Google+ Estórias Do Mundo: PRESENTE: O que se faz com 60 reais em Natal

domingo, 15 de julho de 2007

PRESENTE: O que se faz com 60 reais em Natal

Tarde de sábado. Os raios dourados do por do sol tingem de laranja, púrpura e rosa o céu plúmbeo do inverno natalense. Eu saio de casa atrasado, ainda tenho que passar no caixa eletrônico para tirar dinheiro. Vejo minha carteira. 2 reais. Papeis. Comprovantes de pagamento. Algumas moedas. Meu crucifixo. Caneta. Cartão do banco. Carteira de estudante. Saco o celular e procuro o número de Mané no celular. Ligo. Só chama. "O número chamado não atende no momento". Desligo antes de ouvir toda gravação. No caminho, calculo quanto vou precisar para a noite. 10 reais a entrada. 20 reais para consumir. Não quero beber muito, mas também não quero que falte dinheiro no meio da balada. Já deu 30. Droga. Com a passagem de ônibus e mais uma carteira de cigarro. Só tem 6 aqui comigo. Vou ter que tirar 40 reais. Droga! Dinheiro demais... ah, mas foi feito para isso mesmo. Gastar!! Chego na rodoviária, corro até o caixa. Fila. Fico olhando para as pernas do menino no caixa. Roupa justa. Colada. Ciclista. Deve ser. E o rosto? Vira. Vai Vira! Cadê? Meu deus! Belas pernas! Belo rosto! Uau! Agora levanta a camisa! Quero ver a bunda! Vai! Vai!? Não foi! Se foi! Chega minha vez. Tiro o dinheiro planejado. Vou a banca e peço um Carlton Blue. "O que?". Um Carlton Azul. Puxo o isqueiro, também azul. Coincidência. Guardo e saio. Compro duas passagens? Melhor 3, para garantir. 4, 50. 3 vales, por favor. Paro na parada, puxo um dos 6 cigarros que eu trazia comigo e acendo. Suavemente aqueles rolos de fumaça dançam entre meus dentes e saem. Espero o ônibus e vejo um menino com os olhos de Athena olhando para mim. Ele me fitava timidamente, quase não querendo fazer isso. Turista, as malas denunciavam, os cabelos loiros e a pele alva também. Ele cruzara comigo enquanto eu tirava dinheiro, mas não me vira. Agora olhava. Olhava. E o 34 chega.
Pego o ônibus e desço por detrás do teatro. Paredes negras de mofo e ruas molhadas de lama e chuva. A noite já caiu sobre a Ribeira. Dois caminhos. Qual tomar? Vou pelo mais movimentado, afinal tem show hoje também na Estação Ribeira. Rockers. Muito preto. Spikes. Camisas de bandas. All Star. Baforadas de cigarros. Cacos de cerveja na calçada. Meninos a pular. Continuo meu caminho acompanhando o porto. Ruas esvaziam. Becos estreitam. Continuo reto. Formas sombrias distantes. Cruzo com um homem que me lança um sorriso sinistro e murmura algo ininteligível. O porto. Felipe. Lembro de como aquela parte de Natal lembra o Recife. Prédios antigos. Altos. Ruas largas e espaçosas brigando com becos quase coloniais. Casas históricas mal conservadas. Portas fechadas com tijolos. Mofo. Foligem. Esgosto. Queria ter dinheiro para comprar todas elas. Fazê-las minhas. Protegê-las. Salva-las daquele triste destino. E morar nelas, porque não? Quero uma casa antiga. Histórica. Eu.
Chego no DoSol Rock Bar. Um casarão reformado com paredes amarelas e marrons numa rua estreita, a Rua Chile. Pouca gente do lado de fora. Um som tímido lá dentro. Vou até pouco depois de todos. Procuro Mané, ele me ligou enquanto eu estava no ônibus, disse que iria, disse que já estava tomando banho, mas ele não está lá. Volto, paro num carrinho de cachorro quente em frente ao bar, peço uma cerveja e encontro Vander. Cercado de meninas, eu me aproximo e toco-lhe o ombro. Ele abre um sorriso. Ordena que eu o acompanhe. Comento que Mané está chegando. Ele sorri