Falamos sempre de "cultura gay" por aqui e algumas pessoas insistem em negar sua existência, seja para negar sua participação nela, seja por considerá-la segregacional. Bem, se falarmos de história, ela existe e tem data de nascimento. Mas antes, deixa eu explicar o que é essa tão falada "cultura gay".
Homocultura, o termo correto, trata-se de uma cultura criada por um grupo social que tem suas afinidades, aproximações, que frequentam os mesmo ambientes e convivem com os mesmos símbolos, imagens, ideias, padrões, que conversam entre si. Homocultura é um tipo de cultura, no entanto, que se desenvolve a partir da contestação do padrão culturual vigente, isto é, heteronormativo. Em outras palavras, é uma cultura que contesta o modelo heterossexual de vida. Então, basicamente, se você namora, sendo homem, outro homem; se sendo mulher casa-se e constitui família com outra mulher, contestando assim o modelo heterossexual, você está, necessariamente, aceitando a homocultura e a corroborando. Mesmo que não aceite ou participe de todos os elementos, você faz parte deste universo de contestação.
Voltando a história, apesar das relações homoeróticas (entre o mesmo sexo) existirem "desde que o mundo é mundo" (posso, se alguém desejar, mostrar referências na Antiguidade, por exemplo), a homocultura é uma invenção do Pós-guerra. O que quero dizer é que até a década de 1960 (no Brasil, esta data tem que ser alterada para 1980), ter relações com o mesmo sexo não significava adotar uma cultura distinta da cultura "oficial", as relações homoeróticas se davam num espaço bem demarcado da cultura heterossexual. Usando exemplos brasileiros, as relações homoeróticas podiam se dar dentro de um ambiente "controlado": os meninos que fazem troca-troca, a Geni que dá para qualquer um, o Cintura-Fina que se prostituía entre mulheres, Madame Satã cantando nos cabarés da Lapa, havia um lugar demarcado e socialmente aceito para estes personagens circularem.
Quando a homocultura surge, ela é uma manifestação, uma afirmação, um grito dizendo que ninguém mais vai se contentar com o gueto. Surge dentro dos bares gays e lésbicos americanos. E esse grito se torna tão alto, forte, poderoso, que as autoridades americanas preocupadas com "os bons costumes" iniciam uma onda de confrontos com estes públicos. Voltemos no tempo, imagine-se em um bar gay, em São Francisco, em 1950, a II Guerra acabou, a economia está estagnada, você preocupado em beijar alguém, quando a polícia invade o local e leva todos presos por vadiagem e atentado ao pudor. Demorou para haver reação a esta situação. Somente em 1969, quando a polícia de Nova Iorque invadiu o bar Stonewall Inn, que os homossexuais presentes reagiram, atacaram a polícia e saíram em marcha exigindo que seus direitos fossem respeitados.
Stonewall foi um marco. Ele criou sobretudo a ideia de orgulho gay. A partir daquele momento os gays e lésbicas desistiram de se esconder, de tentar passar desapercebidos, decidiram que mereciam mostrar sua cara e contestar todo o sistema que estavam inseridos.
Não é por acaso que isso acontece somente em 1969. A década de 1960 é marcada pela explosão de movimentos contestadores do status quo. O movimento hippie e seu amor livre, o feminismo e, mais tarde, a contra-cultura do movimento punk são as bases do que hoje chamamos de homocultura. Acham que uma coisa não tem nada a ver com a outra? Pois pense de novo. A promiscuidade associdada aos gays é só uma forma de denegrir o questionamento a monogamia heterossexual combatida pelo movimento hippie; a formação de famílias homoafetivas desestabiliza o conceito de família heterossexual centrado na figura do homem, combate feminista; a participação de transgêneros, travestis e drag queens questiona a imagem do que é homem e o que é mulher, questão base do movimento punk.
A homocultura tem então estes três pilares: o amor livre, a reestruturação da família e redefinição dos papéis de homens e mulheres na sociedade. Agora, você deve estar perguntando: então de onde saíram as divas pop? A obcessão pelo corpo malhado? O papo vazio sobre moda, cabelo, maquiagem e decoração? Como o texto já está muito grande, essa explicação fica para a parte II.
Parabéns pelo artigo. Não sabia nada sobre a história da homocultura, nem sobre a "rebelião" em São Francisco. Ansioso pelo próximo !
ResponderExcluirParabéns Fox ... Uma aula com certeza ... bem contextualizado, bem fundamentado. bem articulado ...
ResponderExcluirEsperando a parte II ...
O mundo gay precisa se informar e se educar mais, tb sob estes aspectos ...
bjux
;-)
ah! esqueci ...
ResponderExcluirsou otimista como a Zélia ... pelo menos espero q um dia a casa caia ...
bjux
;-)
sinceramente, ainda que eu me interesse por moda e divas do pop, acho q isso é só estereótipo.
