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sexta-feira, 7 de março de 2014

A TV Globo e os Gays: Uma Popularização

Mas, nos anos 2000, uma nova leva de personagens gays foram trazidos a televisão. Emanoel Jacobina que assumira em 2000 a eterna série Malhação, deixando a academia que fora transformada em uma escola, e com a proposta (que volta e meia retorna a série) de fazer com que Malhação retratasse problemas reais dos adolescentes e deixe de focar em intrigas amorosas. Em 2001, ele trouxe consigo o personagem Sócrates, interpretado por Erik Marmo, que tornara-se um personagem fixo na série. Ele não foi o único, afinal, sempre que esta proposta retorna buscando salvar a audiência da série, pretendendo renová-la, os produtores trazem meninas grávidas, algum problema com drogas e, agora, também homossexuais. Enquanto em 2002, na Desejos de Mulher, adaptação do livro Fashionable Late de Euclydes Marinho e Dennys Carvalho, os personagens Ariel (José Wilker) e Tadeu (Otávio Muller) faziam o público rir com seu relacionamento efusivo, outros trouxeram um outro problema para a Rede Globo. Rafaela (Paula Picarelli) e Clara (Aline Morais), em 2003, de Mulheres Apaixonadas, de Manoel Carlos e Ricardo Waddington, foram as primeiras a causar suspense se a Globo exibiria um beijo gay em uma de suas novelas. Novamente afirmando que sua audiência era conservadora, a cena foi evitada com um enquadramento que eu só poderia chamar de amador. Elas saíram de frente da câmera que ficou filmando uma parede enquanto elas voltavam. Ridículo!
No entanto, a Globo descobriu que seus espectadores tão conservadores estavam curiosos e também notou que explorar a possibilidade do beijo gay podia trazer audiência para novela. Os espectadores estavam interessados em ver esta cena história. No ano seguinte, então, Jennifer (Bárbara Borges) e Eleonora (Mylla Christie) de Senhora do Destino, de Aguinaldo Silva e Wolf Maia, também sustentaram o suspense. Em América, 2005, de Glória Peres e Jaime Monjardim, o mesmo artifício foi utilizado para o personagem Júnior (Bruno Gagliasso) e Zeca (Erom Godeiro). A possibilidade do beijo em algum momento da trama mantinha as cenas dos personagens sendo os momentos mais esperados pelos telespectadores globais e a emissora soube aproveitar isto. Inclusive divulgando que, por exemplo, a cena entre Júnior e Zeca em América havia sido gravada, porém, no último momento da novela, ela fora cortada pelos diretores.
Páginas da Vida, em 2006, Manoel Carlos e Jaime Monjardim apresentam um outro modelo de relacionamentos gays representados em nossa televisão: Rubinho (Fernando Eiras) e Marcelo (Thiago Pichi) são casados, tem uma vida em comum, todos sabem que eles são um casal, mas, no fundo, parecem dois irmãos que moram juntos. Foi o mesmo modelo adotado por Gilberto Braga, Ricardo Linhares e Dennis Carvalho em sua Paraíso Tropical, os personagens aqui chamavam-se Rodrigo (Carlos Casagrande) e Thiago (Sérgio Abreu) que não acrescentaram nada a trama além de exibir seus corpos talhados em academias em sungas folgadas pelas praias cariocas.
Uma terceira moda foi apresentada por Aguinaldo Silva e Wolf Maia em Duas Caras, de 2007, com o Bernardinho (Thiago Mendonça) que foi envolver personagens gays em triângulos amorosos com um homem e uma mulher no melhor estilo Três Formas de Amar. No caso envolvia Carlão (Lugui Palhares) e Dália (Leona Cavalli). No ano seguinte, o modelo é repetido em A Favorita, de João Emanoel Carneiro e Ricardo Waddington, em que Orlandinho (Iran Malfitano), apesar de sonhar com Halley (Cauã Reymond) se envolve com Maria do Céu (Deborah Secco). Na mesma novela também havia a personagem de Paula Burlamaqui, Stela, que era lésbica, mas isto não é explorado em momento algum da novela; o mesmo que acontece com a Letícia (Paola Oliveira) em Ciranda de Pedra, adaptação do romance de Ligia Fagundes Telles por Alcides Nogueira e Maria de Médicis. Somente quem havia lido o livro podia pescar as insinuações sobre a sexulidade da personagem. Já 2009 foi o ano do Cássio (Marcos Pigossi), na Caras e Bocas de Walcyr Carrasco e Jorge Fernando, lançar o bordão: "Choquei, tô rosa chiclete" e abusar da comédia, mas sem escapar do modelo então em voga. Apesar de gay, Cássio envolve-se com Léa (Maria Zilda) e com Sid (Klébber Toledo).
