Google+ Estórias Do Mundo: fevereiro 2011

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Atípico (Dia I)

, em Belo Horizonte - MG, Brasil
Deveria ser um dia comum, deveria, mas eu acordei de madrugada e liguei a televisão, e não foi apenas por eu acordar no meio da madrugada ou ligar a tv, ou por estar terminando O Casamento de Muriel em algum canal, na exata cena em que ela dá adeus a cidade de dentro do táxi, aquele dia não tinha nascido para ser comum. Naquele mesmo dia, mais tarde, o Antônio Castro também chegaria a Belo Horizonte do Rio de Janeiro. Ele veio me visitar após ter furado comigo da última vez em que eu pisei em terras fluminenses. Mas com ele, será, que haveria chegado também novos ventos a minha vida?
Era uma quinta-feira e decidimos ir a Josefine, boate de barbies e carão que eu não visitava desde ,pelo menos, a visita do Bruno a Belo Horizonte. Entramos, após um aquecimento no Imperial, novo bar que tem  sido agora o novo ponto de encontro da juventude hipster da capital, ou seja, estávamos cercados de meninos e meninas com camisetas xadrez, bermudas com a barra dobrada e tênis Adidas, e com um sério problema de identidade de gênero. Mas voltando a Jô, uma angústia não evitou-se de apertar minha garganta quando vi seis go-go boys em seus trajes de praxe dançando mal e porcamente. Porque os go-go boys de  Minas Gerais são péssimos dançarinos, mesmo! Mas, na verdade, não era meu senso crítico que me apavorava, era o meu pavor de pegação que ameaçava minha noite, contudo, enfrentei-lhe com mais algumas cervejas e muitos cigarros. Estávamos, eu e o Antônio, acompanhados de um amigo aqui de BH, o Luthor, o qual rapidamente levou o meu hóspede para conhecer o dark room da boate enquanto eu ficava na pista. O Luthor voltou rápido, como bom mineiro, "dark room não é lugar para bons meninos frequentarem", contudo, logo ele conheceu um menino pela pista e ficaram. Ele me apresentou o menino e seu amigo, cujo sorriso, definitivamente, me encantou e acabamos por trocar uns beijos, por pouco tempo, afinal logo ele disse-me: "Desculpa, mas é que eu estou a fim de ficar com um outro carinha ali". Eu nem cogitei questioná-lo, simplesmente disse-lhe para se divertir. Encerrei, um tanto puto comigo mesmo, aquela noite com homens. Irritei-me, profundamente comigo mesmo, a ponto de chorar de raiva nos ombros do Antônio, por ter me deixado levar por aquela dinâmica. "Se não saber brincar, não desce para o play", não é?
Contudo, a noite ainda não havia terminado. Na Josefine, com certeza, mas voltando para casa, de ônibus,  reencontrei um amigo de amigos, Rodrigo, com quem eu já bebi algumas vezes junto a turma de amigos de Belas Artes de uma das meninas com quem dividi apartamento. Surpreendi-me de vê-lo no ônibus e sentei ao seu lado e começamos a conversar quando ele coloca a mão na minha perna e a apertou sorrindo. Disse que estava indo embora de Belo Horizonte aquela semana, que estava aproveitando as últimas coisas boas da cidade, antes de ir. Para São Paulo dizia. "Últimas coisas boas" e apertava a minha coxa. Meu ponto chegou e eu disse que ia descer, chamei o Antônio que havia sentado umas duas cadeiras antes, descemos e quando olhei para o ônibus ele não estava mais lá. Havia descido conosco.
Ele notou no meu olhar a surpresa por ele ter descido, e eu notei seu constrangimento, então convidei-o para ir a minha casa, afinal não se joga pela janela aqueles cabelos compridos e olhos apertadinhos e sorriso safado. Mas, após instalar o Antônio no colchão na sala, e levá-lo ao meu quarto ele anunciou: "Olha, só vai rolar um sarro". Eu acatei a decisão dele, não havia porque discutir, e após ele gozar, apressou-se em dizer que era tarde e precisava ir para casa. Era realmente tarde, ou cedo, o sol já começava a despontar. Demorei a dormir pensando porque aquele papo de apenas um sarro. Seria ele gouinage? Mas pela manhã uma outra explicação, após uma notícia, talvez, seria mais provável. Descobri que ele tem namorada. Será que ele não faz sexo com penetração com homens por algum preconceito que ele ainda nutre sobre isso? Não sei! Se for, só tenho isso a comentar: Oh, honey!

