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domingo, 19 de outubro de 2014

Creta: O Ombro de Marfim

, em Natal - RN, Brasil



Zeus e Apolo não são os únicos deuses creto-micênicos que tem relacionamentos homoeróticos. Possêidon era um deus cretense, como atesta seu papel no mito do Minotauro, era deus dos mares, dos cavalos, dos terremotos, mas em Creta também era deus das tempestades e dos raios, atributo que mais tarde foram dados a Zeus quando a religião se expandiu por toda a Hélade. Na Ilíada, de Homero, ele é o grande deus dos mares já, mas ele também controla as tempestades marinhas e provoca desmoronamentos com seu tridente construído pelos Ciclopes. Os navegantes oravam a ele por ventos favoráveis e viagens seguras, sacrificavam a ele cavalos, mas seu humor imprevisível tornava a água e os terremotos suas armas para expor sua irritação com os humanos, mas também apoiou os gregos grandemente durante o poema sobre a Guerra de Tróia, porém sua vingança contra Odisseu, porque este não prestou-lhe os devidos agradecimentos ao fim dos anos de batalha, levou o rei de Ítaca a ficar perdido no mar por vinte anos, tema da Odisseia. 
Segundo seu mito, ele é filho de Cronos, o tempo, e Reia, a vida. E como seus irmãos, fora engolido pelo pai ao nascer, até que Zeus que por causa de um subterfúgio da própria mãe, pode fazê-lo vomitar as crianças. Segundo Pseudo-Apolodoro, a ordem dos filhos é Héstia, o fogo; Deméter, a terra cultivada; Hera, as mulheres e o casamento; Hades, o senhor dos mortos; e, por último, o rei dos mares. Após seu pai tê-lo vomitado e ser deposto pelo irmão mais novo, Possêidon foi criado entre os Telquines, demônios marinhos, com rostos de cachorro, pele negra e nadadeiras nos pés e sua primeira esposa foi uma deles, Hália. Com esta esposa, ele teve inúmeros filhos de temperamento violento e explosivo, de tal forma que teve que enterra-los para proteger o mundo, foi assim que as ilhas gregas nasceram, cada uma delas é um filho do deus do mar que está aprisionado, mas também teve com ela a linda Rodes, que casa-se com o sol, Hélios. Teve também outros filhos monstruosos, o ciclope Polifemo com Teosa que tentou devorar Odisseu; o gigante Crisaor, que é derrotado por Herácles, com a Medusa; os gigantes Oto e Efialtes nascem de seu caso com Ifimedia.
Uma história interessante sobre Possêidon é que ele seduziu a própria irmã, Deméter, quando esta procurava desesperada a filha, Perséfone, que havia sido sequestrada por Hades. A deusa concedeu seus favores ao irmão em nome de informações sobre o paradeiro da filha, porém, após terem tido sexo, o deus marinho não tinha nada para contar-lhe. Fruto desta união, Deméter teve filhos gêmeos, Despina e Árion, que abandonou logo ao nascer porque não estava interessada em crianças pois ainda vasculhava o mundo buscando sua filha querida. Despina cresceu revoltada com o abandono, tanto da mãe como do pai. E adulta, deusa do frio e do inverno, congela as terras que a mãe cultiva e o mar que o pai ama. 
Casou-se, por fim, com Anfitrite, nereida, filha do Oceano e Tétis, com quem teve um filho, Tritão, o deus dos abismos oceânicos e o grande pastor dos animais marinhos. Mas não sem antes conhecer o amor de um homem. Quem nos conta é uma ode de Píndaro, do século V a.C.:

 Ode Olimpíca, 1 40 ff 
"Ele [Poseidon] apoderou-se-lhe [Pelops], o seu coração louco de desejo, e vos trouxe montado em sua gloriosa carruagem ao alto salão de Zeus quem todos os homens honra, onde mais tarde veio Ganimedes, também, por um amor como, para Zeus."

