a minha tendência homo)".
    E nem sou uma "mal nascida" nem uma "bem nascida" :) eu ando num meio termo rs. Mas seu texto me fez refletir muito. Como pessoas "privilegiadas" nunca vão conhecer essa tristeza e essa discriminação, e tudo vai ser fácil pra elas. Belo trabalho Foxx!

    ResponderExcluir
  12. Todo ser humano é, por partes, tristes. Têm um mundo de emoções por dentro. A diferença é que alguns, sem ter o que temer, mostram isso; outros, preferindo a superficialidade, escondem.

    ResponderExcluir
  13. Li o post e já ia procurar no google.Rss.Como li os coments,automaticamente tive a resposta.Adorei.
    Abraços.

    ResponderExcluir
  14. Penso a mesma coisa. E concluo que a tristeza é uma das muitas coisas que não passam pela cabeça desses "bem-nascidos".

    Deixando claro, logicamente, que isso não é regra absoluta.

    ResponderExcluir
  15. E eu fui pegando aversão dos seus viados lindos a cada palavra. Bobagem. Nem deveria me afetar. Prefiro fingir que não existem. Enquanto isso eu danço.

    ResponderExcluir
  16. Ninguém neste mundo passará sem viver experiências alegres ou tristes e sempre haverá, ao fundo, aquela música estranha (que bem poderá ser da Dalva de Oliveira) a qual, em algum lugar ocasional ou fortuitamente frequentado, tocará a alma de qualquer um: alegre, triste, bonito, feio, rico, pobre, bêbado ou sóbrio.
    Não creio em felicidade ou infelicidade para sempre. Se morresse hoje, morreria feliz. Dezembro passado teria sido um horror se eu morresse.
    Ninguém, no mundo, é sempre ou nunca.
    Ninguém, mundo, sempre.

    ResponderExcluir
  17. Oh, Caio! Hehehe!
    Adorei a descriçao (fiel) dos frequentadores... hehehe!

    E sim, dá trabalho banner novo todo dia.
    Mas dá prazer tb.
    E se dá prazer... tônessa!

    Quem sabe os leitores raposíticos do blog fornecem imagens próprias para ilustrar o TPM???? Hein??

    Hahahaha! Hugzão!!!

    ResponderExcluir
  18. Caraca que delícia este texto! Agudo, forte, belo como Caio. Não sei se disse antes, mas digo agora: Vc escreve bem pra caralho.

    Bj

    ResponderExcluir
  19. Morro de inveja, mas fazer-se o que!?

    ResponderExcluir
  20. Bem nascido, não significa bem vivido. O interior de uma pessoa é espaço inviolável. As aparências enganam.
    Bjão

    ResponderExcluir
  21. Até hoje, só consegui ler trechos de Caio, nada completo. Forca pra mim?

    Mas bom, creio que a tristeza exista sim para todos. Segundo a natureza dual das coisas, sem a tristeza, não haveria a felicidade, não é? Seria tudo um estado único sem nome.

    Beijo Primo!

    ResponderExcluir
  22. Calma babe... foi só uma sugestão... ou melhor dizendo, uma provocação... hehehe! Se sentires desafiado, me escreve no mail do blog... hahaha!
    Ia ser mara ter os blogueiros (devidamente preservados) estrelando os banners do TPM!!! Hugzão!!!

    ResponderExcluir
  23. Ah, Caio! Sempre Caio! Um dia ler-te-ei por completo...

    Belo texto, Foxx!

    Tive o prazer de assistir à peça "aqueles dois" aqui no Rio. Acho que o titulo de seu post é o subtítulo do conto que seu origem à peça...

    Quanto aos viados bem nascidos, também concordo (e tavez por um tiquinho de inveja e despeito) que são em maioria vazios, fúteis, quase desnecessários.

    Mas tbm sei que isto não se aplica a todos, como bem citou o Antonio.

    E não acho que foram infelizes para sempre. Ouso, até, pensar que após os calorosos aplausos com os quais eles sempre prestigiam os atores ao final da peça, após estes aplausos, toda a experiência desfaz-se e eles voltam ao que acham "normal".

    Ou talvez vazios eles sejam como fuga. Dos medos. Das tristezas. Das humanidades. Em público, talvez isto funcione. Talvez os músculos e as grifes e os pós cumpram este papel de escudo. Mas e a sós?

    Um xêro e, mais uma vez, obrigado pelo "desconforto" causado com o comentário lá no blog! =D

    ResponderExcluir
  24. Não sei bem se concordo com vc, que os bem-nascidos não tenham sofrido, ou motivos de ficarem tristes, assim como todos os que não o são, tem motivos par serem felizes. O que me incomoda nesse seu texto é a generalização que ele suscita. claro que ser rico ou ser pobre vai influenciar de alguma forma sobre o que poderá deixar um ou outro triste, assim como tantos outros elementos tbm influenciam.

    ResponderExcluir
  25. não digo q vc é surpreendente pq não o é ... não digo q vc é foda pq vc é mais q isto ... suas contextualizações são mais q perfeitas ...

    é fato q ser feliz ou infeliz são facetas da vida ... mas é fato tb q a vida só pode ser plena se vivida em todas as suas nuances ... então, aqueles q se aninham em redomas, jamais saberão o q é viver plena e intensamente ... jamais saberão o sabor da verdadeira vida ... mas, por mim, quero mais q se fodam ... isto é problema deles e de quem mais queira ser pequeno ...

    bjão querido

    ;-)

    ResponderExcluir
  26. Foram não!
    E outra felizes são os que tomam bebida barata em copo de plástico e que ouvem e ficam roendo com músicas antigas e de conteúdo que são para poucos! Saúde!
    Abraçooo!

    PS: owwnn Caioo.... ai aiii (suspiros)

    ResponderExcluir
  27. o dinheiro compra a eternidade, mas a felicidade, isso ele nunca custeará!

    ResponderExcluir

" Gosto de ouvir. Aprendi muita coisa por ouvir cuidadosamente."

Ernest Hemmingway