Eu subi no ônibus cantarolando a última música do ensaio do coral que faço parte daquela noite. Pisei no primeiro degrau repetindo a nota final de agnus dei, qui tollis pecata mundi para não esquecer que ela é a mesma que começa miserere nobis. Cantava baixinho quando paguei os R$ 2,20 da passagem e ouvi a máquina anunciar aos outros passageiros "inteira". Até ali, não havia reparado em quem estava dentro do ônibus, somente em uma menina de batom vermelho, sentada ao lado do cobrador, que reparava na marca da minha camisa pólo. Ao, no entanto, cruzar a roleta, me deparei, frente a frente, com ele. Olhos escuros, de ressaca, loiro, alto e com músculos que se faziam aparentes na manga da camiseta que usava. Ele me olhou no fundo dos olhos e como uma vítima hipnotizada eu me deixei ficar dentro deles por alguns segundos. Mas me recuperei, me recuperei e fui para o fundo do ônibus. Longe dele.
Eu continuava cantando, em pé, no fundo do ônibus, resolvi não sentar, o fundo do ônibus estava lotado de adolescentes vindos da escola. Agnus dei, quie tolli pecata mundi, dona nobis pacem, baixinho. Quando vejo os mesmos olhos magnéticos me sugando lá da frente do ônibus. Resolvo sentar, entre os estudantes mesmo. Pensava eu com meus botões abertos que aquilo não tinha como resultar em coisa boa. Sentado, desta vez reparei em um menino, também loiro, não mais de quinze anos, de lábios bem rosados. Reparei que ele virou-se no banco, dando as costas para a frente e virando-se para mim. Ele me encarava sem vergonha, como os adolescentes costumam fazer, ao mesmo tempo que continuava conversando animado com seus amigos de escola. Ele ainda estava com seu fardamento, uma escola católica administrada por freiras. Até que ele sorriu para mim. Somente o canto esquerdo de sua boca subiu, mostrando os dentes brancos e movendo junto sua sobrancelha. E eu baixei a cabeça, abri minha pasta de partituras e fiquei relembrando mentalmente a nota de mundi que continua em miserere, até chegar o meu ponto, onde levantei, me preparando para sair.
Caminhei no ônibus olhando para frente, fugindo do olhar do adolescente, a porta ficava no meio do caminho, mas de pé, encontrei outro olhar que esbarrou no meu e demonstrando surpresa passou a me admirar interessado. Moreno desta vez, com cachos caindo sobre sua testa, olhava-me com insistência, porém desceu antes que eu precisasse fugir. Mas desceu no mesmo ponto que eu. Ao descer, eu o vi ainda parado por lá, como se esperasse por algo. Olhava para o horizonte, tentando parecer, imagino, que não esperava ninguém em específico, talvez um segundo ônibus. Todavia, no momento que eu passei por ele, miserere nobis, miserere nobis, eu percebi que ele começou a me seguir. Vinha conversando no telefone, falava bem alto, mas eu não prestei atenção a nenhuma de suas palavras, até que passamos pela esquina de uma rua escura, ele do meu lado, virou-se rápido para mim, dizendo: "Eu vou por aqui, me segue?". Eu fingi que nada acontecera e segui meu caminho direto.
Alguns quarteirões depois, entro a esquerda e já estou perto de casa, quando cruzo com um vizinho, o qual eu admirava em minha juventude adolescente. Sem sombra de dúvida, o mais bonito de todos os jovens homens que moravam por ali. E, por anos, brincávamos de um flerte inofensivo que nunca passou de longos olhares, sorrisos e cumprimentos: "Oi, tudo bem?". Ele se chama Mike. E agora o menino bonito que ele fora se transformou em um homem muito bonito. O corpo continua o mesmo de cinco anos atrás, quando deixei Natal, saradíssimo, mas agora ele aparenta a maturidade dos trinta anos que se aproximam. Ele passou por mim e me cumprimentou, eu respondi o de sempre: "Oi, tudo bem?" também. Continuei então meu caminho somente para alguns passos depois ouvi-lo me chamar, pedindo que eu o esperasse. Chegou sorrindo, apertando seus olhos negros que contrastam com sua pele clara. Falou com voz de malandro que a gente se conhecia há muito tempo e apertou minha mão. Dona nobis pacem, dona nobis pacem. E tocou meu ombro, apertando. "Quando vamos marcar esse rolé então? Já está na hora!". Eu tentei balbuciar uma resposta, surpreendido, mas ele antes disse algo: "Aí, boy, ser que tu não tem cinco reais p'ra me emprestar não?".
MORAL DA ESTÓRIA:
Por mais que você fuja, quando algo tem que acontecer, sempre acontece.