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Eu Sentirei Muito Sua Falta

, em Belo Horizonte - MG, Brasil
Bê foi-me apresentado pelo Goiano, quando cheguei a Belo Horizonte, ainda pelo MSN, e contrariamente a todos os outros mineiros, logo, ele quis que nos encontrássemos. Aprenderia eu depois o quão único ele estava sendo. Abriu sua casa, me apresentou a sua família e aos seus cachorros;  abriu seu grupo de amigos, me apresentou a eles e quis que eu me tornasse amigo deles também, abriu sua vida para que eu pudesse entrar, me instalar, participar. Ao contrário de todos os outros mineiros. O Bê, quando me viu sozinho, sem namorado ou amigos, foi o único, mineiro ou não, que me estendeu a mão e fez o que nenhum outro tinha coragem de fazer: me convidou para programas, bebedeiras, baladas, mas o mais importante, me convidou para frequentar a casa dele, a família dele, os amigos dele, porque é assim que você transforma alguém em seu amigo, não é em bares e baladas, é dividindo com ela sua intimidade, seus desejos, suas angústias, e ouvindo as dela. O Bê foi o único que fez isso. Ouviu meus problemas, cedeu seu ombro, amparou minhas quedas, me protegeu, até, quando eu tremia de medo. O Bê me ensinou que devemos nos aceitar exatamente como somos, com nossos defeitos e qualidades, me ensinou muito sobre culinária, sobre aceitar-se gay, me ensinou tanto que agora entre as minhas conversas, com as poucas pessoas que eu conheço, sempre há citações que eu faço a ele, ao Bê. Ele foi o único a comemorar minhas poucas vitórias por aqui e a torcer por mim, em vários momentos, a se preocupar e a sinceramente tentar me ajudar com o fato de eu não conseguir namorar. O Bê foi o único a entender que meus problemas em namorar não são porque eu tenho baixa auto-estima, que é mais fácil o fato de eu me considerar bonito-inteligente-e-gostoso prejudique mais do que ajude, foi o único a perceber que realmente as pessoas não se interessam por mim. O Bê não foi, no entanto, o único amigo que eu fiz nesta cidade, contudo, não tem como negar é definitivamente o mais importante e melhor amigo que fiz entre os mineiros. Agora, ele se prepara para ir embora, mais alguns seis dias ele permanece em terras brasileiras, porque a Germânia o aguarda. Mas eu sentirei muito a sua falta. Sentirei sua falta, Bê.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Eu Queria Que.

Eu queria que ele reconhecesse que meus olhos têm um tom de mogno. Lixado e envernizado. Ou como um olho-de-tigre, aquela pedra que descomplica as coisas e te permite exergar por vários ângulos. É, eu queria que ele comparasse meu olhos a duas pedras de olho-de-tigre, que mudam de cor conforme a luz incide nelas, que são castanhas, mas quase faíscam um dourado. 
Queria que ele reconhecesse o vinco entre minhas sobrancelhas. A tensão que o provoca e o sorriso que o desfaz. Reconhecesse o vinco abaixo dos olhos e o que provoca minhas olheiras, quando eu durmo de menos, ou demais, quando estudo muito, leio muito, até tarde, sem parar. Queria que ele reconhecesse no meu semblante se meu dia foi incrível ou se preciso de um colo para chorar. 
Eu queria que ele soubesse dos meus cabelos brancos, nos que começaram aos dezoito anos a rarear na cabeça, mas também os que infestam minha barba. Mas que também soubesse dos fios ruivos, vermelhos, laranjas, acobreados, que se insistem em nascer. Queria que ele soubesse que já nasci loiro e que provavelmente terei filhos ruivos, porque genes recessivos são assim mesmo, e o sangue holandês  Van Der Borg da família que grita por uma chance para aparecer.
Eu só queria que ele visse a mim, olhando meu rosto, dentro dos meus olhos. A mim. E me reconhecesse aqui. Como alguém que ele pudesse vir a amar.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Homohistória (Introdução - Sumário)

