Google+ Estórias Do Mundo: PRESENTE: Maria Gadú e a Heterossexualidade

terça-feira, 15 de junho de 2010

PRESENTE: Maria Gadú e a Heterossexualidade

Tem uma ensaísta e poeta feminista americana, nascida em Baltimore, Adrienne Rich que tem um conceito muito interessante: a heterossexualidade compulsória. E tem a nova queridinha da MPB, a Maria Gadú que disse essa pérola a revista Rolling Stone recentemente: "Ninguém chega em casa falando 'mãe, sou hétero'. Então, porque tem que chegar e dizer 'mãe, sou gay'?". Elas duas se chocaram na minha cabeça. Maria Gadú repete o texto que eu escuto entre muitos gays por aí, e que, de fato, não posso discordar, porém é um discurso vazio se não há uma explicação que somente Adrienne Rich conseguiu me dar. Por que os héteros não precisam assumir-se?
Adrienne Rich explica que a heterossexualidade é uma obrigação social, isto é, que ao nascer nenhum menino ou menina é heterossexual, mas ele é obrigado a se tornar, pois desde pequeno ele é envolto em símbolos e a uma cultura que o tendem a moldar de determinada forma. Ao menino são dados certos brinquedos (bolas e carrinhos), são cobrados certos comportamentos (menino não chora, menino é agressivo, menino é agitado), são reforçados outros tantos (menino tem que ser safado, tem que mostrar coragem, tem que ser extrovertido); a menina outros brinquedos são dados (bonecas e panelas), são cobrados outros comportamentos (emotividade, calma e silêncio) e reforçados outros (castidade, discrição, comunicação). Adrienne Rich diz que então o indivíduo não tem outra possibilidade e simplesmente repete os modelos ao qual foi acostumado, os homens são empurrados às mulheres, as mulheres devem fugir dos homens e a adolescência está configurada.
Contudo, algumas pessoas, por motivos que Adrienne não sabe explicar, não conseguem ser modeladas a seguir a este impulso não-racional, e precisam juntar forças para virar-se na direção contrária. Num processo doloroso que é como ela caracteriza o outing. Segundo ela, a necessidade de assumir-se gay vem daí. Da necessidade do indivíduo de dizer que não faz parte e nem compactua com este mundo ao qual é obrigado a fazer parte. A grande diferença é que a negação desta (hetero)normatividade compulsória, a negação deste normal ao qual os indivíduos são obrigados a aceitar/ser, antes te colocaria a margem da sociedade, em um gueto, e hoje não, graças a direitos conquistados sobre o sangue de militantes.
O heterossexual, então, na explicação de Rich é aquele que não pensou sobre sua identidade. Nunca passou pela cabeça dele: "Porra, sou hétero!". Nunca houve o questionamento, a dúvida, a provação. É uma "decisão" sem "pensamento" (por isso mesmo a idéia de opção sexual não funciona). Já o gay, é exatamente o oposto. Aquele que precisa sair de sua heteronormatividade, porque todos são criados para serem héteros, e decidir qual identidade ele deve assumir, porque ele não consegue e nunca vai conseguir simplesmente aceitar aquilo que todos os outros conseguem ser simplesmente sem pensar, automaticamente, compulsoriamente. Ser gay é assumir uma identidade gay, uma vida distinta daquela que ser heterossexual deveria ser. Ser gay é sair do armário.
Então, respondendo Maria Gadu, "Ninguém chega em casa falando 'mãe, sou hétero'. Então, porque tem que chegar e dizer 'mãe, sou gay'?". Um hétero não precisa contar a ninguém o que todos esperam dele. Um cantor cantando não precisa dizer que é um cantor. Um ator atuando, em um palco, não precisa avisar-lhes que é um ator. Mas quando cantor resolver atuar ele precisa dizer: "Ei, eu sou cantor, mas hoje, deem-me licença porque vou atuar". Essa é bem a diferença. Um gay pode e deve dizer (a quem interessar, possa): "eu sou gay" porque ele não aceitou a regra e abraçou a diferença. E, definitivamente, ser diferente é tão bom. Deixem os normais para lá, porque é bem mais interessante ser diferente.