novamente e diz as meninas comemorando, ao mesmo tempo que pede que eu sente nas mesinhas plásticas que eles dividiam. Eles bebem Colonial com Coca, apenas uma das meninas beberica uma cerveja. Sento e elas se apresentam. Tê, Diana, Lí. Bebemos, brindamos, contamos histórias. Dali a pouco entramos. Uma banda cujas meninas parecem meninos ou drag queens tocava. "There’s only so much you can learn in one place, the more that I wait, then more time that I waste". Madonna, Jump, versão core. Vamos ao banheiro. Meninas de um lado. Meninos de outro. Mas alguns meninos também vão ao banheiro das meninas. Entram junto. Se olham no espelho e conversam enquanto elas usam os reservados. Alguns glam demais para o meu gosto. Outros emo demais para todos os gostos. "Are you ready to jump? Get ready to jump" toca baixinho. Voltamos para a frente do palco. Dançando, exalando fumaça, gritamos que as "drags" eram gostosas. Rimos de nossas caras e a de alguns meninos chocados que nos olhavam de lado. Fumaças. Eles tem cara de fumaça. Dançando um menino, que vi dentro do banheiro das meninas se aproxima. Vira e sem cerimônia, no meio de todos, me beija. "You're toxic, I'm slipping under, oh, the taste of a poison, I'm in paradise
I'm addicted to you". Assusto-me, mas correspondo. "Se gostou, me liga". Ligar?! Eu nem te conheço! Então Diana se aproxima: "Gostou de Vinho?". Pode melhorar no chaveco. E saímos, rindo, em direção ao bar. Duas cervejas. 4 reais. Tê se aproxima, eu sorrio, e ela me puxa e me beija. Um beijo cheio de dentes, línguas e puxões.
A noite continua e Ludov começa. "Se eu disser que longe é um lugar que não existe". O Vinho se aproxima de novo, meu puxa e eu escapo. Tê se aproxima de novo, me puxa e me beija, aí Vinho se aproveita e se mete no beijo, a três, no meio daquele casarão antigo, onde provavelmente abastadas famílias do passado natalense viveram, em que agora um clima úmido mantém um certo ar de decadência retrô. "Mantenha as aparências em evidência, vá, resolva seus problemas sem discordância, dance a música que for". Dançamos mais. Gritamos que o guitarrista da banda é gostoso (mesmo sem ele ser). Rimos dele se achando. Rimos das pessoas achando que nós achamos ele gostoso. Rimos. Até que a noite termina, pelo menos no DoSol, com fotos com a banda e muita tietagem. E olho no meu relógio e ainda são 22:14. Ir para casa está fora de cogitação. Duas opções: pagar mais de 20 reais para ir ao show de Capim Cubano e me esguelar por Yego Gonzalez, se conseguirmos chegar na Via Costeira (é, no plural mesmo porque Vander também não quer ir para casa); ou ir para uma boate GLS, a Vogue, que fica a 5 minutos dali, pegando qualquer ônibus. Meio alto, decido: Vogue!
Contamos nossos trocados. Sobrou-me 4 reais e Vander tem mais 4. Vamos. Lanchamos antes de entrar por conta de Vander e ao subir os 300 lances de escada antes de chegar aquela boate e passo as entradas e mais 10 reais de consumação no meu cartão de débito. 18 reais. Compramos cerveja, Vander quer cigarro. Bebo devagar. Estou mole. Desatento. A cerveja me enche, acho que vou vomitar a qualquer momento, então começo a dançar. Giro. Pulo. Traspiro. "Everybody line up, the show is about to start". Uma amiga minha então me encontra no meio da pista, me agarra e me dá um selinho e quando me afasto, o namorado dela está logo atrás. Recrimino-a, por me beijar na frente dele, ele ri e fala que para que eu possa beijá-la, eu tenho que beijar ele antes e me puxa. Mole, caio sobre o peito forte e largo dele, os braços dele me seguram pela cintura, com força, junto, em qualquer outra situação eu estaria derretido, mas ela estava ali e não sou deste tipo. Em segundos virei meu rosto, e ele beijou o canto da minha boca, eu sorri desconcertado, ela riu como se fosse a coisa mais normal do mundo e eu me arrependi piamente de não ter aproveitado.
