Google+ Estórias Do Mundo: janeiro 2013

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

A Virada (capítulo quatro)

, em Natal - RN, Brasil


Chegamos ao apartamento dele conversando sobre escritores franceses e mangás japoneses, ele me ofereceu água gelada e, depois de um copo, me beijou sedento. Beijou-me guiando meu corpo até o quarto onde ele sentou na cama. Eu dei dos passos para trás e coloquei minha bolsa de lado. Ele então me olhou com aqueles olhos verdes cor-de-mar, e me puxou, abraçando minha cintura, sua cabeça alcançou o meu peito, ele podia inclusive ouvir meu coração batendo em dúvida, eu lhe fiz um cafuné. Ele não se mexeu, só parecia um menino que precisava de carinho, e eu não lhe neguei. Continuei os cafunés até minha mão esquerda descer-lhe pela nuca e acariciar suas costas por cima da camisa de algodão branco. Ele gemeu e me apertou entre os braços tatuados. O plástico que protegia a tatuagem recém retocada do seu braço esquerdo chegou a tocar minha pele por baixo da camiseta que se erguera.
Eu então levantei sua cabeça com um leve puxão de cabelo e o beijei. Ele, me puxando pela bunda, me trouxe para cima do corpo dele. Senti-o excitado por baixo de sua calça jeans, de novo, calça jeans folgada demais na minha opinião. Minha camiseta foi a primeira a ser jogada no chão, e as mãos dele se encheram com os pêlos do meu peito. Ele me fez sentar em seu colo, enquanto lambia meus mamilos e sorria. "Lindos seus pêlos!". O elogio me animou e tirei a camiseta dele, revelando o peitoral branco e liso, definido sem exageros. Beijei-lhe o peito, esfreguei minha barba em seu pescoço, mas seus gemidos eram mesmo intensos quando eu explorava seu ponto fraco: as costas. Os carinhos o faziam amolecer. Logo as calças e a cueca dele estavam jogadas no chão, as minhas foram parar do outro lado da cama, e eu estava deitado sobre ele, e meus pêlos escuros contrastavam com os dele, ruivos. E quando nossas bocas se juntaram éramos um só.
Ele afastou-se do meu hálito apenas uma vez, para deitar-se de bruços e oferecer-se como Rimbaud para mim. Mordi sua orelha, neste instante, deitando-me sobre ele, lambi seu pescoço e desci sentindo o gosto de sua pele branca na minha língua por toda coluna vertebral até encontrar-lhe a bunda pequena e redonda, rija e coberta com pêlos ruivos finos e quase invisíveis, praticamente apenas brilhavam contra a luz do sol que se punha do outro lado da janela. Lambi-lhe os pêlos, a bunda, ele gemeu como um francês, e eu respirava embebido na espuma dos seus glúteos brancos que desciam até a auréola . Eu subi ouvindo seus gemidos quase agradecidos, e me deitei sobre o corpo excitante dele, ele sentiu que eu estava excitado e rebolou, eu procurei sua boca e nossos dedos se entrelaçaram enquanto ele forçava o quadril para me ter dentro dele.
Foi quando ele me empurrou e sentou no meu colo. Enroscou seus dedos nos pêlos do meu peito e puxou. Ele me olhava excitado, eu o masturbava. Foi quando, ele rápido, forçou para que eu adentrasse aquele pequeno degrau dourado, "entre os cordões de seda, os cinzentos véus de gaze, os veludos verdes e os discos de cristal que enegrecem como bronze ao sol -, vejo a digital abrir-se sobre um tapete de filigranas de prata, de olhos e de cabeleiras". Ele pediu que eu aguardasse enquanto ele se acostumava. "Não estou muito acostumado a fazer isso", comentou. Ele demorou um tempo, mas ai começou a rebolar, foi quando sentei-me e ele deslizou mais um pouco, gemendo profundamente, eu tinha tocado bem lá.
Beijei sua boca e lembrei que faltava uma coisa. Pedi-lhe um instante e levantei, vesti rápido uma camisinha e voltei, com o meu cinto preto na mão e ordenei-lhe que ficasse de bruços, ele obedeceu sorrindo. Prendi-lhe os dois braços fortes, atados pelo cinto na altura do pulso nas costas, lambi-lhe a bunda dourada mais uma vez e o penetrei com cuidado porque ele gemia muito, excitado. Deitei sobre ele, esfregando os pêlos do meu peito nas costas nuas dele e sentindo ele rebolar embaixo de mim. "Caralho... isso é... bom... demais", sussurrava. "Tá gostoso?", perguntava, "Minha bunda tá gostosa?".
Eu o libertei nesse momento, o virando de frente para mim e erguendo suas pernas em meus ombros. "Você é todo gostoso", respondi finalmente. E o penetrei novamente segurando suas pernas, ele se masturbava agora intensamente. Puxava com uma mão a minha bunda para mais perto dele. "Soca fundo!", pedia e eu obedecia. Ele gemia alto naquele momento. Olhei pela janela atrás dele e vi a praia de Ponta Negra ao fundo, ele estava de olhos fechados, quase gozando. "Goza em mim, por favor! Dentro de mim!", ele implorou. E eu acelerei. Gozei apertando as coxas ruivas dele, ele se masturbava aproveitando que eu ainda estava duro dentro dele. Mas cansou, foi ai que eu assumi e, com a boca, "uns filamentos, como lágrimas de leite, choraram, ao vento inclemente que os expulsa".