Em 2010, em Ti-ti-ti, remake da novela de Cassiano Gabus Mendes por Maria Adelaide Amaral e Wolf Maia tentou fugir destes modelos e criou para esta nova versão o casal Julinho (André Arteche) e Osmar (Gustavo Leão) que morre no primeiro capítulo, fazendo Julinho conhecer a protagonista da história, Marcela (Ísis Valverde), e mais tarde o surfista Thales (Armando Babioff) que escondia sua sexualidade, mas apaixona-se por Julinho e abandona a esposa pra ficar com ele. No ano seguinte, após os inúmeros ataques homofóbicos que foram noticiados pelos grandes jornais do país e, inclusive, uma ameaça de bomba na parada gay paulista, Insensato Coração de Gilberto Braga, Ricardo Linhares e Dennis Carvalho, trouxe para TV não apenas dois personagens, mas um núcleo gay, que finalmente tinha história para contar. Personagens se descobriram, outros sofreram ataques homofóbicos, uns não foram aceitos pela família ao se assumirem, outros encontraram amor e aceitação. Do Roni (Leonardo Miggiorin) ao Eduardo (Rodrigo Andrade) foram pelo menos oito personagens. Em 2011, quando Malhação retorna a batuta de Emanuel Jacobina, a série também teve o Cadu (Binho Beltrão), como um personagem gay. Uma distância de 10 anos separava os dois personagens de gays de Malhação no novo milênio, e ele retornava agora na agitação que os ataques, sobretudo na Avenida Paulista, haviam causado. Porém, não andamos para frente. Neste ano a TV Globo comprou o direito de exibir a série americana Glee, da Fox, que passou a ser exibida nas manhãs de sábado, horário consagrado para uma programação infanto-juvenil, porém a pessoa que compra séries americanas para a Globo não costuma assisti-las (é o mesmo com Os Simpsons que somente por serem uma animação para a Globo torna-se infanto-juvenil) e eles não sabiam que a série abordava a homossexualidade do personagem Kurt de forma tão aberta. A série então foi logo mudada de horário, no ano seguinte, tendo sua segunda temporada exibida agora após as 23h e, por fim, cancelada. A Globo não exibiria Kurt sofrendo bullying na escola, nem começando a namorar com Blaine, muito menos se atreveria a mostrar eles fazendo sexo. O discurso de que o público não estava preparado era repetido.
Em 2012, com a Fina Estampa de Aguinaldo Silva e Wolf Maia, e o sucesso do personagem Crô, de Marcelo Serrado, novamente recolocaram os homossexuais em um lugar cômico dentro da teledramaturgia brasileira. Sem sexualidade, sem desejos amorosos, sem passado ou vida própria o Crô seguia Tereza Cristina como um acessório de cena, apenas, um contra-ponto para ver a maldade da vilã bilhar mais. Em 2013, Walcyr Carrasco pensou que inovaria trazendo o vilão Félix, interpretado por Mateus Solano magistralmente, para a TV brasileira com sua Amor à Vida, mas também repetiu o clichê que já tínhamos superado do triângulo amoroso entre Eron (Marcelo Antony), Niko (Thiago Fragoso) e Amarylis (Daniele Winits). Contudo a Globo se viu surpresa com a popularidade de Félix entre seus espectadores. Seus diretores ainda não conseguiam entender como um personagem gay poderia ser tão popular e carismático com o público. Félix já representava novos tempos, a dúvida é se a vanguarda tão repetida no discurso dos produtores da TV Globo desde sua fundação, estaria preparada ou não para manifestar-se finalmente. Para surpresa de muitos (inclusive autores globais, como Aguinaldo Silva que falara anteriormente que isto era impossível), Félix e Niko acabaram por protagonizar o primeiro beijo gay no horário nobre da Globo, após a formação de um casal que o público da novela torcia para que ficassem juntos. A comoção do público gay foi real, pequenos focos de puritanismo heteronormativo também puderam ser vistos, contudo a dúvida maior seria qual o caminho que a Rede Globo tomaria a partir de agora?