Bravo! Foi uma viagem deliciosa esse seu texto, arrepiei! mas essas coisas não acontecem comigo, Rá
ResponderExcluirque bom que gostou, Fer.
ExcluirMuito bom mesmo ... exceto o final ... bem Foxxiano! rs ... Mas está vendo? se tivesse facilitado as coisas no ônibus suas preces musicais poderiam ter sido atendidas sem os malditos cinco reais ...
ResponderExcluirPaulo, eu acredito piamente q qualquer um no ônibus teria exatamente o mesmo resultado.
ExcluirMuito bom! Agora vamos combinar que Lê Foxx não é homem de fugas, nzé? Hahahaha!
ResponderExcluirE sobre o "selinho": jura pra mim, Raposão... que tu - quase um semi-deus do Olimpo Blogsvilleano - ia se dignar a responder ao selinho se eu tivesse te indicado... DJURA, NZÉ? Hehehehehe! Bjz! Ótimo fds!
sim, responderia sim, não conquistei meu posto de semi-deus ignorando convites. hauahauahaua
ExcluirQuando uma coisa tem que acontecer, acontece. Mas a gente sempre tem a opção de seguir ou fugir do acontecimento depois que ele se sucede.
ResponderExcluirPrimo, quando fizer o primeiro post do projeto me avisa, põe a tag Projeto verão 2013, que ai eu linko lpa no uivos direto para a tag.
Beijos
qndo a gente vê a merda ali na nossa frente, o melhor é fugir mesmo.
ExcluirOs legítimos caçadores tem estilo. É uma arte, não essa pobreza com que você se defrontou. Isso não vale a pena. Não há beleza, nem tesão nisso. Você fez bem!
ResponderExcluirAbração.
q bom q vc me entende
ExcluirFoxx, fiquei pensando durante a leitura que vc estava com mania de perseguição (isso existe?).... mas cá entre nós, caçador que é caçador abate a presa "in loco"...rsrsr. Fez bem em "dar no pé", pois nada parecia muito promissor. Mas eu ficava com o primeiro... Vc não se sentiu tentado? rsrsr Ab.
ResponderExcluirsabe qndo sua intuição sabe q não vale a pena, Margot?
Excluirentão...
Foxx:
ResponderExcluirConfesso: tenho adorado as coisas que leio. Este texto está divino mesmo. Fico me perguntando o que é verdade e o que é ficção e isto me excita profundamente ao ler seus textos. Abraços e lindo fim de semana.
não, Edilson, felizmente ou infelizmente é absolutamente tudo verdade.
ExcluirEsse sim foi um dia fértil!
ResponderExcluirexcelente descrição. hauahuahaua
ExcluirVc fugindo?
ResponderExcluirSe fosse eu até dava pra entender, mas vc?
O quê que houve?
fujo pq todos esses homens sempre querem apenas q eu pague para estar com eles, qrido. então eu fujo.
ExcluirEu pensei tivesse lido, aqui, um outro conto, do assalto ao ônibus,com Foxx passageiro, numa narrativa absolutamente literária, grandiosa.
ResponderExcluirSerá que foi viagem minha?
Agora, sobre o novo texto: gosto muito desses seus escritos.
ResponderExcluirTalento pra escrever e contar histórias de um jeito interessante e belo não lhe falta! Quando vc põe isso pra fora... Que beleza!!
Desde que comecei a acompnhar seu blog, há alguns meses, ao lado de toda a erudição explícita, esses seus textos são os que mais me encantam.
obrigado por todos os elogios...
Excluirde verdade, suas palavras contam muito pra mim...
aquele texto do assalto é um texto de 2006 que eu coloquei o link apenas na página do facebook, pq estou fazendo lá a linha do tempo do blog.
Sorry! Nem prestei atenção. Achei atualíssimo.
ExcluirSua escrita, então, é grande já há anos...
Continue!
que bom q gostou, seu lindo.
Excluiro que mais me impressionou nessa história foram os 2,20 de passagem, vc mora no paraíso ahsuahuhausa
ResponderExcluirkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
ExcluirMELHOR COMENTÁRIO. Ganhou já!
Dá até pra imaginar as cenas. Um menino vindo do coral, cantando o agnus dei (nada mais apropriado) e o mundo real (talvez a parte menos lírica dele) tentando... Na verdade não vejo o título como uma tentativa de fuga, mas sim como outro tipo de tentação. Aquela que o mundo não lírico tenta impor a meninos (que embora não pareçam, são) no meio da noite.
ResponderExcluirMiserere Nobis! Beijão...
nossa! qntos niveis de interpretação em 5 linhas!
ExcluirBelo texto.