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

"And Dance Again"

, em Natal - RN, Brasil


Noite de sábado, eu estava na praia com dois amigos, tomando um açaí com cupuaçu a beira do mar. A lua crescente mal iluminava a areia e o mar após o calçadão de pedras portuguesas, falávamos sentados nas mesas de madeira sobre independência e problemas familiares, em uma mesa mais a frente quatro homens sem camisa, grandes e musculosos, devoravam sanduíches, atrás de nós uma família inteira comia batatas fritas enquanto dois filhotes de gatos andavam por baixo das mesas. Quando já nos preparávamos para ir embora uma mensagem pelo Facebook chega no meu celular. "Vamos a Vogue?", era o meu amigo comissário de bordo, eu topei e ele perguntou aonde eu estava. "Estou em Ponta Negra terminando de tomar um açaí". Ele disse que também estava no mesmo bairro, comendo, e me perguntou se eu não queria ir acompanhá-lo até a casa dele aonde ele se trocaria para podermos ir a boate. Eu olhei no relógio e eram pouco mais de 21h, se eu fosse para casa para depois encontrá-lo era realmente muito trabalho, e eu aceitei. 
Ele me pegou na frente da feirinha de artesanato e fomos conversando. "Ah, também preciso jantar alguma coisa antes de ir para a boate". Eu estranhei. "Mas você não me falou que estava comendo quando me mandou uma mensagem?", ele riu e aí eu entendi. Ele sacou o celular e abriu o Grindr, mostrou um modelo paulista que trabalha como garoto de programa. "Esse foi o menu. Ele veio a trabalho, mas tirou uma folga para se divertir um pouquinho comigo!". Eu gargalhei e comentei que ele sempre pega muito bem. Ele me olhou sério: "Não achei meu pau no lixo não, meu amigo". Chegamos a casa dele rápido, ele preparou um lanche fácil e logo tomou banho, eram 23h quando chegamos a porta da Vogue e uma fila imensa já havia se formado.
"Gente do céu, o que tem hoje aqui?", ele perguntou. Aconteciam na cidade mais outras três festas grandes, duas gays e uma hetero, não esperávamos que a Vogue estivesse tão lotada daquele jeito. Bem, era cedo e ainda não estava, mas ficou. Muito lotada. Ficamos na fila então. Foi quando recebi minha primeira cantada da noite. Ele era baixo, baita mais ou menos do meu queixo, pele quase negra e um braço musculoso e um peitoral grande, apertado dentro de uma camiseta gola v preta. Ele sorriu para mim e eu o cumprimentei com um aceno de cabeça. Foi quando ele me chamou para falar com ele, e eu fui. Ele tinha uma voz grossa, estava bebendo cerveja do lado do carro, havia um amigo sentado no banco com vários anéis nos dedos e uma corrente de prata no pescoço e um menino no banco do motorista bem efeminado, que quando cumprimentei deu-me a mão como uma lady do século XVIII. "Já vai entrar?", ele me perguntou. Eu respondi afirmativamente e o convidei para entrar comigo. Ele falou que não podia entrar até terminar a cerveja que ele e os amigos haviam comprado. Eu então disse-lhe que bastava então ele me procurar lá dentro que eu estaria o esperando. Ele sorriu um sorriso largo e pegou na minha mão carinhosamente, seria o momento para um beijo sem sombra de dúvida, mas ele apenas sorriu e eu não fiz nenhum outro movimento. A fila então se moveu e o amigo dele efeminado falou para eu me apressar senão ia perder meu lugar, notadamente incomodado com a minha presença. Eu então disse-lhe: "Te espero lá então!", e ele somente sorriu.
Entramos na boate antes da meia-noite e eu comprei algumas doses de vodca para mim. Decidi que aquela noite era uma para aproveitar como os russos e honrar meu nome. Foi quando fiz check in no Foursquare, no entanto, que o celular tocou e um casal de amigas lésbicas mandou-me uma mensagem avisando que também estavam indo para a VG. Ri, pensando: "Esta é a utilidade desse troço afinal!". Peguei a primeira dose de vodca e entramos na pista. You shout it loud, but I can't hear a word you say. I'm talking loud not saying much. I'm criticized but all your bullets ricochet. You shoot me down, but I get up! O terceiro ambiente da Vogue é sempre o mais escuro e esfumaçado. As luzes coloridas e o raio laser verde tornam-se praticamente sólidos quando passam pela fumaça do gelo seco. As pessoas dançam sobre um dancefloor que acende e brilha conforme as músicas que tocam. Foi na pista que um loiro agora, de corpo também extremamente musculoso, mas baixo e rosto feio, sorriu para mim enquanto passava puxado por uma amiga. You shoot me down, but I won't fall, I'm titanium. "Hoje vai ser os dias dos cafuçus, pelo jeito", falei para meu amigo, e ele riu. "Tirando a cabeça, ele até que é apresentável", rimos até ele reclamar em seguida que estar naquela boate sem poder beber era um crime, ele não ia ter coragem de ir falar com ninguém. "The sun goes down, the stars come out, and all that counts is here and now".  "Pode deixar que se quiser eu cuido disso para você", ele agradeceu rindo, e veio a segunda dose de vodca.
Logo a pista estava lotada e o ar condicionado começou a dar sinais de que não daria conta daquela quantidade de pessoa. Estava difícil de andar, ainda mais de pegar bebida, muito pior ainda para dançar. "Oppan Gangnam style, Gangnam style". Apesar disso, os que estavam sem camisa já estavam assim desde muito antes. Foi quando as portas laterais da boate, que dão acesso ao lounge e a área que é utilizada para grandes shows foram abertas. As pessoas então puderam se espalhar mais e, mesmo a distância, ouvir tanto a música do ambiente de música eletrônica no lounge, dobrando o espaço; ou ouvir a música do ambiente de música ao vivo que dá para o gramado onde se arma o palco maior. "Like it's the last night of our lives, we'll keep dancing till we die" Morrendo de calor, decidi ver o que estava acontecendo no ambiente de música ao vivo, que também estava lotado tocando uma banda de forró e peguei minha terceira dose de vodca cujas pedras de gelo acabavam sendo um alívio naquele calor infernal. Fiquei pouco tempo ouvindo aquele forró em que homens dançam juntos paquerando com os outros que estão parados. Foi o tempo de fumar um Lucky Strike e sair para o lounge, onde o maior espaço e a melhor ventilação afastava o calor e ainda permitia ver as pessoas que estavam por ali. Bem melhor para paquerar e ser paquerado, mas no meu caso encontrar e ser encontrado.
Alguns amigos estavam ali. "Há quanto tempo não te vejo por aqui, Foxx!?", disse-me uma, "Achei que agora que o senhor é doutor tinha abandonado essas baladas gays!", eu ri e admiti que realmente fazia muito tempo que eu não saia para boates. "We found love in a hopeless place". "Tem que sair sim, sempre, como você espera conhecer alguém em casa?", eu gargalhei dizendo que eu não havia deixado de sair de casa, eu apenas estava preferindo outros tipos de programa, tipo teatro, cinema, bares. "Mas olha, de qualquer forma você precisa parar de ser tão seletivo", falou ela do nada, com certeza influência do álcool, "porque eu só estou sozinha porque fico escolhendo demais, tem sempre um monte de meninas e eu não sei qual escolher, fico procurando a melhor e acabo sozinha, você tem que parar de procurar demais sabe?", nesse momento eu ri muito, não dela, mas de como as pessoas acham que os problemas dos outros são iguais aos seus. "You're a shooting star I see, a vision of ecstasy", e expliquei-lhe inutilmente que não era o meu caso, que eu não escolho demais porque escolher implica ter mais de duas pessoas e eu não posso escolher entre zero e zero. Foi quando ela foi comprar água e eu consegui minha quarta dose de vodca que um menino se aproximou pedindo o fogo para acender seu cigarro. "At first sight I felt the energy of sun rays, I saw the life inside your eyes". 
Baixinho, gordinho e bem feminino, com uma postura estranha de quem não sabia onde colocar os braços. Ele pediu o fogo e puxou papo, ficamos conversando, perguntou se eu era de Natal e falou de Brasília, falou que Brasília era incrível, falou das boates da cidade e das milhares de coisas boas de lá, se ele pretendia ficar comigo, escolheu, sem dúvida, a pior abordagem possível! Gabar-se de vir de São Paulo, do Rio, de Brasília, de Guiné Bissau, quando se está em outra cidade só atrai putas das boates para turistas, convenhamos. No entanto, admito, ele se tornou mais interessante quando o primo dele, também de Brasília, se aproximou. Forte, com costas largas, ele falava arrastado como quem já havia bebido por demais. "Preciso cuidar dele agora, pelo jeito", disse-me o menino, eu desejei-lhe sorte e voltei para a pista.
"I wanna dance, and love, and dance again". Muita gente já beijava ao meu redor. Todos os amigos que eu encontrava estavam já de lábios colados com algum amor que eles acabaram de conhecer e que duraria até a próxima música. Eu cantava e dançava bebendo já minha quinta dose de vodca, esta que fui no bar e o bartender fez questão de fazê-la dupla com um sorriso nos lábios. Eu o agradeci com um sorriso e meu amigo comissário de bordo falou no meu ouvido, ao ver o copo quase transbordando daquele destilado de batatas: "Ah, esse aí 'tá querendo te comer!". Gargalhamos e nos votamos para assistir ao melhor show de drag queens que já vi em terras potiguares. E a madrugada avançava. Eu estava ali, de fato, apenas como observador. Via as pessoas encontrando bocas, namorados de mãos dadas, meninos fazendo carão e mariconas que não sabem que um sorriso e convidar alguém para conversar é sempre melhor que fazer cara de mal. Já na sexta dose de vodca, também dupla, feita pelo mesmo bartender, e num número perdido de cigarros, "The dog days are over, the dog days are out", só me restava dançar até amanhecer por através daquelas portas largas.