Apesar das manifestações contrárias, antes de continuar, preciso reforçar esta afirmação. Não existem gays antes do século XX. E não existem homossexuais antes do século XIX. Qualquer um que afirmar o contrário deve ser olhado com desconfiança. Desconfiança porque, durante muito tempo, os especialistas em História do Homoerotismo (relações sexuais com o mesmo gênero) estavam tão preocupados em afirmar que os homossexuais e gays sempre existiram que acabaram criando mitos em torno de alguns momentos da história e acabaram por apagar as diferenças entre os tempos. Apagaram também que ser gay é uma identidade, não é uma ação, condição, reação. É sobretudo assumir essa identidade que confira ser, hoje em dia, gay. 
Ser gay é um assumir-se como tal, além de uma manifestação cultural (não de cultura gay, mas de cultura ocidental e cristã) e política (já expliquei isso também). Vocês podem aqui achar que eu estou enganado, mas deixa eu explicar antes disso. Qual é a primeira coisa que você faz, ao descobrir que tem desejos homoeróticos, hoje? Não é criar a oposição eu não sou heterossexual como meus pais, meus irmãos, meus colegas da escola e sim sou gay? Ao admitir isso, com muitos traumas para alguns, facilmente para outros, mas de qualquer forma com problemas imensos quando essa mensagem precisa ser transmitida para qualquer outro membro de sua convivência (estou falando de "sair do armário"), você não admite uma opção/condição, você assume uma identidade que por mais que seja irritante, para alguns, ela vai definir muitas coisas na sua vida dali em diante. Ser gay é um estilo de vida que se volta apenas ao amor com homens (no caso masculino) ou apenas ao amor com mulheres (no caso feminino). Prestem atenção no apenas. Isso é assumir-se gay, isso é o que nunca existiu antes na história humana: homens que decidem que vão orientar toda a sua sexualidade apenas e unicamente a outros homens e mulheres que decidem fazer o mesmo apenas com outras mulheres.
Talvez a palavra "decidem" aqui deve descer rasgando na garganta da maioria de vocês, mas calma, há uma explicação de porque a escolhi. Os gays decidem sim viver essa vida de uma forma gay, eles poderiam ser "incubados", bissexuais, poderiam ser "curiosos", poderiam ser "homens que fazem sexo com outros homens", existem outras identidades que poderiam ser assumidas, mas eles (eu, vocês, nós), decidimos que preferimos o rótulo de gays, e que este, em relação aos anteriores que eu citem, por exemplo, é melhor e nos fará mais felizes.
Volto no assunto porque se isso não ficar muto bem explicado, estarei explicando outras realidades históricas e vocês entenderão que discuto o presente. E esse não é meu objetivo. Tenham sempre em mente que não estou tratando aqui, nesta coluna, de um universo binário em que a homossexualidade exclui necessariamente as experiências heterosseuxias (e vice-versa). Até o século XIX, esta oposição é inédita.
Para explicar isso, elegi alguns temas para os próximos posts. Primeiramente, tratarei sobre a Antiguidade, depois Medievo, Modernidade e Contemporaneidade, na ordem cronológica. Os temas no entanto não serão necessariamente cronológicos dentro destes grandes campos. É mais provável que sejam sincrônicos. Vou começar com o Egito, A Injúria de Hórus, falar sobre os deuses Hórus e Seth e seus relacionamentos sexuais, depois sobre o terceiro sexo egípcio e o Livro dos Mortos, em Danações Eternas, encerrando com a Tumba dos Dois Amantes. Depois trataremos da Mesopotâmia com O Amor de Eridu e Gilgamesh, sobre a epopéia de Gilgamesh, poema escrito antes de Cristo que celebra o amor entre dois homens, depois Olho Por Olho, Dente Por Dente, sobre as leis assírias sobre sexualidade, e A Deusa Inanna, texto referente aos mitos que explicam a existência de homens efeminados no mundo.  Também trataremos da Fenícia em Os Sacerdotes de Astarté, explicando sobre prostituição masculina sagrada, e para a Pérsia Os Daeva e o Castigo de Ahura Mazda, as proibições persas sobre os relacionamentos homoerósticos, e Bagoas, o eunuco, sobre como era permitido, apesar das proibições religiosas, os relacionamentos homoeróticos. Também trataremos aqui de Israel e trataremos de Sodoma e Gomorra, as condenações e proibições do Deuteronômio e Levítico, e as referências positivas em Davi e Jônatas e a grande confusão em torno de Rute e Naomi.
Numa segunda parte trataremos do universo greco-romano. Primeiro, falando da Grécia, trataremos  em O Mito Grego, do mito em que a Grécia é onde surgiram os gays e homossexuais, e depois trataremos dos contos míticos gregos sobre Zeus, Apolo, Herácles, Possêidon, Dionísio e Artêmis e seus casos homoeróticos, depois nos voltaremos a autores gregos para falar de como certas cidades entendiam os relacionamentos homoeróticos falaremos de Atenas, Esparta, Tebas, Corinto e Lesbos, para apresentar cinco modelos distintos. Sobre Roma, falarei de poetas para explicar como os romanos passam, influenciado pelos gregos a adotar o Amor Grego, mas também falarei das reações romanas a essa invasão cultura com A Moral de Cícero, mas não sem falar das críticas de Suetônio aos Homens e Mulheres de César e também as Críticas de Tácito. Por fim, encerro aqui falando da Igreja de Paulo, com um texto sobre a Carta de São Paulo aos Coríntios, já publicada, e a Carta de São Paulo Aos Romanos.
Por enquanto é isso, ainda tenho que preparar os textos sobre Índia, China e Japão, também preparar sobre a Idade Média, Renascimento, mas o texto sobre Romantismo já está pronto. Mas vou organizar tudo direitinho aqui.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

