Google+ Estórias Do Mundo: Índia: A Natureza e o Rigveda

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Índia: A Natureza e o Rigveda

, em Belo Horizonte - MG, Brasil



Os hindus tem vários textos sagrados e diferentes grupos sociais dão diferentes importâncias a cada um desses textos, além de que cada grupo tem interpretações distintas dos significados destes textos sagrados, contudo os Vedas (o conhecimento), escritos por volta de 1500 a.C., são os mais antigos textos escritos em sânscrito que nos restaram. Estes textos são considerados pela tradição hindu como incriados, isto é, como textos que sempre existiram e se revelam aos sábios que conseguiram chegar a um certo patamar da evolução espiritual. Os Vedas são basicamente constituídos por mantras que representam hinos, orações, encantos, formulas rituais, endereçados a vários deuses e deusas sendo os mais citados: Rudra, Varuna, Indra e Agni. Estes estão colecionados em antologias chamadas Samhitas que são quatro: Rigveda, a antologia de poesia e hinos; Yajurveda, a antologia de orações; Samaveda, a antologia de músicas e Atarvaveda, a antologia de ritos, encantos e formulas mágicas.
Entre os quatro o mais antigo é o Rigveda, o conhecimento dos hinos, consiste em 1028 hinos e é o único que tem passagens que tratam das relações homoeróticas. Os historiadores Ruth Vanita e Saleem Kidwai, no seu pioneiro livro Same-sex love in India, afirmam que não existem referências explicitas ao homoerotismo em nenhum dos Vedas, porém quando no Rigveda se diz que perversidade/diversidade é tudo aquilo que a natureza é, ou que aquilo que parece não-natural também é natural (vikruti evam prakriti, em sânscrito), muitos especialistas tem acreditado reconhecer aí uma constância cíclica das dimensões homoeróticas e transsexuais da vida humana, como todas as outras formas que distam do padrão. Em outras palavras, como o hinduísmo acredita que o diferente também é normal, pelo menos é o que os textos sagrados pregam, os especialistas contemporâneos tem entendido que os textos sagrados hindus seriam inclinados a aceitar as relações homoeróticas como parte da natureza humana também.
O hinduísmo é ainda mais complacente com os denominados Tritiya-prakriti, o terceiro gênero, não totalmente homem nem mulher, que são mencionados tanto nos Vedas como nos Puranas, apesar de não serem claramente definidos, deixando seu significado pairando entre o homem efeminado, às vezes também somente o covarde, mas também aqueles homens que não sentem desejo sexual pelas mulheres. Contudo, Devdutt Pattanaik diz que, não obstante, estes comportamentos homoeróticos serem conhecidos por todos na Índia, eles não eram aprovados, o que discorda Amara Das Wilhelm, historiadora que escreveu Tritiya-prakriti: People of the third sex, publicado nos Estados Unidos em 2003. Esta acredita que a posição destes membros do terceiro sexo e dos praticantes de atos homoeróticos era muito positiva na sociedade arcaica hindu, pois, diz ela, que os antigos Vedas ensina a tolerar a diversidade de tipos sexuais dentro de toda a sociedade. É o reconhecimento de que aquilo que é natural é muito mais amplo e diverso do que o binário macho-fêmea de nossa contemporaneidade.

16 comentários:

  1. Oi, tudo bem com você? Olha, bela exposição essa, heim... erudição é com o senhor também, né (kkkkkkk). Eu não entendo coisa alguma disso tudo, mas vou arriscar um palpite.

    Se eu não me engano, existem duas fases bem distintas no hinduísmo: essa que você está nos falando, o Hinduísmo Védico (que é a fase mais antiga, mais originária) e o Hinduísmo Bramânico, com a consolidação da trindade Brahma/Shiva/Vishnu (o universal, o destruidor e o preservador), além, obviamente da casta dos brâmanes, que veio “codificar” (engessar?) os preceitos védicos.

    Bem, mas isso não importa. Uma coisa que você fala e que eu considero muito importante diz respeito ao binômio “padrão/normal". Quando eu penso em “padrão” logo me vem à mente o conceito de “maioria”, tipo num jogo entre Corinthians e XV de Piracicaba no Pacaembu (kkkkkkk) onde a maioria da torcida, com certeza é corintiana. Então eu pergunto: torcer para o XV de Piracicaba e estar assistindo esse jogo, não é normal?

    Deixo pra todos pensarem! Meu amigo Foxx eu sei que entende isso direitinho...

    Beijão, Foxx.

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  2. hoje é segunda, a coluna mudou de dia? Sabe, fazendo uma observação bem ampla, geral, os antigos eram muito mais tolerantes, pelo menos no que se refere aos de castas mais elevadas, u mesmo, ligados a religião. Digo isso, pq todos os exemplos citados, nos outros textos, e nesse tbm, são ligados a esses indivíduos. Claro que isso advém dos textos que foram preservados, mais ligados a essas personalidades. Mas será que isso se aplicaria a todos da comunidade?

    Inté.

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  3. já disse e volto a dizer: gosto muito desses textos seus, me sinto lá...

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  4. Ah bem, como ninguém mais estuda história (e mais nada mesmo) tamu fudido!

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  5. Oxe! Ninguém estuda história?! As historiadoras continuam a se reproduzir, para o nosso bom deleite. Tenho certeza que elas dominaram o mundo, se já não dominam. Beijão!