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Pérsia: As Leis Contra os Demônios

, em Natal - RN, Brasil


A palavra Vendidad que batiza este trecho do Avesta é uma corruptela de Vî-Daêvô-Dâta, que quer dizer Dado Contra os Demônios (Daeva). Ele é composto por 22 Fargards, fragmentos dispostos como discussões entre Ahura-Mazda e Zaratustra. O primeiro fargard é o mito da criação dualista, seguido pela descrição de um inverno destrutivo que envolve um dilúvio. O segundo narra a lenda de Yima. O terceiro e do sexto ao décimo-nono trata sobre higiene. O sétimo, décimo, décimo-primeiro, décimo terceiro, e entre o vigésimo e o vigésimo-segundo, trata sobre doenças e feitiços e como lutar contra eles. O quarto e o décimo-quinto fargards discutem a dignidade da riqueza e da caridade, o casamento e comportamentos sociais inaceitáveis como agressão, quebra de contrato, e especificam as penitencias para expiar violações dos mesmos. 
O Vendidad é, portanto, um código de leis eclesiástico, é um livro de leis morais, e não um manual litúrgico, e há um certo grau de relativismo moral aparente nos códigos de conduta, sobretudo porque as diferentes partes do Vendidad variam amplamente em idade. Algumas parte são relativamente recentes, embora a maior parte do texto é muito antiga. O quinto fargard tem um trecho que nos interessa:


31. Ó, Criador do mundo material, tu és santo! Quem é o homem que é um Daeva? Quem é que é um adorador dos Daevas? O que é um amante masculino dos Daevas? O que é um amante do sexo feminino dos Daevas? Quem é uma mulher para o Daeva? Quem é tão mau como um Daeva? Quem em todo o seu ser um Daeva? Quem é que é um Daeva antes de morrer, e se torna um dos Daevas invisíveis após a morte? "Como a mulher é obediente ao seu marido, assim ele é para os Daevas." 


32. Ahura-Mazda respondeu: "O homem que se encontra com homens como homem e se deita com as mulheres, ou como mulher que se deita com outro homem, este homem que é um Daeva. Este  homem é um adorador dos Daevas [daevasnaya], um amante do sexo masculino dos Daevas, um amante do sexo feminino dos Daevas. Este homem é uma mulher para o Daeva, este homem é tão mau como um Daeva, que está em todo o seu ser um Daeva, este é o homem que é um Daeva antes de morrer, e se torna um dos Daevas invisíveis após a morte: assim ele é, se ele tem ficado com a humanidade como homem, ou como mulher". 
O culpado pode ser morto por qualquer um, sem uma ordem do Dastur [um líder religioso]. E somente por esta execução podem ser resgatados deste crime capital.