, em Belo Horizonte - MG, Brasil
Alta madrugada em Belo Horizonte, e eu caminhava pela avenida Augusto de Lima, em direção ao ponto de ônibus, quando cruzei com ele. Magro, olhos expressivos, sorriso encantador, perguntou meu nome e elogiou minha barba. Perguntou de onde eu vinha e contei-lhe que vinha do terceiro bar naquele dia, que encontrara uma amiga, já bêbada, na Praça da Estação, "num barzinho bem copo sujo"; depois encontrara outros amigos no Estúdio da Carne, onde discutimos religião, política e futebol, e onde, um desses amigos, conheceu um menino e me levou, junto com o menino que tinha apenas dezoito anos, a outro bar, porque ele queria conversar. Já ele falou que fazia programas. Contou dele, contou quanto cobrava, contou como era sua vida, e me convidou para mais uma cerveja. "Não tenho dinheiro para programa", disse-lhe seco. Ele falou que tudo bem, que não era programa, que gostou de mim, só íamos conversar um pouco. Eu sabia que era mentira. Afinal, por mais que músicas de Odair José digam o contrário, putas e putos não se apaixonam, eles trabalham. Mas, mesmo assim, sentei no quarto bar com ele, e ele nem discreto foi. "Compra uma cerveja p'ra gente?". Eu ri por dentro. Gargalhei na verdade. Mas comprei a cerveja e sentei, ele serviu-se e conversamos a madrugada toda. Cheguei em casa as 8h da manhã. Conversando e pagando cervejas para um garoto de programa. Ele se irritou quando percebeu que realmente eu não ía leva-lo para cama e pagar os cem reais que ele cobrava pelos seus olhos expressivos e sorriso encantador, e o garçom daquele bar com karaokê sorriu com pena quando paguei a conta e levantei sozinho, voltando para casa. No ônibus, de volta, tonto, encostei a cabeça no vidro da janela. E olhei para as casas e prédios que se afastavam. Eram como promessas de amor. Só passavam por mim. E, naquela noite, em que eu paguei para alguém ficar ao meu lado, ouvindo minhas palavras, eu notei como eu estava só.

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Às Crianças

‎"Toda vez que você disser amém, 
na sua casa ou no seu lugar de oração, 
ao ódio pelas pessoas gays, 
saiba: uma criança estará ouvindo"
(Orações Para Bobby - Mary Griffin)