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  6. Sempre que se toca no tópico de relações homoeróticas em civilizações de épocas passadas a questão de como elas eram percebidas sempre surge, e sempre existe esse embate de opiniões a respeito de sua aceitação na sociedade em questão.

    Certa vez um sujeito nos comentários de um vídeo do Youtube sobre o tema, tentando provar que a idéia de que as relações pederastas na Grécia não eram bem vistas, chegou a proclamar a história de Zeus e Ganimedes como uma falácia (o que eu não saberia responder já que não tenho conhecimento suficente) e que não acreditava também na de Aquiles e Pátroclo (também li que existem controvérsias) porém quando ele disse que duvidava que Aquiles tivesse relações homo porque achava difícil (ou que não permitiriam, não lembro) que um afeminado fosse um soldado.Nesse momento ele se entregou, no seu preconceito.E depois até admitiu achar que a idéia da pederastia como algo comum na Grécia fosse uma propaganda da comunidade gay.

    Outra coisa que me intriga assim como ao Daniel Prestes é o fato de homoerotismo aparecer sempre relacionado a um status elevado.Tenho curiosidade em saber como isso acontecia e era percebido pelas classes mais baixas, mas estas não tinham tantos meios ou preocupação de registrar a sua história.

    Bom acho que a homostória assim como a homossexualidade na natureza devem ser estudados apenas como um assunto interesante e não como base para argumentação do que quer que seja, como vemos por aí, caso contrário pode-se acabar numa roubada.

    E ao contrário do que muitos pensam, nem acho que a condição dos homossexuais (sei que o termo não existia na época, mas me falta um melhor) tão positiva assim nas sociedades antigas,na verdade elas parecem sempre muito bem delimitadas, longe de um ideal de liberdade.

    No caso dos hindus,já ouvi falar que os hermafroditas tinham um importante papel religioso que com o tempo passou a incluir os transexuais, mas que hoje em dia não representa a maioria dos casos, sendo que a maior parte acaba fazendo parte da rede de prostituição, mas não lembro onde li isso.

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  7. Quando leio esses textos,lembro aquela frase: Só sei que nada sei.

    Adoro essa coluna.
    Abraços,menino.

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  8. oi, meu caro anônimo,

    não vamos colocar os carros na frente dos bois ok?, vou chegar na Grécia antiga, mas vc está certo, o comentário dele sobre o efeminado revelou o preconceito dele...

    o Daniel falou uma coisa certa: o registro das populações que não pertenciam a elite raramente chegam até nós, porém, em casos como as relações de leis que elas alcançam toda a população.

    agora sobre a liberdade, tanto homossexuais como liberdade são conceitos que não existem para o mundo antigo. liberdade é um conceito oriundo do século XVIII, então esperar que homens do século V a.C. pensem e exijam liberdade é impor a eles um conceito que pertence a nós. um exemplo: um homem medieval que não tinha nem o direito de ir e vir, pq ele estava ligado a terra em que nascera e não podia se ausentar dela, não se considerava preso, nós hoje nos consideraríamos. outro exemplo, pq nas leis antigas nenhum castigo inclui a prisão, a privação de liberdade, porque somente quando se cria a ideia de liberdade no século XVIII é que juntamente se cria as prisões porque como todos querem ser livres, o maior castigo não seria a morte (como na antiguidade e na idade média), e sim ser privados do que se havia inventado que era o maior dom de um ser humano, a liberdade. então, nosso conceito de liberdade não se aplica ao mundo antigo e medieval, por ex, e, sendo assim, apesar de todas as restrições que as leis impõem aos homens, eles não iriam se considerar tolhidos, por ex.

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  9. Muito bom Foxx... Não sabia que esses conceitos estavam tão presentes na religião hindu (ou pelo menos acredita-se que estejam). Eu já sabia que de fato os transsexuais possuem uma colocação dentro da sociedade Indiana, e não são totalmente ignorados. Mas não sabia mesmo que isso estava na religião deles! Gostei muito!

    Abraço, Foxx...

    Até o próximo

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  10. mais uma aula super interessante ... como sempre ...

    bjão

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  11. Meu Foxx, não resisti ao ler o seu comentário/réplica (no bom sentido, heim)...sinceramente, nunca vi alguem sumarizar tão bem o complexo "Vigiar e Punir"! Que coisa mais linda!

    Parabens!

    Beijos

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  12. Ao ler isso, eu fico cada vez com mais certeza de que estamos andando como caranguejo. =/

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  13. Não amore, to falando é do povão mesmo, aqueles que são maioria, que vive pra fazer bebê e ganhar bolsa família. E não aqueles pouquissímos seres, like you, que estudaram história.

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  14. Detalhe: existe mais gente fazendo "Administração", ou buscando loucamente pela "Medicina" ou então, a profissão mais consagrada da história (e menos interessante nos dias de hoje) o "Direito". As pessoas torcem o nariz quando você diz que fez ou estuda história, não? Isso não dá dinheiro, neh.

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  15. É o primeiro "grande post" que leio em 2012. Adorei!

    Feliz 2012 FOXX, sorry pela demora.

    Abraços.

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  16. Bom, dessa vez eu não tenho muito o que comentar. Primeiro porque o texto é magnífico e fala por si. Segundo que com certeza eu falaria bobagem, por puro desconhecimento de causa. E terceiro porque todo mundo já acrescentou tanto nos comentários que só me resta parabenizar!

    Beijos, querido!

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" Gosto de ouvir. Aprendi muita coisa por ouvir cuidadosamente."

Ernest Hemmingway