Os Daevas, que são tardiamente traduzidos como por demônios, mas cuja palavra ironicamente quer dizer "ser de luz brilhante", são, no Gathas, considerados deuses errados, falsos, que deviam ser rejeitados, mas continuavam sendo deuses. No livro escrito por Zaratustra/Zoroastro, os adoradores do daevas eram pessoas que ainda eram incapazes de diferenciar o asha (a verdade) do druj (a falsidade), a qual você conseguiria se fosse convertido a religião de Ahura-Mazda, mas apesar disso os próprios daevas não eram considerados mentirosos (dregvant).
Porém, no desenvolvimento da tradição zoroástrica, sobretudo no folclore, o significado de daevas se tornou ligado a ideia de demônios. Uma curiosidade: a seita persa dos Mahabadians, inclusive, acreditavam que a alma que não tinha falado, nem feito o bem, se tornava um ahriman ou gênios (dabestan), aqueles que ficavam aprisionados em lâmpadas realizando os desejos dos homens até cumprir a parcela de bem que não tinham feito vivos. Outros que se tornavam daevas eram muitas vezes os ímpios, excluídos do céu.
No texto do Vendidad, o significado da palavra está na transição do significado clássico para o sentido folclórico. Mas de qualquer forma o trecho não fala somente dos homens que "como mulher" se deitam com outros homens, isto é, que participam de relações homoeróticas, mas também aqueles que se deitam como homens com as mulheres, participando de relações heteroeróticas, ou seja, qualquer homem que se rende a luxúria, ao prazer sexual, ao morrer se tornará um daeva, a não ser que este seja assassinado, porque assim seu crime será perdoado.
A luxúria no Zoroastrismo é uma das forças que desequilibram o bom desenvolvimento da humanidade, junto com a cobiça e o ódio. Essas forças do mal devem ser contestadas de forma proativa, abraçando uma vida de bons pensamentos, boas palavras e boas ações. No caso da luxúria, exatamente, é manter-se numa vida de castidade em que qualquer sexo, qualquer um, tanto sexo entre um homem de uma mulher quanto o sexo entre dois homens ou duas mulheres,  deve ser evitado sob pena de morte. 

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Onde Está o Amor? ou Get Over It!

, em Natal - RN, Brasil


Um grande problema meu não é haver ou não haver pessoas que me amam. Elas existem! O problema é o meu coração, tão machucado e maltratado, que tornou-se muitas vezes incapaz de reconhecer o amor quando ele não está óbvio, pintado de vermelho, sustentando um cartaz imenso dizendo: Estou aqui e te amo! Este é o problema que agora tenho tentado resolver. Por exemplo: preciso reconhecer que agora, após sair do armário, o esforço que meus pais tem feito para manter tudo embaixo do tapete e ignorar tudo que foi dito é a forma deles de me amar. Não é a melhor forma, obviamente. Eu com certeza preferia que eles dissessem que têm orgulho de mim, mas o que eu esperava é que eles me expulsassem de casa. E isso não aconteceu. E não aconteceu por causa do amor. 
Preciso também entender que tudo que eles fizeram comigo, todas as surras, humilhações, etc, em resumo, tudo o que me tornou carente como sou agora, foi a forma torta e errada deles me amarem. Infelizmente este é um fato. Não foi por falta de amor que sofri o que sofri com meus pais, foi porque eles aprenderam que amar um filho é torná-lo o melhor e ser gay não estaria nesta lista. Além disso, durante os anos que morei em Belo Horizonte, tudo o que eles fizeram (neste caso) por mim, sem dúvida, demonstram o seu amor. Meus pais me apoiaram em tudo (sobretudo financeiramente) durante meu doutoramento e se isso não é amor, o que mais seria, não é?
Outro exemplo são meus amigos. Todos eles. Os que moram longe e os que moram perto. Neste último ano, que voltei para Natal, foi o ano em que mais me apoiei nos meus amigos que moram longe. Conversei mais com o Cara Comum e o Rajeik (de BH), o Gato de Cheshire e o BrunoEtílico (do RJ) e o Bernardo (que mora na Alemanha) do que com qualquer amigo meu de Natal. E, todavia, eu era sempre muito injusto quando reclamava da falta de amigos que eu sentia. Tudo culpa deste coração machucado que precisava de amigos perto para não se sentir sozinho. A distância não impede a amizade, graças a tecnologia (internet e telefones), a Alemanha é bem ali.
Sobre meus amigos de Natal, eu realmente os perdi. Morando cinco anos em Belo Horizonte, eu perdi com eles o hábito de nos encontrarmos, coisa que só comecei a recuperar agora. Notem: o que perdemos foi o hábito, não o vínculo. Eles perderam o hábito de me incluir nos programas que eles organizam, cabia a mim, e só a mim, ligar e perguntar o que eles estavam fazendo, e eles sempre estavam já em algum lugar e, simplesmente, não tinham lembrado de me convidar. Demorou para que eu voltasse a figurar na lista de convidados. Sem lembrar que como eles estão todos namorando, e eu sou o único solteiro, os programas em que eu sozinho podia participar eram menores, o que fez com que a situação demorasse ainda mais. 
No entanto, o vínculo nunca se perdera. O carinho deles por mim não deixara de existir. Ainda sou o futuro padrinho de casamento do Andarilho e do namorado, ainda figuro na lista de melhores amigos do Peter e do Miguel.
A ausência de amor, então, nunca fora um problema externo. Eu estava cercado de amor o tempo todo, mas a dor no meu coração era tão grande, tão imensa, tão sufocante, que ela não deixava passar as delicadas demonstrações de amor que eu recebia todos os dias. Era uma barreira interna. Tudo culpa da solidão. Não, minto, tudo culpa do meu medo da solidão. De fato, o fracasso definitivo da minha vida amorosa na capital mineira me deixou exposto ao meu verdadeiro medo de ficar para sempre sozinho e não poder ter uma família (já que nunca a tive quando criança/adolescente), este pavor me fez construir um mundo para mim no qual eu já estava sozinho para que quando eu me sentisse realmente sozinho não sofresse tanto. Por isso eu repetia obsessivamente que ninguém é capaz de me amar, para me convencer e com isso me preparar melhor para o futuro negro que eu vislumbrava e temia. Eu me dei doses homeopáticas de solidão, no entanto, convenhamos, o quão isto é idiota?
Eu não preciso temer nunca ser amado por aquilo que eu sou. Tudo bem, ninguém quer me namorar, isso é um fato que não podemos mudar, ninguém entre todas as pessoas que eu conheço e conheci foram capazes de se interessar por mim para algo além do que uma noite de sexo, mas eu digo para mim mesmo: Get over it! Supere, Foxx! Isso não quer dizer que não posso ser amado. Eu tenho uma família que me ama do jeito torto deles, mas me ama. Meus amigos distantes só estão distantes porque moram longe de mim, mas me amam do mesmo jeito. Meus amigos próximos estavam distantes porque eu morei longe por tempo demais, com esforço, graças ao amor que ainda existe, eu pude recuperá-los. Agora meu trabalho, meu desafio, é curar meu coração para que ele seja capaz de sentir o amor deles e, com isso, afastar o fantasma da solidão que me persegue porque como todo fantasma ele ganha força por causa da minha crença nele.