Vander estava sentado no palco, me aproximei então e sentei entre as pernas dele. Ele enrolou os braços dele em volta do meu corpo e me abraçou. Em segundos lembrei que ele era ex de um amigo meu. O Peter. O sinal vermelho ligou. Em mais dois segundos, eu lembrei que ele era ex. E o sinal verde ligou. Ele então lentamente puxou minha cabeça para trás e me deu um beijo lento e carinhoso. Macio. Suave. E sedoso. Como poucos homens sabem dar. "We ain't here to hurt nobody, so give it to me, give it to me, give it to me". Fomos, depois, juntos comprar mais uma cerveja e perto do bar, onde é a parte ao vivo da boate, encontramos o Peter, a Tia e a Mãe de Hudson. Conversamos um pouco com eles, e vi de longe um ex-namorado, o Francisco, com o atual dele e fiquei perturbando-o. Olhava, encarava, fingia estar interessado. Admito, apenas para ver o mal. Não me interessava nem um pouco, mas eu gosto de fazer o Francisco achar que eu ainda gosto dele. Não sei porquê, tenho esse prazer sádico de fingir para ele. É engraçado. Ele ri tão satisfeito e faz questão de não me dar bola. Faz-me bem fazê-lo se sentir bem. De uma forma torta, eu sei, mas faz. "I'm leaving you now, I want you to know, I know what I want and I knew all along". Vander voltou e eu fiquei um pouco mais. Conversei com uns amigos, causei uma briga entre namorados, e depois voltei ao Dance, e encontrei Vander já beijando outro. Ri e beijei minha cerveja, continuei a dançar, alguns cigarros para adocicar, e continuei a noite.
Vander então me chama e pede meu isqueiro, acendo o cigarro dele, e ele me puxa e me beija, a mim e ao menino que ele estava beijando, o segundo beijo a três da noite. Ri e saí dali, resolvendo ir procurar Peter. Procuro no lounge e nada, quando estou voltando uma amiga minha me puxa e começamos a dançar forró, enquanto eu danço com ela, observo um menino com um corpo perfeito dançando sozinho mais adiante e coberto pela coragem que só a bebida pode dar puxo-o para dançar. Dançamos, eu arrisco um beijo, e ele me beija. Jeff, esse era o nome dele. O mesmo beijo de Vander. Lento. Suave. Macio. Sedoso. Minhas mão passeiam pelo corpo dele e ele está com a camiseta toda suada, ele tira, e exibe um peito bonito, forte, másculo e uma barriga magrinha e definida, uma bunda durinha e uma belas coxas, além de um sorriso super branco completam o pacote. Eu o beijo e o puxo para a parede. Ele ri, dizendo não acreditar que alguém tão bonito como eu queria ficar com ele. E eu começo a rir.
Ficamos juntos o resto da noite, mas a maior parte sozinhos. Apenas quando quase amanhecia, que me juntei a Vander e aos nossos amigos. Eu sentei no palco, e Jeff continuava dançando. "Ay, let’s not kill the karma, ay, let’s not start a fight, ay, it’s not worth the drama for a beautiful liar". E Vander comentava no meu ouvido: "Imagina esse monte de musculos rebolando em cima de um pau" e eu dava uma cotovelada nele, pedia que ele parasse, mas ele repetia. "Imagina". E eu ria. "Eu não pego um desses pra mim". Jeff então me puxa, dançamos um pouco, ele me beija e pergunta: "O que seu amigo tava falando de mim?". Eu rindo conto-lhe que ele estava elogiando o meu gosto. Ele agradece. E o sol amanhece em Natal.