22 comentários:

  1. Arrasando.
    E sim, aquilo existe mesmo!
    Acredite! Hehehe!
    Hugz!

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  2. Naõ concordo com a Rich no ponto "O heterossexual, então, é aquele que não pensou sobre sua identidade". O heterossexual é heterossexual independente de ter pensado em ser ou não,assim do mesmo modo os gays. Ela disse que os héteros são "burros" então?!
    Indo no raciocínio dela se eu não tivesse "pensado" então hj eu seria hétero?!!?
    abraçooo!

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  3. a sociedade impõe muitas regras sem questionar a opinião ou o desejo da pessoa...apenas somos obrigados a seguir as regras para ter um bom convívio... se sairmos delas...seremos rebeldes....

    bjs :-)

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  4. Eu concordo com La Gadú. Na verdade, se não é esperado que o moço seja gay, não é problema dele. A "obrigação social" só existe porque a aceitam. E chegar em casa e falar "mãe, sou gay" é assumir e aceitar essa obrigação social.

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  5. Tbm concordo com a Gadu, justamente por achar q não é necessário dizer nada. Não acho que seja "aceitar" as imposições da sociedade... talvez seja só não achar necessário se encaixar numa prateleira, ou assumir (mais) um rótulo.

    Pra mim, isso vai além de ser hétero ou homossexual. É uma questão pessoal, por não querer se expôr ou, talvez, covardia mesmo.
    Sempre acho complicado falar sobre isso... mas, gostei do texto!

    Ah... respondendo à sua pergunta no post, Rafa disse q tinha "nda a ver" o papo d ele dar em cima de vcs! hehe

    Bjo

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  6. no fim, se assumir é necessário.

    se assumir é até bonito.

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  7. Muito interessante o texto... mas não concordo. O gay, é uma pessoa que sente atração por outra do mesmo sexo. Na minha concepção, não é uma questão de criação nem de educação familiar. Ser gay não é um estilo de vida. Ser gay não é uma opção.

    Assim como tem gays que se sentem na obrigação de se afirmar para a sociedade, há héteros que fazem o mesmo.

    É algo absolutamente individual.

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  8. ai, sei la...
    Acho se assumir (dependendo pra quem) desnecessário... Não vou conversar com meu chefe e dizer: "Querido, sou gay" para que ele me demita visto que ele foi padre e pensa que gays são tão confiáveis quanto bruxas de Salém.

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  9. Um grande post esse que vc escreveu aí. E concordo em tudo!

    Parabéns!

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  10. Adorei os pontos de vista colocados aqui.E,sim,até vou ler o texto novamente porque ele faz você relamente tirar conclusões.Amei!Boa noite!

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  11. Esta foi minha primeira visita ao blog e já adorei, tanto que vou add ele aos favoritos do meu.

    A 'coisa' da homossexualidade é realmente um tabu e acho que nunca se vai chegar a um concenso, como muitas outras coisas na vida.
    No geral acho que vale a coisa de fazer o que te faz feliz, seja assumir isso ou não.

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  12. Concordo com quem disse que é pertinente de cada individuo, até porque cada um sabe (OU NÃO) de si, e quem diz abertamente e sem problemas que é gay, é uma pessoa que se encontrou e sabe muito bem o que quer. E como nem todo mundo é igual, uns demoram mais pra abraçar a própria vida, outros morrem sem tentar... Enfim, cada-um-cada-um...

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    PS> pois é, deixei o drama pra trás (voltei). Paquitos? Dominó? ...?

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  13. PS2> sobre a Maria (botão) Gadú, fale sério! Seria muito bom se as pessoas percebecem e começassem a tratar gays de forma natural, mas se há mais de "sei lá quantos anos" (vc é melhor em história, quantos? rs) que homossexualidade é tratada com nojo, o que fazer? É aceitar quem você é, porque tudo depende de aceitação. Até parece que a Gadú é enrustida.