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

A Virada (capítulo três)

, em Natal - RN, Brasil


Pelo bate-papo do Facebook, eu apenas respondi ao Fernando que entendia os motivos dele, obviamente, não gostava porque eu gostaria de ter um relacionamento e ele seria ótimo para isso. "Você também seria, Foxx, você tem tudo o que alguém como eu deseja. Inteligente, bonito, essa barba linda, esse jeito de proteger a gente, mas eu realmente não posso criar vínculos com alguém aqui em Natal". Eu sorri, com a ilusão dele de que seria possível sairmos frequentemente, como ele propunha, e não criar-se entre nós nenhum vínculo. Era tarde, nos despedimos e fomos dormir.
No outro dia, segunda-feira, no trabalho, foi um dia tranquilo. Postagens para programar, reparar se alguém tentou se comunicar com os nosso clientes durante o fim de semana e responder essas mensagens. Deu tempo de mandar um "Então, moço, como vai nesta segunda?" para o Artie, pelo Whatsapp. O menino que fiquei no sábado, na Virada. Ele respondeu rápido, e eu falei do sono que eu estava no trabalho, ele riu e perguntou no que eu trabalhava, eu expliquei: "gerente de nódoas sociais", reclamei do corretor automático do telefone e ele riu bastante, eu corrigi: "gerente de mídias sociais". Conversávamos e eu via a foto dele que ele usa no perfil: ele tem 21 anos, 10 a menos do que eu, uma boca vermelha que pede um beijo e olhos que se apertam quando ele sorri, magro, disse que preferia os gordinhos quando reclamei do meu peso. As mensagens tornaram-se comuns então, entre "bom dia!" e "como foi seu almoço?", falamos sobre quem somos e ele demonstrou claramente estar fazendo o joguinho de "vou fingir que não estou interessado", apesar de que se dá ao trabalho de responder todas as mensagens.
Conversei a semana toda, sempre amenidades, pelo Facebook sempre com o Fernando, conversas que não duravam nada mais do que uma ou duas frases; e pelo Whatsapp com o Artie, conversas que duravam uma tarde toda, as vezes, em mensagens que iam e que vinham pelo aplicativo do celular. Até que na sexta-feira, após Fernando chegar do emprego em casa por volta da meia-noite, ele resolveu abrir a câmera para mim para que eu pudesse vê-lo apenas de sunga no seu quarto. Típica provocação. Acabamos, apesar da sunga dele do outro lado e da bunda linda que ela escondia, conversando bastante. Ele comentou que jogou meu nome no Google porque um amigo de São Paulo ficou curioso. Descobriu sobre meus livros publicados, meu currículo acadêmico, eu brincando falei que isso não era nada: "Eu também canto, desenho, danço e sei levantar parede...". Ele riu, lá do outro lado, mas disse não duvidar que sou cheio de talentos. "Vamos nos ver amanhã?", ele convidou, "É minha folga e podemos fazer algo juntos". Eu concordei. E ele falou que teria que ir na academia, depois retocar uma das tatuagens que tem no braço esquerdo, mas depois disso estaria livre para me ver. "Você me liga amanhã ao meio-dia para confirmarmos direitinho?", eu assenti  e ele se despediu. Já era tarde mesmo e precisávamos dormir.
A ligação no dia seguinte não durou mais do que um minuto. Ele combinou de nos encontrarmos no studio de tatuagem próximo da casa dele, em Ponta Negra, na zona sul da cidade. Eu fui encontra-lo e ficamos conversando enquanto ele grunhia por causa das agulhas sobre X-Men e qual nossos personagens preferidos em Harry Potter, ele disse que era óbvio que eu ia gostar da Hermione, também falamos de minha coleção de filmes antigos (eu comecei ano passado uma coleção de DVDs de filmes antigos, para ser mais preciso, de filmes históricos que retratam o período da Antiguidade), pois eu havia acabado de adquirir A Queda do Império Romano e Rômulo e Remo, ficaram n'As Americanas O Egípcio e Os Dez Mandamentos,  e também que ele detestava O Pequeno Príncipe. "Mas você já leu?", ele me olhou torto e confirmou que não. "É um preconceito, tá?", admitiu, "Não quero virar miss de nada não!". O retoque da tatuagem terminou rápido, e ao sairmos do studio ele fez o convite que eu não sabia como reagir: "Vamos para minha casa?"

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

"Assumido Mesmo"

, em Natal - RN, Brasil
No dia seguinte após sair do armário para meus pais, eu estou assistindo Seinfeld deitado no sofá de bruços, quando meu pai passa por mim e pergunta:
- Você estava falando sério sobre ser gay ontem?
- Sim, eu falei sim. Eu sou gay.
- Mas você é gay mesmo? Assumido mesmo?
Eu não entendi muito bem o que aquela palavra "assumido" queria dizer para ele, mas resolvi que não valia discutir com ele sobre aquilo.
- Eu estou assumindo para vocês.
- Mas que prazer você sente nisso?
Eu pensei em responder o quanto prazer eu sinto com isso, mas achei melhor não entrar nesses detalhes com ele.
- Infelizmente, meu pai, foi assim que eu nasci.
- E você se sente abençoado por Deus?
- Mas claro que sim, foi Deus que me fez ser assim. Desde pequeno.
Ele deu um passo para trás e tinha um olhar de raiva.
- Eu sempre soube. Eu sempre soube! Foi isso que eu quis evitar. Posso ter te magoado, te batido, te maltratado, mas isso foi para evitar que você se tornasse gay! Isso é errado! 
- Mas como você pode ver não adiantou. E não adiantou porque quando você me batia com 7, 10, 12 anos, eu já era gay. Eu não podia mudar porque eu já era assim.
-Você sabe que isso é uma escolha. Uma escolha errada! 
- Não, painho, não é. Ninguém escolhe ser maltratado e odiado pelos próprios pais.

