Google+ Estórias Do Mundo: maio 2014

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sexta-feira, 30 de maio de 2014

Dilema

Hoje, aqui, estava programado um texto sobre conselhos para minha vida amorosa dados por um amigo via Whatsapp. Transcrevi uma conversa, após aprovação dele, e tencionava mostrá-la a vocês, contudo desisti. O post anterior Eu Sou Theodore reapresentou aqui um tipo de texto que eu não desejava mais escrever no blog, ele retornou de mansinho, como se eu falasse sobre um filme, mas como o Marcos atentou em um dos comentários, eu só estava escrevendo mais um texto de como não tenho qualidades e como minha vida é uma bosta. E eu havia prometido (a mim mesmo) não trazer este assunto a tona novamente.
E, ironicamente, apesar de ser criticado diariamente ano passado por causa deste tópico, foi o texto que mais tive engajamentos, comentários, no ano todo. Meus textos sobre História, sobre política, sobre comportamento gay, os temas que escolhi para manter o blog vivo agora que ele caminha para os dez anos, nenhum destes temas conseguiu tanta participação de vocês, leitores, como um daqueles que eu poderia ser acusado de criar minha própria pity party. Acusação que, admito, sempre me incomodou profundamente e que fez muitas pessoas escreverem comentários agressivos (uso esta palavra para manter a polidez) que pretendiam sem dúvida me fazer parar de escrever.
Mas agora, quando começo a planejar algo especial para o décimo ano do Estórias do Mundo, eu me pergunto se vale a pena. Manter os temas inférteis que tenho abordado que geram comentários que se resumem a frases como "que texto interessante", isto é, quando existem comentários; ou abordar minha vida infeliz e solitária, atraindo muitos comentários, mas estes cheios de maldade, e que faz com que todos me considerem um depressivo pessimista mal-humorado cuja companhia, mesmo virtual, é como um câncer corrosivo que precisa ser extirpado antes que consuma a luz de suas vidas?
Eu não sei o que fazer e o dilema se instala. As opções são claras, e peço ajuda a vocês para responder na enquete acima. Mas aqui explico as opções:

1. Continuar a falar sobre História, Política e Comportamento gay.
POSITIVO: Eu estou a vontade escrevendo sobre o tema, não me exponho e preservo minha privacidade, o que dado a minha vida atual, é a melhor opção.
NEGATIVO: Não existe identificação dos leitores do blog com estes temas, o que não causa engajamento, isto é, comentários. Sem comentários eu, sinceramente, me sinto escrevendo para as paredes como se ninguém estivesse lendo. Também escrever assim sozinho, sem discutir aquilo que escrevi com os comentadores, me soa extremamente narcisista, como se eu escrevesse somente para expor meu raciocínio sem me preocupar com o que o outro tem também a dizer. 

2. Escrever sobre minha vida, isto é, minha solidão e as desventuras amorosas/sexuais que me cercam se eu abrir esta porta. Por que, infelizmente, não existe nada de bom a dizer sobre minha vida.
POSITIVO: Haveria diálogo no blog. Comentários, discussões, conversas seriam comuns.Também com a identificação das pessoas com os meus problemas, talvez alguém se reconhecesse representado e descobrisse que só porque sua vida é uma merda não significa que você está morto nem doente. Acontece nas melhores famílias.
NEGATIVO: Haters! Os comentários me atacando são cansativos. Desgastantes é a palavra. Uma coisa é alguém criticar, opinar, dar seus motivos; outra é um anônimo que só quer sapatear sobre quem já está fodido destilar seu veneno como se fossem palavras de sabedoria. Também não suporto mais o papel que me colocam de quem quer chamar atenção, de quem faz o papel de pobre coitado porque, simplesmente, ninguém consegue acreditar que minha vida é cagada.

3. Eu posso mentir. Cada vez que algo acontecer, eu posso contar a história oposta. Um dia solitário pode se tornar um jantar entre amigos aqui em casa, uma noite amarga pode se transformar uma declaração ardente de amor. Eu teria a vida que sempre desejei.
POSITIVO: Todos finalmente poderiam tirar das suas cartolas a frase "eu te disse" que estão guardados. Não haveria nenhum comentário maldoso. E também todos que me leem poderiam ter esperança que sua história também poderia mudar. Além disso, seria um ótimo exercício criativo.
NEGATIVO: Seria uma mentira. E mentiras dão trabalho para manter, eu teria que garantir que a mentira tanto nos Facebook, como Twitter, Instagram e Tumblr, isto é, minhas redes sociais, para funcionar; o que, necessariamente, atingiria também meus amigos, o que não seria um grande problema porque eu não tenho contato com eles fora do computador, isto é, nenhum deles convive comigo de fato aqui em Natal, seria fácil de nem eles saberem a verdade. Mas o que aconteceria se tudo fosse descoberto algum dia? Que problemas isto poderia me causar?