ResponderExcluirDaqueles que eu gostaria de ter escrito.
Legal tb sua reação. Quer dizer, não ficou mt claro como foi sua reação no último.
Pra mim, foi uma surpresa vc sair do ônibus sozinho. (piada interna).
vou ignorar a piada. kkkkkkkkk
ExcluirGente! Como assim? O que você usou quando tomou banho neste dia? Hein? Por mais que não tenha sido assim tão... "positivo", hahahaha
ResponderExcluirah, isso acontece sempre, e o resultado é sempre o mesmo.
ExcluirGente! Como assim? O que você usou quando tomou banho neste dia? Hein? Está legal. No final, acabou sendo mais um dia na tua vida e tudo mais, mas foi um bom dia. hahaha
ResponderExcluirFOXX, peraí, tá que eu vi que vc disse que todos se aproximan e querem a mesma coisa, mas vc tem certeza? Pq se fosse eu, eu teria feito os 4 e juntos ainda.
ResponderExcluirE vc diz que as coisas para vc estão dificeis... como assim? Me passa um pouco deste teu mel!!!
sim, amigo, eu tenho absoluta certeza. e anos atrás eu tb teria feito os quatro, mas não estou mais nessa fase. e sempre foi mto fácil pra mim conseguir sexo, mas o que é dificil, sempre falei isso, é encontrar alguém que queira mais que sexo.
ExcluirMesmo eles exigindo dinheiro?Isso não mexia um pouco com a sua cabeça não?
ExcluirTo com Otavio.. Os 4 de vez.. Is the best!!!
Excluirpois é, anônimo, anos atrás eu lidava bem com essa coisa de dinheiro, comia e depois desaparecia, evitava qualquer contato depois, mas agora eu prefiro só fazer sexo com alguém q goste de mim... então, com dinheiro, é totalmente impossível
ExcluirVc lavou a cueca que tava usando nesse dia?? Pelo amor de Deus, se não lavou manda pra mim que eu vou ferver ela e fazer um perfume pra mim, vai ser mais babado que o chá da bota....
ResponderExcluirisso na verdade não tem nada de surpreendente... é comum isso acontecer, ai vc diz q então eu reclamo de barriga cheia, mas tb eles se aproximarem e pedirem dinheiro tb é sempre o que acontece....
Excluirrsss... Eu não disse que vc reclama de barriga cheia.. Isso ai eu super-entendo.. Conseguir sexo realmente é infinitamente mais fácil do que conseguir uma ligação no dia seguinte.. Mas ainda sim to querendo o perfume, meu bem!!!!
ExcluirVai lá no Yag q te respondi...
Amo-te!!!
Oi Foxx.
ResponderExcluirE você não perdeu o tom?
Fascinante sua história.
Um abração.
olá, como vai?
Excluirclaro q não.
a gente diz não e mantem a pose
hehehe
Blog divertido, rs!
ResponderExcluirUm ótimo primeiro contato.
Te vi através do Satélite Assassino do amiguinho Alan.
Te espero no meu blog
http://www.cinemarodrigo.blogspot.com.br/
Abraço.
que bom que gostou, Rodrigo
ExcluirGente quem me dera se algum ser humano reparasse em mim... Enfim, não vou me aproveitar deste espaço para choramingar a desgraça de minha vida...
ResponderExcluirAchei interessante a história com várias possibilidades e sendo arrematada com um final bem inusitado, digamos assim. A linguagem flutuante deu um toque especial, assim como o Latim funcionando como plano de fundo. Confesso não saber de cabeça se tudo que está em latim está correto, mas também não é o caso. (devo confessar que necessito do meu dicionário e gramatica. Fiquei curioso).
Viu como eu estou sempre aqui?! Não perco seus textos.
ah, amigo, confie em mim, o latim tá certo sim. hehe
Excluirque relato... praticamente a dama da lotação! hehe
ResponderExcluirpra que fugir? encare, não abaixe a cabeça!
fujo pq naum qro sexo por sexo, sabe?
ExcluirPra mim isso é culpa dos feromônios... Tava matando a pau, hein?? rs
ResponderExcluirBom, se o melhor a fazer é fugir, vá a toda velocidade!!
Abraços!!
não é? deve ser pq tow na seca, ai tow vazando feromônio...
ExcluirUma Sue muito da "aparecida", nzé? Hahahahaha! Boa semana, Raposão!
ResponderExcluirvocê arrumou os cinco reais? rsrs
ResponderExcluirQue delícia de texto! O Miserere intercalando tudo então... adorei! R$ 5? Poxa... baratinho este. Mas te entendo: o que vc quer não tem preço, né? ;)
ResponderExcluirBj e se cuida
disse tudo, Rafa...
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