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Pérsia: As Respostas de Ahura-Mazda

, em Natal - RN, Brasil


A religião persa chamava-se Zoroastrismo, fundada por Zaratustra ou Zoroastro (em grego). É a primeira religião baseada em um monoteísmo ético, isto é, haviam duas divindades (dualismo), Ahura-Mazda (o bem) e Arimã (o mal), na qual os seguidores deviam apoiar Ahura-Mazda, seguindo seus preceitos e praticando o bem, para assim enfraquecer Arimã e o planeta chegar ao paraíso após a chegada de um messias. O Zoroastrismo influenciou profundamente o judaísmo e o cristianismo durante o período do Cativeiro da Babilônia. 
Antes do Zoroastrismo, a Pérsia cultuava inúmeros deuses classificados como Ahura (senhores) e Daevas (deuses e, mais tarde, demônios sobretudo por representarem deuses de outras nações, como os deuses hindus). Porém por volta de 1750 a.C., Zaratustra, conta a tradição, que era um sacerdote de um certo ahura, foi guiado por um ser feito de luz, Vohu Manah (o bom pensamento), até a presença de Ahura-Mazda e os cinco Amesha Spenta (os imortais sagrados), os quais lhe transmitiram uma nova mensagem religiosa. Zaratustra então começou a pregar sua religião dualista o que o fez ser perseguido e, após doze anos, ele teve que deixar a Pérsia e se fixou na região da Báctria, atual Afeganistão, sob a proteção do rei Vishtaspa e da rainha Hutosa que convertidos a religião do persa transformaram o Zoroastrismo na religião oficial do reino. Contudo foi Dario I, em 590 a.C., que reconheceu o Zoroastrismo como religião oficial do império persa. Neste período, existia entre os medos uma classe sacerdotal chamada os Magi ou Magoi que adotaram o Zoroastrismo e acabaram por incluir nele diversas práticas suas como a exposição dos cadáveres a aves de rapina, o casamento entre membros do próprio grupo, e a personalização dos Amesha Spenta que tomaram a forma de antigos deuses medos como Anahiti, deusa da fertilidade, que ocupa o lugar de Ameretat, a imortalidade; Mitra, o sol, que substituí Asha Vahishta, a verdade perfeita; Vayu, o vento, que ocupa o lugar de Khashathra Vairya, o governo desejável; Tishtrya, a chuva, que toma o lugar de Hauravatat, a plenitude; e Awmaiti, a terra, que tornar-se Spenta Ameraiti, devoção protetora; além de Tiri, o planeta Mercúrio, aparece no lugar de Vohu Manah, o bom pensamento.
Para a maioria dos historiadores, Zaratustra é na verdade um grande reformador. Ele propôs uma mudança no panteão indo-ariano no sentido do dualismo e monoteísmo, ao qual deu preferência aos Ahura, que passaram a representar aqueles que haviam escolhido o bem, enquanto os Daevas passariam a representar aqueles que haviam escolhido o mal. A lógica, no entanto, é a oposta quando pensamos a religião hindu, em que os Daevas são os principais deuses da Índia. Os principais documentos que permitem conhecer o Zoroastrismo são os Gathas, dezessete hinos atribuídos a Zaratustra, escritos por volta de 1500 a.C., que são o principal núcleo do Avesta, o livro sagrado do Zoroastrismo. Os Gathas revelam esse pensamento dualista porém num sentido ético, cabia ao homem escolher para si um comportamento bom, correto e honesto, porém, somente posteriormente, com outros textos que são agregados ao Avesta que este dualismo passa a tornar-se cosmológico, agir ao lado de Ahura-Mazda e contra Arimã torna-se a tarefa primordial que mantém nosso planeta intacto. Arimã tornar-se então um inimigo de Mazda, o que possuí a spenta mainyu (energia poistiva), que deve ser combatido, responsável pela destruição, pelas doenças, pelos desastres naturais, portador da angra mainyu (a energia negativa). Nesta lógica, haveria um dia, em que um descendente de Zaratustra, nascido de uma virgem, viria por fim realizar o Saoshyant, no qual o bem venceria definitivamente o mal e, com isso, Arimã seria finalmente derrotado. 
Sobre relações homoeróticas, na verdade, sobre relações sexuais, os Gathas não se pronunciam. Contudo, textos acrescidos posteriormente, inclusive para muitos estes textos são corrupções dos ensinamentos originais de Zaratustra. Um desses textos é o Vendidad, uma coleção de 22 fargards, isto é, preceitos religiosos escritos na forma de perguntas e respostas feitas ao próprio Ahura-Mazda, que fazia parte da tradição oral persa e foi compilado mais tarde e publicado junto com o Avesta. Neste, as relações homoeróticas são pintadas como uma mancha impossível de apagar na vida de qualquer iniciado na religião de Ahura-Mazda, um pecado imperdoável.
O Capítulo V, a partir do parágrafo 26, diz:

26. Ó, Criador do mundo material, tu és santo! Se um homem, pela força, comete o pecado não natural [relações homoeróticas], qual é a pena que ele deverá pagar?

Ahura Mazda respondeu: "Cem chibatadas com o Aspahe-astra, 800 chibatadas com o Sraosho-Charana."


27. Ó, Criador do mundo material, tu és santo! Se um homem voluntariamente comete o pecado não natural, que é a pena para ele? Qual é a expiação por ele? O que é a limpeza do mesmo?