Todos os dias, os pequenos, ouvem em suas casas, na escola, na Igreja que frequentam, de seus pais, de seus irmãos mais velhos, de seus professores, dos padres e pastores, de todos aqueles que deveriam estar lá para protegê-los que aquilo que eles sentem, que eles vivem, que eles tentam controlar está errado.  Que eles são abominações, pecadores, não-naturais, imorais, pervertidos. Meu irmão disse uma vez, na mesa do jantar, que os gays deveriam ser largados numa ilha e abandonados lá para morrer. Meu pai e minha mãe concordaram. Que eles não merece a vida, a felicidade, o lugar que eles sonham conquistar no mundo. Meu vizinho, um ano mais velho que eu, repetia o que ouvia dentro da sua Igreja (evangélica) que aos gays só restava o inferno. E como criança, eu acreditei, acreditei que iria para o inferno.  Onde estavam aqueles lá que deveriam defender os pequeninos? Quantas outras crianças não passaram por isso? Quantos meninos e meninas por aí, ouvem de seus pais, irmãos, tios, padres, pastores, aqueles que deveriam estar lá para protegê-los, que condenados, a eles só pode estar destinada a morte, o afastamento, a solidão, a desesperança? Meu outro irmão um dia entrou no meu quarto e, com o dedo em riste, disse que se eu virasse gay ele mesmo me mataria. Quantas e quantas mais crianças precisarão passar por isso? Ouvir na escola que são inferiores, que são de segunda classe, de que não merecem nem terminar seus estudos?  Um colega de escola, cansado de ouvir xingamentos em sala de aula, cujos professores não faziam nada para evitar largou os estudos. Quantas crianças ainda precisarão ouvir que não pertencem aquelas famílias, que não são mais filhos de seus pais, que são a grande decepção da vida deles, que merecem a morte? Onde estão aquelas pessoas que deveriam protegê-los? Um aluno meu era espancado pelo pai porque este achava que ele era gay, ele virou-se para mim com os olhos cheios de lágrimas e me contou: "Professor, eu nem sei o que é ser gay". Quantos sonhos, quantos espíritos, serão destruídos por este ódio que comanda a vida de pessoas? Quantas vidas serão arrancadas de corações tão puros pelo simples fato de que eles não puderam escolher ser iguais aos outros? Quantos mais? Quantos serão assassinados pelas ruas, espancados com lâmpadas, xingados através de vidros de carros passantes? Quantos mais precisam ainda acreditar que não tem o mesmo direito a vida que um heterossexual "normal"? Um outro aluno meu, de 15 anos, quando descobriu que as pessoas sabiam que ele era gay enforcou-se no quarto em que dormia com uma corda de sisal. Quando ódio precisa ser ainda despejado sobre as nossas crianças? Por que eles não nos atacam, os adultos, aqueles que podem se defender e deixam as crianças em paz, deixem seus corações inteiros, vivos, alegres. São apenas crianças. Um amigo meu foi expulso de casa aos 17 anos, por ser gay, ele viveu na rua durante meses. Quantos mais ainda vão ser jogados a sua própria sorte porque aqueles que deviam protegê-los não sabem que as crianças são frágeis e aquilo que se faz a elas destrói mais do que seu corpo, destrói seu coração, seu amor-próprio, seu espírito, seu futuro? Quantas crianças mais serão mortas ainda, por dentro, sem sangue, terão seus sonhos, esperanças e espíritos esmigalhados por este ódio desenfreado? Quantas mais? Por favor, eu lhes peço, aprovem as leis contra homofobia, não por mim, mas pelas nossas crianças, nós somos aqueles que deveriam protegê-las.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Outros Talentos (Série Esportiva)

Agradecendo os elogios ao texto anterior, com certeza muito mais devidos a presença das palavras de Caio Fernando de Abreu do que as minhas, vou colocar um outro "talento" meu aqui a apreciação vossa. Espero que gostem.






terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

"Aparente Mediocridade e Repressão"

, em Belo Horizonte - MG, Brasil

Sentamos naquele teatro, de paredes cobertas de cobre, com os  viados bem-nascidos de Belo Horizonte. Tudo para ouvir Caio. E naquele deserto de almas, naquele deserto de almas também desertas, a ironia se fez presente. Aqueles bem-nascidos vestindo suas justas calças Calvin Klein e camisetas pólo da Zara que apertavam seus músculos conseguidos em alguma academia na Savassi ou em algum bairro com nome de santo, que nunca beberam espumante nacional em copo de plástico, nem ouviram velhos boleros em espanhol, que nunca ouviram sutil llegaste a mí como una tentación llenando de inquietud mi corazón, nem Dalva de Oliveira ou Ângela Ro Ro, acostumados a suas carreirinhas de pó e música eletrônica da The Week, ou de Buenos Aires, ou de Miami, não importa! Aqueles belos viados, bem-nascidos, que juntos despertam os olhares curiosos das moças, que cochicham sem eles perceberem. Moços bonitos. Todos sempre acham, e muitas mulheres (e homens) ficam nervosos quando eles surgem, sempre bonitos, sempre perto de outros tão bonitos quanto eles. Talvez, e faço essa minha teoria, o bonito de um estimule o bonito do outro e vice-versa, mas o bonito de fora, porque tenho minhas dúvidas, se eles são algo mais que só bonitos. Só bonitos estes bem-nascidos. Até porque esses bem-nascidos nunca choraram se sentindo sós, pobres, feios, infelizes, confusos, abandonados, bêbados ou tristes, bem tristes, completamente tristes. A eles, por serem bem-nascidos, nunca um Atento Guardião da Moral vai dedicar-lhes a pena para acusa-los de desavergonhada relação anormal ou de aberração psicológica doentia. Não, nunca aqueles que são os  viados bem-nascidos. Nem se falassem, eles, altivos, perceberiam. A ironia é que Caio é tudo isso, é espumante nacional, velhos boleros, choro convulsionado, feiúra, confusão, abandono, e tristeza, Caio fala sobre tristeza, a tristeza que não toca aqueles que são bem nascidos, a tristeza de verdade. Mas io que é isso de "verdade", ó Caio?  Porque pensei cá comigo que todos ali dentro tinham a nítida sensação de que seriam infelizes para sempre. Pergunto a você Caio Fernando de Abreu, eles foram?

Texto cheio de referências ao conto Aqueles Dois de Caio Fernando de Abreu.