4. Fechar o blog.
POSITIVO: Existe algo? Sinceramente não vejo nada de positivo. Não para mim.
NEGATIVO: Eu não tenho a menor vontade de encerrar o blog, porque eu gosto de escrever, mas se ninguém está lendo, para quê? É uma opção, mas é algo que eu só faria em último caso. 

sexta-feira, 23 de maio de 2014

Eu Sou Theodore



O Gato me avisou para assistir Ela (Her, Toronto, 2013) com cuidado. Ligou-me após o filme, apesar dizer que detesta spoiler, dizendo que tinha pensado em mim durante toda a fita. O enredo gira em torno de um homem solitário (Joaquin Phoenix), recém-separado, com poucos amigos e dedicado ao seu trabalho como escritor. Theodore, seu nome, vive em um futuro hipster, em que pessoas se vestem como na década de 1950 e ditam cartas para que seus computadores as imprimam como se escritas à mão fossem. Neste futuro, um sistema operacional chamado no filme de "nova consciência" é vendido e, após instalado e personalizado através de quatro perguntas, Theodore é apresentado a ela, Samantha (Scarlet Johansson). Mas Samantha é apenas uma voz, no computador. Tudo bem que ela compõe músicas para ukelêle e discute filosofia (eu avisei que era um futuro hipster), mas é com esta criatura imaterial que Theodore se relaciona, se torna amigo e, por fim, se apaixona.
Todos os amigos de Theodore apoiam o relacionamento dele com o sistema operacional. Inclusive, explica-se que aquilo tem sido comum, pessoas têm relacionamentos de amizade e amorosos com os programas. Uma cena, na minha opinião, é esclarecedora. Theodore encontra sua ex-esposa para assinar o divórcio (eles já estão separados desde o início do filme, ela aparece somente em flashbacks) e ela pergunta se ele está saindo com alguém. Ele conta sobre Samantha e que ela é um programa de computador. O diálogo que se segue é a chave para decodificar todo o filme.
As afirmações da ex-esposa sobre a incapacidade dele de lidar com a depressão dela, das exigências dele para que ela se mantivesse drogada, do afastamento dele diante da recusa dela de resolver seus problemas através do uso de medicamentos, sua percepção que Theodore não possui o amadurecimento para lidar com emoções reais, na verdade, são uma crítica de Spike Jonze, diretor e roteirista do filme, a toda geração Y e seus relacionamentos virtuais. Namoros e amizades construídas somente mediante uma rede wifi. Amigos que são incapazes de participar da vida uns dos outros quando um problema real aparece; namoros higienizados por uma total e completa ausência de contato físico entre os ditos parceiros; relacionamentos que, de fato, podem ser desligados assim que se deseja.
A crítica de Jonze me acertou em cheio. Eu sou Theodore. Sem experiências com relacionamentos reais. Catando migalhas entre aplicativos e redes sociais. Sem uma vida própria e construindo ficções de relacionamentos (amigos e amores) impossíveis de se realizar fora da rede mundial de computadores. Eu tenho 32 anos e a maturidade de um garoto de 22 anos (yes, I had been tested) porque, além de estudar, o que eu fiz mais na minha vida?
Isso talvez explique minha dificuldade em construir relacionamentos. Eu, imaturo, atrairia também garotos imaturos (eu sou realmente assediado por garotos entre 16 e 23 anos, homens mais velhos não olham para mim nem por decreto presidencial ou bula papal), os quais podem não estar interessados em relacionamentos ou, quando estão, podem se decepcionar porque eu não sou o homem maduro que eles procuram quando olham para alguém de 32 anos.
Eu sou como Theodore: vazio e incapaz de oferecer qualquer coisa na troca que é um relacionamento entre duas pessoas. Eu não fiz nada, eu não construí nada, eu não consegui nada, eu não possuo nada, eu não tenho nada do quê me orgulhar. Eu só acumulei um monte de conhecimento que se eu pensar em externar sempre vai soar como arrogante. Eu, como Theodore, sou incapaz de me relacionar com sentimentos e pessoas reais porque eu não tenho a experiência necessária. Não desenvolvi em minha vida as ferramentas que são úteis para a construção de relacionamentos humanos. Não tenho inteligência emocional, mas meu Q.I. é de 120 pontos. Não tenho a mínima experiência, não tenho a menor capacidade, não possuo nenhum talento.
Não é a toa que meu único namoro foi virtual, que todos os meus amigos só existem através do Whatsapp, Jonze conseguiu descrever minha vida ou o futuro dela, porque como seu personagem central minha inaptidão torna impossível que eu possa construir qualquer relacionamento com um ser humano. Meu futuro é um S.O. também, por mais nojento que assistindo o filme tenha me parecido a experiência, mas nenhum ser humano seria capaz de desejar ficar do meu lado. E isto é um fato.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Retractus