Ahura Mazda respondeu: "Por esse ato, não há nada que possa pagar, nada que possa reparar, nada que possa limpar a partir dele, é uma ofensa para a qual não há expiação, para todo o sempre."


28. Quando é assim?


"É assim que se o pecador for um professor da religião de Mazda, ou aquele que tem sido ensinado nela. Mas, se ele não é um professor da religião de Mazda, nem aquele que tem sido ensinado nela, em seguida, seu pecado é tirado dele, se ele faz a confissão da religião de Mazda e resolve nunca cometer novamente tais atos proibidos."

29. A religião de Mazda na verdade, ó Spitama Zaratustra!, tira dele que faz a confissão os laços com seu pecado, que tira (o pecado de) quebra de confiança, leva embora (o pecado de) assassinando um dos fiéis, que tira (o pecado de) enterrando um cadáver, que tira (o pecado) de obras para as quais não há expiação, ele tira o pior pecado da usura, que tira todo o pecado que pode ser pecado.

30. Da mesma forma a Religião da Mazda, ó Spitama Zaratustra! purifica os fiéis de todo o mal pensamento, palavra e ação, como um vento impetuoso limpa a planície. Então, vamos todos os atos que ele pratica, doravante, ser bom, ó Zaratustra!, uma expiação completa para o seu pecado é efetuada por meio da religião de Mazda.


No entanto, o castigo que se apresenta aqui é o mesmo para diversos pecados sexuais. Vejamos, por exemplo para a masturbação, no capítulo oitavo:

26. Ó, Criador do mundo material, tu és santo! Se um homem involuntariamente emite sua semente, que é a pena que ele deverá pagar? 
Ahura Mazda respondeu: "Cem chibatadas com o Aspahê-astra, 800 chibatadas com o Sraoshô-karana".
27. Ó, Criador do mundo material, santo tu és! Se um homem voluntariamente emite sua semente, que é a pena para ele? Qual é a expiação por ele? O que é a limpeza do mesmo? 
Ahura Mazda respondeu: "Por esse ato, não há nada que possa pagar, nada que possa reparar, nada que possa limpar a partir dele, é uma ofensa para a qual não há expiação, para todo o sempre. "

É, portanto, apenas uma questão sobre vida sexual. A discussão aqui é sobre como se manter puro, e isto envolve manter-se distante de qualquer relação sexual, seja ela com uma pessoa do mesmo gênero, de um gênero diferente ou mesmo masturbando-se.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

"Someday You're Out"

, em Natal - RN, Brasil
Era já no meio de uma discussão que meus pais, irritados, queriam saber porque eu não gostava de ir para a casa de praia deles, em Santa Rita.
- Você 'tá escondendo o motivo que eu sei... 
Resmungou minha mãe.
- Não existe motivo para você não gostar de Santa Rita, Foxx. 
Meu pai dizia do outro lado. E eu repetia a exaustão:
- Pois eu não gosto de ir para aquela praia...
- Parece até que você tem vergonha de sua família.
Eu me irritei neste momento.
- Quem tem vergonha de mim são vocês. Sempre tiveram! Acha que eu esqueço quando meu irmão caçula não falava comigo na escola por vergonha de mim, ou do meu irmão mais velho que exigia que o senhor - e apontei para o meu pai - batesse em mim porque ele tinha vergonha das pessoas me chamarem de viadinho na rua. Sem contar o irmão do meio que me ameaçou de morte porque sou gay... 
Eu falava soluçando. As lágimas estouravam nos olhos.
- Sem falar que vocês dois mesmo... você, painho, me batia porque alguém na rua me chamava de bichinha; você, mainha, você mesmo me xingava de mulherzinha porque as minhas coisas eram sempre de menininha. 
- Eu nunca bati em você na vida...
Repetiu meu pai e eu gargalhei apesar das lágrimas que caiam.
- Não seja mentiroso! Você me batia porque as pessoas me acusavam na rua de viadinho quase sempre...
- E o que importa? Você não é bicha, é?
Meu pai perguntou como um desafio. E, em segundos, ocorreu uma batalha no meu cérebro. O que responder: mentir mais uma vez ou jogar toda a merda no ventilador. A resposta me surpreendeu quando brotou dos meus lábios.
- Sou sim. Sou bicha, viadinho, gay!
Minha mãe fez um comentário rápido, coberto de ironia:
- Eu sempre soube... desde pequeno...
- Eu sei que sabiam, os dois sabiam e por isso mesmo me maltrataram.
As lagrimas brotavam sem vergonha agora enquanto eu falava.
- Enquanto você, painho, me batia no lugar de me proteger de um mundo que só me atacava. 
Ele tentou balbuciar uma negativa novamente, mas eu ignorei e continuei falando:
- Você, mainha, fechava os olhos para o sofrimento do seu filho. Porque você sabia que eu era xingado e maltratado em todos os ambientes que eu estava, que eu tinha vergonha de sair de casa, que eu não tinha amigos, que meus próprios irmãos me excluíam... ai agora você vem cobrar que eu participe da família?
- Do jeito que você fala - começou minha mãe a falar ainda com ironia - parece até que você é infeliz...
- E eu sou infeliz, você que não acredita. Todos os dias eu faço força para acordar porque não tem nada em minha vida, nada!, que me faça ter prazer para acordar todos os dias. É um martírio! Um sofrimento!
Meu pai interveio:
- Então quer dizer que a culpa da sua infelicidade é nossa porque nós tentamos te consertar?
Eu sorri:
- Como se eu estivesse quebrado.
- Mas você está errado em ser gay, você devia tentar não ser. 
Concluiu meu pai. 
- Eu não posso, primeiro porque não estou errado, segundo porque eu nasci assim. Sempre fui assim e vocês mais do que qualquer um sabem que eu sou assim desde pequeno. Afinal, foi por isso que vocês me colocaram num psicólogo quando pequeno, para me curar...
Meu pai tentou negar.
- Eu nunca te levei a psicólogo não...
- Você devia parar de mentir, painho, isso sim...
Ele pretendeu continuar negando, mas minha mãe interveio.
- Realmente levamos você a um psicólogo, esperávamos estar ajudando você, mas você foi a duas sessões e não quis mais ir.
- Claro que não! Eu era criança, mas sabia perfeitamente que se eu falasse a verdade para aquela psicóloga eu ia apanhar em casa. Porque eu já apanhava e sabia que era porque meus pais não me aceitavam como eu sou. 
- Nós aceitamos você! 
Bradou minha mãe.
- Não, vocês se envergonham de mim. Sempre se envergonharam! E o pior é que eu sou o melhor dos quatro filhos que vocês tiveram, porém - e olhei diretamente para meu pai falando isso - tenho certeza que você tem muito mais orgulho do cafajeste do seu primogênito que não vale uma pataca furada, mas ele pelo menos é heterossexual, não é?
Ele não respondeu. Minha mãe, no entanto, começou a chorar e a fazer uma oração em voz alta.
- Senhor, me perdoa, me perdoa por ter feito meu filho infeliz. Ele tem trinta anos e eu nunca permiti que ele fosse feliz, Senhor! Perdoa-me!
Eu via as lágrimas caindo nos olhos dela, mas não me comovi.
- Você está querendo me tornar o vilão dessa estória, mainha, mas eu não sou. Eu sou vítima do que vocês fizeram comigo. Obviamente fruto de sua ignorância, sei perfeitamente que vocês fizeram com a melhor das intenções, contudo, o resultado não foi satisfatório, a única coisa que vocês me ensinaram foi que eu devia ter vergonha de quem sou.
Ela, no entanto, continuava a oração enquanto eu falava. Eu ouvi apenas a última parte.
- Perdoa, Senhor, a mim e ao meu filho pelo que ele é.
- Eu não tenho nada de errado pelo qual Deus vai me perdoar, mainha, porque foi ele quem me fez assim.
Ela continuava chorando, meu pai permanecia em silêncio como sem acreditar que tudo aquilo estava acontecendo. Eu funguei pela ultima vez e abri o computador. 








