Google+ Estórias Do Mundo: setembro 2013

Páginas

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Lar Doce Lar



Agora, na casa nova, minha vida tem sido pensar em cada detalhezinho para torná-la minha. Isto tem sido o meu passatempo mais prazeroso e ela tem tomado forma aos pouquinhos. Primeiro foi meu escritório que ficou de pé, ou pelo menos aquilo que chamo de escritório. São duas estantes com meus livros e quadrinhos, mais um bureau com meu computador e minha mesa digitalizadora; o quarto também ficou logo de pé com a cama, o guarda-roupa e uma caixa de papelão que transformei em criado-mudo com cola, fita adesiva e eucatex onde tenho minha luminária (um presente do meu pai) e deixo meu celular carregando durante a noite. Alguns posteres de moda estão presos na parede, sobre a cabeceira da cama. Mas nestes dois casos, tudo isso, eu já tinha ou da época que eu morava com meus pais, ou fiz durante minha estadia no antigo apartamento. 
Já minha cozinha tornou-se um verdadeiro desafio. Quando me pudei para minha primeira casa eu comprei um fogão (usado), ganhei de um blogayro, o Dramma, um botijão de gás e comprei um jogo de panelas, depois ganhei outro. Ganhei muitos presentes, na verdade, do meu chefe, as panelas que citei e um conjunto de espátula, concha e escumadeira; da menina do Finaceiro, escorredor de macarrão, lavador de arroz, sempre coisinhas pequenas para ajudar a montar a cozinha que não tinha nada. Mas chegando aqui, nesta casa nova que fica em uma vila, fiz uma lista do que ainda faltava e era primordial: pratos, talheres, copos, vasilhamos plásticos, jarra para água, escorredor de pratos, panos de prato, esponjas, vasilhas para mantimentos, fósforos, lixeiras, vassoura, pano de chão, todas essas coisas que antes eu usava da menina que morava comigo foram compradas uma a uma. Também me aproveitei de minhas habilidades artísticas e de minha cara de pau e me apossei de um armário de escritório que estava largado, juntando poeira na casa do meu irmão, ele se tornou minha despensa; também tomei uma estante de metal que estava enferrujando no depósito da loja da minha mãe que após uma mão de tinta branca agora guarda tudo o que eu comprei. Sem esquecer de uma estante que também era da loja da minha mãe, que desmontada, foi para debaixo da minha pia e agora guarda minhas panelas. Agora, falta uma geladeira. E, olha, tô sentindo uma falta de beber água gelada.
Na sala não tem nada ainda, apenas meu altar no chão, alguns desenhos meus pelas paredes em molduras compradas em camelôs no bairro do Alecrim, aquele que em toda cidade concentra o comércio popular, mas que dei uma mão de tinta spray verde abacate e três cadeiras (extremamente desconfortáveis) que pedi emprestado com meus pais. Ainda não sei como conseguirei preenchê-la. A ideia seria ter um sofá-cama confortável que pudesse abrigar os amigos que viessem me visitar, comprar uma tv que estaria na parede oposta, um bom tapete, com algumas almofadas, porque às vezes é bom deitar no chão, mas tudo isso sem impedir um altar no canto da parede e, se der vontade, estendermos uma rede pela sala. Mas também não temos pressa, não é? E a graça é justamente esta, ir montando devagar, escolhendo cada peça, para que ela tenha significado e história.

terça-feira, 24 de setembro de 2013

Ódio Secreto



Foxx: Oi amigo, lembra do Cafuçu lá do seu laboratório em BH? Ele vem para Natal semana que vem.
Bê: Olha, se você pegar, QUERO FOTOS...
Foxx: Oi? kkkkkkkkk Gente, como? kkkkkk
Bê: Olha, eu já tive uma conversa BEM picante com ele e conta-se que ele já foi visto pegando caras na balada.
Foxx: Eita! Sério?
Bê: Sérissimo!
Foxx: Chocada!
Bê: E mesmo que não existisse isso, como você é especialista em pegar "heteros", é um favor que você vai me fazer: pegar e filmar. Vai garantir minha siririca por uns bons dias.
Foxx: kkkkkkkkkkk
Bê: É sério!
Foxx: Eu sei que é.
Bê: Bom então... ele provavelmente vai querer dar para você, o que é melhor ainda, porque o pinto fica todo para câmera, ou seja, para mim. hahahahaha Nossa, não vou nem dormir até semana que vem. Foi ele que te escreveu?
Foxx: Sim, aqui pelo Facebook. Ele escreveu avisando que vinha para cá. Aí eu falei que posso servir-lhe de guia, já que eu estarei de férias. Eu então passei-lhe meu telefone.
Bê: Escreveu para você quer piroca.
Foxx: kkkkkkkkk
Bê: Ai, Foxxinho, nunca fiquei tão feliz com seu talento com heteros como agora...
Foxx: kkkkkkkk
Bê: Eu sempre te odiei secretamente por isso, finalmente it payed off...
Foxx: kkkkkkkkkkk Não era nada secretamente, Bê.
Bê: HAHAHAHAHAHA