 
Retractus é o nome deminha primeira exposição que está em cartaz (se usa em cartaz para exposicão?)
na galeria do IFRN Cidade Alta (o Instituto Técnológico do Rio Grande Do Norte) até dia 30 de maio. O nome vem do latim, é o particípio passado de Retrahere, que quer dizer sair para fora. É isto o que esta exposição quer dizer. São desenhos que estavam guardados desde 2011 que agora saem para fora para encontrar o público. Para serem vistos.



O tema da exposição é a linha. Eu sempre fui apaixonado pela linha, desenhar sempre foi para mim uma mágica criada pela ponta do lápis e aquele traço que ela fazia. E, com isso, eu decidi desenhar homens. Homens para mim são o melhor exemplo para explorar a linha. Os traços de seus rostos, os músculos de seus corpos, os pêlos de suas peles são oportunidades perfeitas para fazer a linha, como protagonista, brilhar!



Além disso, praticamente como um efeito colateral, a discussão sobre homofobia também tornou-se um tema que transpassou a própria exposição. Dia 17 de maio é o Dia Internacional de Combate a Homofobia, em homenagem à retirada da Homossexualidade do rol de doenças em 1990. Esta coincidência bem vinda me fez também notar que ao colocar os desenhos de corpos masculinos na galeria eu obriguei as pessoas a verem o homem num papel reservado a mulheres: o de objeto digno de admiração.

 

Durante a história da arte recente, o corpo masculino foi distituído de toda possibilidade de beleza enquanto o belo foi associado à mulher. A exposição então discute homofobia quando reloca o homem ao lugar que atualmente é ocupado pela mulher, discute sobre o papel masculino, sobre o que é belo e obriga aquele que observa aos desenhos a enfrentar seu desconforto de encontrar beleza no homem. As pessoas que têm visitado a exposição demonstram em seu rosto o incômodo de terem que lidar com a beleza onde não acham possível existir.

 


 
PS: Todos os desenhos estão a venda e custamR$ 15.00.

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Quatro Elefantes Incomodam Muito Mais





Este vídeo me fez pensar. É o primeiro vídeo do canal Põe Na Roda, de três até agora, e fala sobre estereótipos que (graças a uma campanha que eles precisam me contar como fizeram) pipocou em todas as páginas gays do Facebook durante as últimas semanas. Minha dúvida, e talvez ela responda o porquê do vídeo ter feito tanto sucesso, é por que o estereótipo gay incomoda tanto os homens gays? Porque, convenhamos, esta é uma reclamação comum. Não é o primeiro vídeo falando sobre isso. Lembram daquele projeto tenebroso Não Gosto de Meninos que pretendia ser nosso It Gets Better e só deixou tudo pior? 
Mas façamos como Alice, comecemos pelo começo. Primeiro estabeleçamos quais são os estereótipos que o Põe na Roda levanta:

1) Barbies (me depilo, tenho barriga tanquinho, uso gola V até o umbigo, tiro camisa na balada);
2) Efeminados (falo miando, falo aloka, arrasa, só escuto Madonna/Lady Gaga, cabeleireiro);
3) Transexuais (gostaria de ter nascido mulher);
4) Promíscuos (vou dar em cima de você só porque você é homem, não esteja num relacionamento estável);

É interessante reconhecer que os Barbies (homens musculosos, depilados, que exibem seus corpos descamisados nas baladas) têm agora incomodado tanto quanto os efeminados/transexuais e o estereótipo de promiscuidade entre os homens gays, os quais são desde sempre o calo na vida de nossos homossexuais yupies, a.k.a. discretos. Estamos caminhando na segunda década do século XXI e ainda continua a batalha entre os homens gays não efeminados e os homens gays efeminados. Mas falemos de cada questão de uma vez.