ResponderExcluirtem muito gay quye não liga pra essas coisas e muito hetero que adora.
muito bom entrar aqui e levar esse banho de história interessante, eles deviam falar sobre isso nas escolas,, devia ser um capítulo do livro. deviam abordar o assunto, instruir e debater.
adoraria ter essa aula.
A cultura gay é produto do gay ou o gay é produto da cultura gay?
ResponderExcluirEntendo o teu ponto de vista, mas acho que a tua visão de mundo marxista acaba transformando em luta "de classes" algo que não necessariamente tem este significado.
Ótimo final de semana pra você!
fantástico!!!
ResponderExcluiraguardando a parte II.
bjs do voy
Os pontos de vista seu e o DPNN sempre geram debates muito interessantes! Aguardando a parte II. E sim, eu "torço" mais pelo seu lado, rsrs.
ResponderExcluirCom relação ao seu comentário no meu blog: Você também as vezes é muito blasé e isso me irrita. É como se tivesse esquecido como é ter minha idade e só critica. Contudo, seus comentários são os que eu levo mais em conta, justamente por você já ter passado por isso. Obrigado pelos toques. XD
ResponderExcluirCom relação a esse texto: Achei super informativo e quero ler mais sobre na parte dois. Por favor, não demore a postar. ;)
Bjs
Maravilhoso post. Conheci seu blog recentemente, mas já estou apaixonado pela sua graciosa e auspiciosa forma de escrever. Meus parabéns ! Aguardando a parte2.
ResponderExcluirÓtimo texto Foxx!!! Muito bom saber da nossa cultura, está sendo uma aula para todos nós.
ResponderExcluirOu estão pensando que somo apenas um rostinho bonito?
rsrsrs
Beijo!
No aguardo da parte 2. Preciso ler tudo pra organizar minhas ideias XD
ResponderExcluirBeijo Primo!
Is it possible to contact administration?
ResponderExcluirHope for answer
Bem, embora o texto esteja bem escrito e coerente, acho que o DPNN tem um ponto.
ResponderExcluirAcho complicado resumir tudo a gays x sociedade heternormativa.
Na parte II, faço um comentário mais elaborado.
Beijos
Concordo com o Gui. Nem tudo pode ser resumido nessa divisão entre o modo de vida gay x hetero...
ResponderExcluirMas longe de desprezar as potencialidades da homocultura tem em libertar nossas mentes do perigo de se ter apenas uma forma de viver...
Abração!
Amei a aula de história! Engraçado como vc colocou os fatos históricos, e alguns comentários parecem dizer que você colocou tudo (ou quase) com "suas palavras". Cultura gay ou homocultura nada mais é do que uma segmentação (subcultura) da cultura geral. É tão básico e simples, como: negros, latinos, judeus, japoneses, italianos, russos... no mundo inteiro a gente convive com várias diferentes culturas. Não há como negar uma subcultura, porque ela surge naturalmente, exatamente pelo que tu disse: um grupo semelhante, com interesses iguais (ou parecidos) se reuniem pra simplesmente viver suas vidas.
ResponderExcluirCarak Foxx... O que eu posso dizer?? Simplesmente fantástico... No decorrer do texto, eu lembrei de vários artistas de épocas próximas, como o Freddie Mercury, cujas canções foram rejeitadas nos EUA devido ao fato de ele usar uma imagem associada a um grupo específico de homossexuais americanos. Sem contar no David Bowie, que adotou uma imagem totalmente andrógena, e chocou muita gente...
ResponderExcluirDemais cara... Gostei muito, esperando pelo II
Um grabde abraço, até o próximo
Sucinto, claro bem informativo: ótimo!
ResponderExcluirBj
Muito bom e bem escrito. Fox, que idéia maravilhosa esse post. Aguardo a 2ª parte.
ResponderExcluirBeijokas e uma semana linda pra vc.
Caracolis! o Fox tb ri? kkkkkkkkkkk
ResponderExcluirbjão querido
;-)
vida inteligente na internet. Dá-lhe Foxx!
ResponderExcluirÉ interessante saber dessa história. Não sabia de quase nada disso.
Vou esperar a parte II pra dar minha opinião mais "crítica".
Bjo^^
do cacete isso! fico aguardando a segunda parte, ia escrever mais mas viraria um sub-post aqui dentro...
ResponderExcluirNa faculdade pensei em fazer um artigo sobre a Homotextualidade, mas ao procurar questionamentos cai na questão se existe uma heterotextualidade, da mesma forma me pergunto se existe uma heterocultura, pq na questão do literatura, quando um gay escreve um texto isso não é um homotexto, o suposto homotexto teria que ter características distintas e por ae seguiam os questionamentos, mas muito bom o post enquanto reflexão, acredito que pra ficar mais claro para todos no início seria interessante definir o que é cultura e subcultura. Bjs qrdo!
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