terça-feira, 1 de janeiro de 2013

A Virada (capítulo dois)

, em Natal - RN, Brasil
Acordei na minha cama, ao meio dia de domingo, com um pouco de ressaca moral. Minhas roupas estavam jogadas pelo chão do quarto e eu pelado sob as cobertas, o ventilador era o único barulho no quarto. Meu primeiro pensamento foi se eu me dignei a tomar um banho, pelo menos, antes de desabar na cama, mas eu lembrei que sim. Estendi a mão e procurei meu celular que ainda estava descarregado, o liguei ao carregador e vi uma mensagem de "oi", do Artie,  no Whatsapp, provavelmente apenas para registrar seu número entre os meus contatos. Também mensagens do Tutz que pegou o Nathan falando das poesias que este último havia lhe enviado. "Não quero namorar", reclamava o outro. Lavei meu rosto e tomei meu café da manhã e foi ai que o celular tocou alto as primeiras notas de We Started Nothing de The Ting Tings, com o nome do Miguel no visor. Ele me convidava para ir a parada gay, que, apesar da ressaca, eu aceitei por motivos políticos. Eu não faltaria por nada!
Chegando lá, a primeira pessoa que eu encontrei foi o Fernando, da noite anterior, vestido com a mesma roupa. Ele veio direto falar comigo e começou se explicando que dormira na casa de uma amiga e, por isso, estava com a mesma roupa. Fernando é alto, por volta de 1,85, pratica jiu-jitsu, tem o cabelo de um ruivo escuro, quase castanho, cor de madeira em brasa, e olhos de um verde-mar, e paulista. Ele me cumprimentou e perguntou do Nathan, disse-lhe que não sabia dele. "Procurei você ontem a noite, mas não encontrei mais...", eu imaginei que devia ter sido no momento que eu estava aos beijos com o Artie, e ele começou a contar que me procurou depois que viu o Tutz ficando com o Nathan, surpreso, ele repetiu: "Eu achei que vocês dois eram namorados, Foxx!". Eu ri da confusão dele, e expliquei que éramos somente amigos. "Então cadê seu namorado?". 
Eu respondi que não namorava e ele sorriu. Ele tem um sorriso aberto e cativante, do tipo de gente que conquista os outros pela simpatia. E me tocou a cintura, acariciando minhas costas. Foi nesse momento que a parada gay de Natal começou a desandar, e os organizadores convocaram os participantes a tomarem a rua, ele foi o primeiro a se erguer e avançar, me pegando carinhosamente pela mão, e me levando até a rua. Ficamos lá, em meio a avenida, conversando e durante muito tempo de mãos dadas. Quando nos convidaram para assinar um abaixo assinado, ele também caminhou até lá comigo de mãos dadas, foi na volta que ele sorriu para mim e eu puxei a cabeça dele e o beijei. Ele, muito mais alto que eu, tinha que se abaixar um pouco para me beijar, mas ficamos a tarde e boa parte da noite na parada gay juntos, de namoradinhos, de mãos dadas ou com ele abraçado às minhas costa, ou ele na rua e eu na calçada (ai ficávamos da mesma altura) comigo o abraçando por trás. Quando ele foi embora (precisou ir embora antes porque havia machucado o joelho num treino de jiu-jitsu e o joelho começou a reclamar depois de tanto tempo em pé), o Miguel virou-se para mim e disse: "Vocês dois juntos estavam tão bonitinhos!".
Chegando em casa, eu o adicionei no Facebook e, poucos minutos depois, ele estava on-line. Conversamos algumas amenidades, quando eu disse-lhe que adorei ficar com ele naquela noite, ele agradeceu e disse que sentira o mesmo também. "...mas, antes de tudo, eu preciso te contar uma coisa...". Gelei nesse momento. "...eu estou me organizando para voltar para São Paulo, por isso não estou aberto para um relacionamento agora". Eu realmente me perguntei naquele momento porque diabos ele estava me contando aquilo com tão pouca intimidade. "Porém, contudo, todavia, entretanto, eu com certeza gostaria de ficar com você novamente... nada sério... mas eu gostaria muito de voltar a sair com você qualquer dia".