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Mudei




Saí do meu primeiro apartamento. Mudei. E a todo mundo que conto a novidade vem a pergunta se algo aconteceu, se briguei com minha roommate, e a resposta é sempre não, porém eu saí antes que brigasse. Minha colega de apartamento tem um único defeito, que apesar de suas inúmeras qualidades, impossibilita qualquer um a morar com ela: a moça é de capricórnio com ascendente em capricórnio, ou seja...
O signo se manifestou na primeira semana quando uma lista de "Regras de Boa Convivência" apareceu presa à porta da geladeira, era uma série de pontos em que estava definidos coisas como lavar a louça sempre após comer, manter o balcão da cozinha limpo e nos assegurarmos de cumprir o esquema de faxina no qual eu estava responsável por limpar a casa aos sábados, enquanto ela limparia durante a semana, contudo, com o tempo, eu vi que as regras na verdade não se aplicavam a ela, somente a mim. Ela podia deixar a louça na pia por duas semanas, ela cozinhava e deixava o fogão emporcalhado, ela não fazia a faxina como havíamos combinado (eu descobri porque, desconfiado, eu deixei uma mancha num lugar pouco visível, no fim de semana seguinte, novamente meu dia de fazer a faxina, a sujeira estava no mesmo lugar...). Em resumo, as regras estavam lá para que eu cumprisse e ela, assim, não se irritasse comigo, porque como boa capricorniana, as regras são impostas para os outros seguirem, nunca eles.
Se isto não fosse um bom motivo, outro comportamento começou a chamar atenção. Um dia eu cheguei em casa e vi que ela começou a sair e deixar seu quarto trancado a chave. Notei porque ela tinha o péssimo hábito de deixar os sapatos espalhados por toda a sala, e um dia eu resolvi junta-los e colocar dentro do quarto dela, quando tentei abrir a porta, trancada. Ela desconfiava que eu pudesse roubá-la? Todavia algo mais acontecia. Um ia eu estava em meu quarto acompanhado, com a porta trancada também, quando ouvi que ela entrou em casa e, pouco depois, tentou entrar no meu quarto. Enquanto eu não podia entrar no quarto dela, que vivia a chave, ela passeava no meu como se fosse um dos ambientes comuns. E era, na cabeça dela, tanto o quarto, quantos os objetos nele: um dia pegou meu guarda-chuva sem pedir emprestado, noutro pegou uma fita adesiva, nada importante, de fato, mas que estava dentro do meu quarto e, portanto, ela precisava sim ter pedido permissão.
Porém, o que considero completamente mais grave é, sem dúvida, ela tratar mal os meus convidados. Qualquer amigo, paquera, conhecido que me visitava em nossa casa era recebido com antipatia e falta de educação. Reclamei uma única vez e ouvi: "Eu não sou obrigada a ser simpática com ninguém, muito menos dentro da minha casa!". Esta foi a gota d'água. O que estava acontecendo é que, para ela, eu era apenas um hóspede na casa que eu pagava metade das despesas, o qual devia comportar-se sobre pena de ser, a qualquer momento, expulso do lugar em que vivia. A casa da capricorniana pertencia somente a ela, eu então, como bom leonino, apenas juntei minhas coisas e em dois dias estava em outro lugar. 