11 comentários:

  1. Acompanhando e apreciando esta série sobre a a TV ... definitivamente esta pergunta não vai calar tão cedo ... Qual o caminho q a Globo tomará?

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    1. Que bom que você gosta, pena que poucos também gostem.

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  2. Agora sim lembrei de quase todos os personagens! rsrs

    Beijo!

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  3. Pois é... agora que abriram a caixa... vão fazer o quê?!? #sesentindocurioso!

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  4. Olá Foxx, como disse o bloguer 3 Egos, lembrei de todos, ou seja, eu acompanho rs...tua abordagem é fora de série, sem ser esquerda ou direita, e muito menos centro, trazes um assunto relevante para mim, pelo menos, de uma forma que se pode ler e entender, sem se chocar ou blasfemar, quem não é da área rs. Gostei, vou ler os outros capítulos rs...
    Muito obrigado por tua visita e comentário bem legal no meu bloguinho.
    ps. Carinho respeito e abraço.

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    1. Que ótimo, Jair, fico muito feliz em ver que vc gosta dos meus textos e de minha abordagem. Fico muito feliz mesmo! Obrigado!

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  5. Olá Foxx. Há quanto tempo, não? Tive muitos percalços e ainda não me livrei de todos, mas aos poucos, estou conseguindo voltar ao mundo dos blogs (como um fantasma de histórias japonesas que ainda precisa colecionar todas as chaves de seu quebra-cabeças para voltar a existir). Mas posso frisar que meus problemas atuais são mais técnicos do que pessoais (menos mal). Saudades de muita coisa por aqui. Quanto à polêmica Globo, ainda acho que haverá percalços, pois a sociedade é volúvel e a emissora não é boa, nem ruim. Apenas faz testes para ver o quanto é possível agradar a todos na medida do possível. Mas admiro a tentativa da Platinada de ir testando o público, e tentando encontrar a melhor maneira de exibir os gays. Agradando, na medida do possível, os gays e respeitando os direitos humanos e arranhando gradualmente os conservadores, pero no mucho. A emissora imagina que é possível continuar sendo plena em todas as casas, massificar uma história para todos. Mas também sabe que não dá pra agradar gregos e troianos. Creio que a coragem de Carrasco e o talento do Mateus ajudaram ela a ter essa oportunidade dessa vez. Espero que haja mais chances. Obrigado pela visita ao blog e por ter sido um dos primeiros a se lembrar do meu trabalho mesmo após tantos anos em que andei sumido. Beijos!

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    1. Ah, Vilser, eu que tenho saudades do senhor na minha vida. Muitas saudades. É por isso que fui um dos primeiros a comentar, era saudade.
      Sobre a Globo acho que vc está sendo um tanto ingênuo dizendo que a tv quer agradar na medida do possível. Eu acho que ela se viu numa posição insustentável, e teve que ceder, mas quero ver como as coisas vão se seguir...

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  6. Finalmente dei uma lida na parte final da série! Ótimo texto e gostei de ver as novelas da globo analisadas por esse ângulo, acho que realmente a teledramaturgia evoluiu, sem uma intenção genuína, mas cresceu em alguns aspectos e o beijo foi realmente memorável!

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" Gosto de ouvir. Aprendi muita coisa por ouvir cuidadosamente."

Ernest Hemmingway