I'm a Barbie girl, in the Barbie world, 
Life in plastic, it´s fantastic!

Os homens Barbies, ninguém me tira da cabeça que a origem do apelido vem da música do Acqua, já são criticados como pessoas superficiais desde que surgiram dentro de nossas boates no início da década de 1990 causando reboliço e fazendo emergir os Ursos/Bears como grupo diametralmente oposto. Como gosto de história eu sempre reconto isso: eles nasceram para se opor a imagem andrógina que era o padrão de beleza gay da Década de 1980 (para vocês terem uma ideia imaginem sempre a oposição entre eles e Cazuza, Lauro Corona, Ney Matogrosso, para dar exemplos brasileiros, mas também Freddie Mercury, Mick Jagger e David Bowie, para citar poucos). Este padrão de beleza surgiu como resposta do mercado publicitário voltado a homens gays (anúncios, primeiro, da Advocate, depois Out e outras revistas voltadas ao público LGBT masculino) à imagem da AIDS que se amarrou a seus antigos modelos. A lipodistrofia, alterações na distribuição da gordura corporal, e o hipogonadismo que reduz a massa magra, entre outras coisas, transformaram o modelo de beleza masculino/homossexual setentista e oitentista numa carta assinada assumindo que se era gay e que se tinha AIDS, dois statement que os novos yupies da década de 1990 não queriam e não precisavam fazer para se tornarem discretos membros de nossa sociedade capitalista. "Discrição" é a nova palavra-chave do mundo gay da década de 1990, junto com "Direitos Iguais" da nova militância.
No entanto, agora, quase 20 anos depois, vemos que eles não são mais o modelo de homem gay que deveríamos seguir. E isto é algo que, sem dúvida, deve-se ao movimento hipster (como falar do mundo LGBT tem sido se remeter a cultura hispter não é?). O padrão de beleza deste movimento defende homens com barba e pêlos no peito e enaltece uma vida boêmia entre cigarros e cafés e longe de academias, ou seja, os corpos magros de modelos de passarela. Oriundo da junção entre o designer, publicidade, música underground e moda criou mais um modelo apolíneo para o mundo gay que, agora como está no seu auge, tem o poder de criticar os outros que o precederam. Músculos talhados na academia não são mais tão importantes quanto uma postura blasé, afinal o carão nunca saiu de moda nos inferninhos e os hipsters só adicionaram um toque de (falsa) ironia. Roupas que pareçam únicas porque teriam sido um achado, gadgets que sejam conseguidos antes de todo mundo porque talvez ele mesmo tivesse criado, bandas que somente ele conheça porque ele frequenta os ambientes mais legais são novos símbolos de status, porque o belo hipster é aquele mais antenado, mais conectado, mais sábio do que todos que se entedia facilmente com a simplicidade da vida cotidiana dos meros mortais. Em resumo, não muda nada. Enquanto a superficialidade dos Barbies era descrita pela sua dedicação ao próprio corpo, dos hipsters pode ser encontrada na sua necessidade de parecer melhor como se estivéssemos sempre numa competição de quem pode mais.
Porém, se por um lado, os novos símbolos de status trazidos por este movimento representam um homem intelectualmente mais profundo que a imagem de plástico que o culto aos músculos e a vaidade evoca. Por outro, ele também projeta uma nova espécie de homem que se pretende menos preocupado com a aparência, menos vaidoso, menos metrossexual. O discurso hipster projeta uma nova masculinidade que resgata um modelo masculino perigoso, machista em alguns pontos, bem pouco aberto à diversidade em um sem-número de outros.

Ser um homem feminino,
Não fere o meu lado masculino.