17 comentários:

  1. curitiba não é assim legal ;/

    ResponderExcluir
  2. Jesuuuuuuuis menino! HAHAHAH!
    Como o negócio foi animado aí no final de semana hein! Queria que tivesse sido assim "animado" em Sampa também! Mas acho que cada um se divertiu à sua maneira, né? :P

    Beijos querido!

    ResponderExcluir
  3. Qdo abriu, achei que não fosse ler este texto deste tamanho.
    Mas li e vi o quanto foi quente este fds.
    Que bom, parabéns pra vc. Tirou aqueles fantasmas antigos?
    Que venham outros fds assim.

    Abraço!

    ResponderExcluir
  4. Uhhhh, que final de semana!
    E que venham outros como esse, não?
    Sair assim com os amigos é sempre bom! =)

    Beijos, querido!

    ResponderExcluir
  5. Foxx, amo ler os seus posts (apesar de não comentá-los sempre por falta de tempo) porque são vivos. Não há um post seu que não tenha me feito sentir o cheiro, o gosto, o toque do lugar e da situação e isso é o que me torna sua fã. Principalmente porque teus posts trazem uma parte de mim que eu amo e odeio, o sabor do idílico profundamente sujo, deturpadamente romântico e patético que nos faz pensar porque são assim e são tão gostosas?????Sua liberdade é um pouco da minha prisão e me traz uma paz que... putz... se você soubesse... sabe no que você mais me torturou neste post. As músicas... você me fez vivenciar isso tudo e mais um pouco. Muito obrigada por nutrir um pouco das minhas fantasias. Bjs.

    ResponderExcluir
  6. caralho foxxx!!!
    (me fez ate falar palavrão)
    é meu amigo(do qual eu sinto MUITA FALTA DE LER E "OUVIR"), vc é mais do que pensa ser e causa muito mais do que imagina causar nas pessoas... acho q ja te disse isso uma vez... enfim.

    arrasou no "idilico profundamente sujo".


    beijo grande e forte abraço

    ResponderExcluir
  7. hehehehe, gostei do post.




    HOTSPOT FORTALEZA
    http://hotspotfortaleza.blogspot.com/

    ResponderExcluir
  8. Quem pode, pode! ;-)
    Adorei passear com você!

    Abraços

    ResponderExcluir
  9. Que narração perfeita!!! clap clap clap (palmas). Que tenha "to be continued".

    ResponderExcluir
  10. Gente, mas qeu epopéia, hein, cherry? A noite de Natal ferveu! Rssss... Beijos!

    ResponderExcluir
  11. PUTZ 10 PAU PRA ENTRAR NA BALADA!!
    AFF.. VOU NAS BALADA DAÍ ENTAUM.. AQUI SERIA O SEU DINHEIRO TODO, PRA UMA NOITE SÓ E POUCAS BEBIDAS!!
    PRECISO FICAR RICO, URGENTEMENTE!!¬¬

    TEMPOS QUE NÃO VENHO AQUI!
    ABÇS AMIGO

    ResponderExcluir
  12. eba! depois fica falando isso e aquilo, ne? se garantindo ne muleke? bjão. ;)

    ResponderExcluir
  13. Sorrisos...

    MAIS Sorrisos...

    E depois Eu Que sei me Divertir...

    Gargalhadas...

    te gosto Assim.. Soltinho Soltinho...

    "Puxo o isqueiro, também azul. Coincidência." Coicid~encia é o caralho, é o modo gay De ser.. Tudo no Automatico.. Sorrisos..

    beijo Coisa...

    SunShine

    ResponderExcluir
  14. Pena que o sol amanheceu em Natal!

    Texto delicioso, meu amigo rapozinho. Um pouco longo, mas delicioso. E vívido.

    Boa semana

    Bjs

    ResponderExcluir
  15. Cuidado com o sapinho! Amigo, não sei se vc leu lá no meu blog, mas pode fazer um post naquele tema sim, aguardo, nada de beijos, apenas um abraço, hihihi :)

    ResponderExcluir
  16. Menino...

    Que noite hein!?

    Adorei o post Foxxie!

    Beijus!!!!!

    ResponderExcluir

" Gosto de ouvir. Aprendi muita coisa por ouvir cuidadosamente."

Ernest Hemmingway