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  14. Falou e disse. Na verdade, comentários como este de La gadú pressupoõem que não há nenhuma pressão social sobre os desviantes da "norma" e de que ser "gay" ou "hétero" ou whatever coresponde a uma mesma gama de possibilidades e aceitação social, o que é uma tolice, ainda que estejamos avançnado.
    Ah.. eu não sabia que "Alejandro" era explicitamente uma homenagem à Madge... Bj

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  15. excelente, nao conhecia este conceito de heterossexualidade compulsoria! legal

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  16. Minha primeira vez aqui... voltarei.


    Bom final de semana!
    =D

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  17. posso mostrar esse texto a algumas pessoas?

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  18. Creio que o "pensar" a sexualidade é um conceito muito amplo... e sempre muito bem vindo!
    Mas não penso que ninguém "escolhe" a própria orientação sexual, não é refletindo que chegamos à conclusão de que "preferimos" ser gays, héteros bis...
    Para mim, sexualidade e orientação sexual não são reflexo de repressão ou de rebeldia. Comportamento "sexual social" talvez o seja...
    Aceitar que as pessoas são diferentes, sem tentar inventar mais nada é tão fácil... mas quase ninguém faz!
    Não sou hétero porque sou burra ou submissa ao sistema, ninguém é gay porque "quer" romper paradigmas: somos humanos e deveríamos nos aceitar mais e sermos mais felizes!
    Para mim é simples assim.

    Bjs

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  19. A definição de heterossexualidade compulsória é muito interessante. Eu não conhecia, assim como não conhecia essa explicação - mais uma pra lista de leituras que ficam com status pendentes. Não sei se já havia deixado comentário alguma vez por aqui, senão havia, falta minha, pois vez ou outra, passo por aqui. No que diz respeito à declaração da Gadú vamos lá.... vc viu a minha opinião e especiicamente sobre essas entrevistas. O que me causa certa repulsa no movimento é esse autoritarismo com que se trata o assunto.... Lá no facebook, li "militante" falando que era preciso que a Gadú fosse "Repreendida"... Isso pra mim é bem Cleycianne! Acontece que eu nao senti que ela tenha enveredando pelo "não tenho rótulo", não. Ela sabe que é gay, ela só não acha que ser gay seja algo especial. "Viado é do caralho, mas hétero também é" - ou seja, e daí? E, nesse sentido, ela tem o direito de ter sua própria opinião, ora. Não acho que fizesse parte da nossa conduta chegar e autoritariamente e forçá-la a abraçar a nossa causa. É basicamente isso.... Obrigado por ter comentado lá no blog!

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  20. RICARDO AGUIEIRAS26 fevereiro, 2011 13:28

    Bom , acredito que uma coisa é estudar academicamente e questionar definições, como faz Rich. Outra, bem diferente, é o Movimento LGBT atual achar que pode cobrar, impor, exigir algo de alguém, famos@ ou não, por que aí é puro e descarado autoritarismo. Militância de minorias ou LGBT não deveria, nunca, ser um jogo de poder ou prova de quem está com a razão. A luta é por Direitos Iguais, não por direito de imposições.
    Estamos em um mundo onde as sexualidades se revelam a cada dia mais e mais amplas, mulher que opera - ou não - para virar homem; homem que opera - ou não - para virar mulher; travesti que se apaixona por uma lésbica, cross dressers que também não se colocam como homossexuais. Como dizia - já há tanto tempo! - Foucault, precisamos nos reiventar, há um gay novo a cada dia. Portanto, não cabe mais determinadas cobranças, já que, se hoje eu sou estrela amanhã já se apagou, inclusive as denominações e a linguagem muda. A militância seria bem mais eficiente se oferecesse acolhimento, ao invés de criticas pesadas e de condenações. Dentro do acolhimento, é possível, sim, todo o tipo de questionamento. Depois que se acusa e se condena, não há mais possibilidades de mudanças, questionamentos. POR UMA MILITÂNCIA MAIS AMOROSA E NÃO PREOCUPADA COM O PODER.

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" Gosto de ouvir. Aprendi muita coisa por ouvir cuidadosamente."

Ernest Hemmingway