A música que coloco aqui como subtítulo é de 1983, de Pepeu Gomes, Masculino e Feminino, e evoca um mundo pré-AIDS. Antes da explosão da doença, a cultura gay estava baseada na contra-cultura punk e pensava em destruir os modelos de família e sociedade que regiam a sociedade, entre eles as definições de masculino e feminino. Após a epidemia, as bases do mundo gay foram completamente abaladas e a influência yuppie invadiu a vida e a cultura desta população. Yuppie é uma derivação da sigla YUP, Young Urban Professional (Jovem Profissional Urbano), e descreve um conjunto de comportamentos que construíram uma geração na década de 1990. Acredita-se que as transformações que alteraram o mundo e as relações entre o indivíduo e a sociedade na década de 1980 (fim da Guerra Fria que consolida a hegemonia capitalista, AIDS que abala as bases do movimento de contestação gay, ascensão de Ronald Reagan e Margaret Thatcher e o seu boom econômico e privatizações) resultaram numa nova mentalidade focada no indivíduo e nas satisfação dos seus anseios.
Houve um abandono de ideologias que contemplavam o coletivo, o o sucesso profissional e o consumo de bens ganharam muito mais importância. Os yuppies, bem mais conservadores, deixaram de lado todas as causas sociais lançadas por hippies e punks, focaram no seu aspecto profissional e na aquisição de bens materiais (sobretudo relacionados a moda e avanços tecnológicos, como celulares e computadores). Os gays não escaparam da new wave. A militância gay deixou de questionar os fundamentos da sociedade, a família e o casamento, as definições de masculino e feminino, questionamentos que pretendiam mudar o mundo para dedicar-se a seu próprio futuro profissional e sua ascensão social como indivíduo. Inventou-se neste momento o Gay Discreto, aquele homem que vive sua sexualidade entre quatro paredes, garante a satisfação dos seus desejos pessoais e íntimos, mas que socialmente continua mantendo a fachada de heterossexual para não prejudicá-lo, principalmente, no trabalho. Ele esconde a própria sexualidade porque sair do armário é levantar uma bandeira que, segundo a filosofia da nova década, não precisa ser carregada por ninguém. Ninguém é responsável por lutar por direitos para o outro. Concentre-se em vencer na sua vida, afirmam os jovens profissionais de 1990. A raiz da oposição aos homossexuais efeminados tem um pé nessa história, e a outra no machismo que infecta homens gays.
A origem deste texto é esta pergunta: por que homens gays discretos, isto é, não efeminados, aqueles que podem esconder sua orientação sexual, se incomodam com a existência dos efeminados? Eu, consciente de toda essa história que narrei para vocês anteriormente, só consigo entender que esse incomodo exista porque os não-efeminados consideram que, de alguma forma, a existência de sua contra-parte prejudica-lhe a satisfação de algum desejo pessoal. Digamos, que a existência dos efeminados prejudique ele profissionalmente. Comentando sobre isto no Twitter, eu consegui algumas respostas que podem ajudar a elucidar a questão. Algumas pessoas afirmaram que quando um gay efeminado age de forma irresponsável, fútil, feminina (como eu disse, o machismo é um problema), se espera que todos os gays também funcionem da mesma forma. Sendo assim, como ascender profissionalmente sendo um homem gay (mesmo não efeminado) quando se espera que todos os homens gays tenham os mesmos comportamentos e o comportamento de um homem gay é igual a de uma mulher e mulheres não têm o direito de ascensão profissional? Entende a lógica que está por trás de um simples: não curto efeminados?

HOMEM GAY = HOMEM EFEMINADO 
HOMEM EFEMINADO = MULHER
MULHER = MULHER NÃO VALE NADA   
HOMEM GAY = NÃO VALE NADA

O incômodo dos Discretos se torna entendível porque nenhum deles quer passar a imagem de que não vale nada. Eu, sinceramente, os entendo, contudo também afirmo que a batalha deles está mal direcionada. Eles combatem os efeminados com intensa determinação, todavia deviam dedicar-se a combater o machismo que faz com que uma mulher seja considerada tão impura que parecer-se com ela torna um homem inferior. Não é possível vencer no nosso mundo lutando por si só, na verdade é uma ilusão nossa acreditar que nossas vitórias pertencem somente a nós, esquecendo todos que abriram caminho antes para permitir que estivéssemos ali. Por isso eu convoco todos a lutar por um mundo melhor não somente para si, mas para a comunidade, e não é preciso participar de nenhuma parada gay para isso, uma primeira (e grande) batalha precisa ser vencida antes, contra si mesmo. Combata dentro de você todo o machismo que existe. Não enxergue mulheres como seres inferiores e também não veja os homens efeminados como seres inferiores porque estes manifestam algo de feminino. Combata em si essa tendência a dizer que você não gosta de alguém porque eles têm características mais femininas, isso não é um gosto pessoal, é um preconceito. É machismo! Gosto pessoal é quando você prova e não gosta, quando você vê e sem conhecer não gosta você é apenas uma criança fazendo cara feia para os legumes no prato que sua mãe colocou. Comam, quem sabe não é saboroso.