Pélops era filho do rei da Lídia, na Ásia, Tântalo e Dione. O rei, para testar a onisciência dos deuses, das quais ele zombava, ele matou o próprio filho e cortou-lhe em pedaços e ofereceu-os aos olímpicos como um ensopado. Ele queria com isso provar que eles não eram capazes de saber tudo. No entanto, nenhum deus serviu-se do ensopado, somente Deméter, que estava deprimida por causa da rapto da sua filha, que comeu um pedaço do ombro do jovem, mas ao reconhecer o gosto a deusa, irritada, lançou Tântalo ao Tártaro, condenando-o a viver eternamente em um belo jardim no qual toda vez que ele tentasse aplacar sua sede a água fugiria dele, e quando ele tentasse aplacar sua fome, os ramos das árvores fugiriam ao seu alcance. Os deuses então reviveram o príncipe e recolocaram no pedaço mordido por Deméter, um pedaço de marfim. Belíssimo como ele era, Pelops atraiu o amor de Posseidon que o levou para viver consigo, em seu palácio embaixo do mar.
O mito de Pelops, como o de Ganimedes, evocam a mesma tradição creto-micênica: o rapto dos jovens por seus amantes mais velhos. Contudo o mito de Pelops avisa que ele retorna a vida entre os homens e se enamora de Hipodâmia, filha do rei de Olímpia, Enomau, que tinha matado todos os pretendentes anteriores da filha porque um oráculo havia predito que ele seria morto pelo genro. Enomau fazia todos os pretendentes disputarem com ele uma corrida de biga, cujo perdedor era sempre executado. Sabendo que os cavalos de Enomau famosos por sua velocidade, foi ao deus dos cavalos, seu antigo amante, que o príncipe pediu ajuda. O mito diz que em memória dos regalos de Afrodite que vivera com o rapaz, Possêidon concedeu-lhe cavalos alados que permitiram que ele derrotasse o sogro. Casado com Hipodâmia, Pélops tem dois filhos, Atreu e Crisipo, cujos quais participam da fundação das duas principais histórias gregas que nos chegaram hoje: Atreu é pai de Agamêmnom e Menelau, os grandes reis da Ilíada; e Crisipo é sequestrado por Laio, dando início ao ciclo de Édipo.
O interessante deste mito é perceber que os dons concedidos pelo amante divino tornam Pelops mais indicado para tornar-se um marido aceitável para Hipodâmia, cujo nome significa a senhora dos cavalos. Esta era uma regra comum no mundo cretense, as armaduras, armas, cavalos, galos, taças etc, que eram dados aos jovens por seus amantes, tais presentes (que eram obrigatórios) eram responsabilidade daqueles mais velhos e importantes na vida adulta que os jovens teriam após retornarem a casa de sua família. O sentido iniciático da relação homoerótica ainda se torna mais poderosa quando é somente após deitar-se com um homem mais velho que o jovem se torna adulto de fato e pode então contrair núpcias sendo agora, autorizado, a ter relações também com jovens assumindo as mesmas responsabilidades que seu anterior amante teve com ele.







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8 comentários:

  1. É uma suruba eterna. Mas eu gostei dessa parte do ensopado.

    Legal as mudanças no lay.

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    1. Não é suruba, Lucas, pense que a vida dos deuses não acontece em poucos anos, costuma-se entender que como os deuses são imortais, e os/as amantes mortais eles vivem com eles por uma vida até que quando eles envelhece e morrem os deuses encontram novos amores. Não é que todos tenham acontecido ao mesmo tempo, é um de cada vez.

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    2. São Deuses! Tipo a gente, nzé? Hehe!

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    3. os deuses gregos não tem a distancia que o Deus cristão, o Jeová judaico, o Alá islâmico e o Brahma hindu tem da humanidade, mas é bom notar que somente estes quatro deuses são distantes dos homens, sendo exceções no universo religioso, o mais comum são deuses humanos como os gregos, romanos e outros.

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  2. Vem daí a fixação dos mais velhos pelos novinhos, de uma forma em geral??? rsrsrs

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    1. kkkkkkkk
      acho que o Gato concordaria comigo: os novinhos tem um charme só deles, como os maduros também tem um charme só deles, são, com certeza, situações bem diferentes, mas eu, pessoalmente, só me envolvi (basicamente) com novinhos, os maduros foram só os do tipo one night only.

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  3. Tais atos sexuais dos deuses refletem de alguma forma a prática da pederastia no mundo grego, certo? Outra coisa: as relações homoafetivas eram condenadas pela sociedade após o "tempo de aprendizado" do pupilo?

    B.H.

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    1. Sim, BH, as relações entre os deuses e homens demonstram que a prática da pederastia (relação entre homens mais velhos e mais novos) era comum. Eles explicam a relação a partir do modelo mítico, afinal considera-se que esta é função principal do mito, estabelecer explicações para as coisas que existem no mundo social.
      Até onde sabemos, BH, sim, as relações homoafetivas eram repreendidas quando aconteciam fora destas regras, mas falamos de Creta, o mundo grego é muito mais amplo e diverso que somente Creta e outras cidades-estado tinham políticas diferentes. Porém, é importante lembrar que quando o garoto deixava seu período de aprendizado, ele já se tornava um homem adulto e como tal podia agora também ter seus próprios pupilos.

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" Gosto de ouvir. Aprendi muita coisa por ouvir cuidadosamente."

Ernest Hemmingway