sexta-feira, 2 de maio de 2014

O Melhor Vinho

"Eu tive um sonho, vou te contar"... 

Eu estava em uma festa de casamento, comemoramos Hímeros, o deus grego das uniões amorosas, em uma grande festa em que todos comem e bebem, estamos em um navio ancorado em um porto, e conversamos sobre arte, literatura, música e filosofia. Sou a alma da festa, rindo, com comentários bem humorados e inteligentes. Eu circulo entre os grupos, conversando com todos, sentando em mesas e conhecendo pessoas. Eu, no entanto, espero a chegada de alguém. Às vezes eu desço até a entrada do navio e fico olhando para o porto, esperando, preocupado, alguém chegar. Alguém me vê lá parado e pergunta: 
- O que você está fazendo ai, Foxx?
- Eu pedi um vinho especial para comemorarmos hoje e ele ainda não chegou. 
- Mas nós temos esse vinho na adega.
- Temos? Ah, então eu vou buscar.
Eu desço então para buscar o vinho e volto com duas caixas para a festa, porém, no meio do caminho eu caio no mar. Eu fico flutuando nas caixas de vinho, tentando, exaustivamente subir no navio, ou alcançar o porto, eu chego a pular tentando voltar, mas eu não consigo, sempre caio no mar e me agarro novamente ao meu vinho para manter-me na superfície. Eu tento gritar, pedindo ajuda, também, mas a música da festa abafa meus pedidos de socorro. Era noite, também, as trevas me envolviam.
Eu não sei quanto tempo eu fiquei ali, mas quando minhas forças estavam esgotadas (eu realmente me sentia muito cansado), a pessoa que me mandou buscar o vinho abre uma porta na base do navio, exclamando:
- Meu Deus! O que aconteceu?
Ele explica que veio me procurar porque eu estava demorando tanto, após me retirar da água, junto com as caixas de vinho que haviam se tornado apenas restos de papelão molhado. Eu estava sentado no chão, molhado e exausto. Ele me convida para voltar a festa, no entanto, eu estou cansado demais para sequer subir as escadas em espiral que levam para a parte superior do navio.

"É o que devemos saber"...

Na minha interpretação, este sonho fala da minha vida amorosa. A festa à Himeros representa a minha vida pregressa de encontros sexuais fortuitos, pegações em baladas, conquistas de uma noite, em que eu me divertia e fazia um considerável sucesso. Mas, sempre, foi algo vazio. Sempre faltou algo especial que faria aquela festa que já era incrível se tornar perfeita, o vinho que falta representa meu amor ausente.
Cansado de esperar que este amor venha até mim, no meu barco ancorado e impossibilitado de partir, eu sigo atrás dele, que traduzindo significa ter deixado Natal, a cidade em que nasci, e mudado para Belo Horizonte. Eu consigo o meu próprio vinho, isto é, meu amor próprio, mas eu não consigo voltar à festa que estava, eu caio no meio do caminho. Ou seja, eu me deparo com a dura realidade que é o mundo fora da província que eu cresci, extremamente igual! Ao mar, eu somente sobrevivo porque sou capaz de usar o vinho, isto é, o amor que eu havia trazido comigo como salva-vidas.
Mas eu fico tempo demais no mar, quando sou resgatado por alguém que finalmente nota minha ausência, o que quer dizer também que as relações que eu construí na festa eram em sua maioria superficiais porque somente uma delas notou que eu havia sumido. Fico tempo demais no mar que o vinho que eu levava torna-se somente pedaços de papelão molhado, ou seja, o amor que eu tinha foi todo consumido para me manter vivo. Nada restou mais. No entanto eu sou convidado a retornar a festa, pelo meu único amigo, e eu exausto declino do convite. Eu não conseguiria mais voltar a vida que eu tinha antes, estou cansado demais para isso.