terça-feira, 17 de setembro de 2013

Fenícia: A Poesia de Cartago

Porto de Cartago


Como já dissemos, Cartago era a capital do maior império fenício. Ela teria sido fundada por homens vindos da cidade de Tiro por volta do século XX antes do nascimento de Cristo, mas por volta de 814 a.C., já havia se tornado um grandioso império marítimo espalhando colônias pela norte da África, Sicília, Península Itálica, Sardenha e Espanha, existem registros que navegadores cartagineses alcançaram ainda a Portugal, Bretanha e o Atlântico Norte, onde não fixaram colônias, mas faziam comércio com celtas, bretões e vikings. No século V a.C., o império cartaginês ameaçou o controle do mediterrâneo pela marinha ateniense, e entre 264 e 214 a.C., pelo mesmo motivo, iniciaram-se as Guerras Púnicas, contra o império romano, que terminou com o território de Cartago destruído e salgado para que nada crescesse ali novamente, ou seja, Cartago foi inimiga dos principais impérios europeus da Antiguidade pelo mesmo motivo, ambos necessitavam controlar o Mar Mediterrâneo, porém este já pertencia aos fenícios.
Como um rico império, as artes se desenvolveram a contento, contudo, infelizmente, o que nos restou desses textos são aqueles a capital púnica legou de poetas que escreviam em latim (língua internacional da época do Império Romano), porém entre estes temos vários que narravam em sua poesia relações homoeróticas. Podemos citar, por exemplo, Nemessiano (por volta de 283 d.C.).
Marcus Aurelius Olimpius Nemesianus, ou somente Nemessiano, é um poeta que escrevia em latim, nascido em Cartago, por volta de 283 d.C. Fenício de nascimento, mas educado em Roma, era um poeta popular na corte do imperador romano Carus, apesar de comumente ser considerado pouco original, e escrevia poemas sobre a arte da pesca, Halieutica; sobre esportes aquáticos, Nautica; e sobre a caça, Cynegetica; deste último, no entanto, apenas um fragmento de 325 linhas foi preservado, apesar disso, seu latim é tão clássico que este enxerto foi usado como em escolas de poesia durante toda a Idade Média. Existem no entanto quatro bucólicas, poemas de tema pastoral, e um Elogio a Hércules, que também são atribuídos a ele.
É nos seus poemas pastorais, as bucólicas, que aparecem as referências homoeróticas. Nemessiano seguiu, na verdades, os passos de Virgílio (já falamos de sua falta de originalidade) com suas éclogas, que são poemas cujos personagens normalmente são pastores em forma de diálogo ou, às vezes, um solilóquio, que registram a equivalência entre o desejo sexual entre homens e mulheres e entre dois homens. Ele fala através de uma série alternada de discursos no qual Mopso, a quem Meroe solteira evita, discute com Lícidas, cujo amor o jovem Iolas despreza.
Tal comparação é extremamente comum nas pastorais, como explica João Beato. Nemessiano quem diz: "Cante cada um o que é objeto do seu amor. As canções também aliviam o males do amor"  (Ecl 4,19). No entanto, afirma João Beato, que se o amor de Mopso e Meroe se reveste dos elementos da poesia pastoril, o mesmo não sucede com o amor de Lícidas e Iolas. A diferença é que enquanto o amor entre Mopso e Meroe pode ser eterno, Lícidas e Iolas tem pouco tempo porque a beleza (formosus) de Iolas vai abandoná-lo quando sua barba crescer, pois a beleza dos meninos "é uma dádiva efêmera" (Ecl 4,27). Por fim, Lícidas aconselha: "Todo aquele que ama os rapazes, não se apresse e aprenda a amar longa e pacientemente. Não menospreze a circunspecção dos tenros anos e suporte até o fim as desventuras. Se é que algum deus ouve os enamorados em suas angústias" (Ecl 4,57-60).
Nota-se que o modelo de amor homoerótico colocado pelo poeta fenício ainda é o padrão idealizado que coloca um homem que ocupa a posição dominante como mais velho (esta posição dominante está tanto na situação de ativo na relação sexual como também na igualdade entre Lícidas e Mopso, os dois estão no lugar  masculino do relacionamento), enquanto o mais jovem está numa posição submissa e também feminina (afinal Iolas e Meroe estão na mesma posição dentro do poema, como objetos de desejo que podem ou não ceder seus favores, que precisam ser conquistados por seus amantes). É importante notar que este formato de "homem mais velho com um jovem" é considerado por todos os historiadores como um modelo-ideal, como uma situação em que este comportamento era sim considerado apropriado e que, o mesmo, também só poderia continuar (para manter-se aceitável) se o relacionamento se encerrasse aos primeiros sinais de barba no rosto do jovem Iolas. Contudo, acredita-se que apesar desta ser a regra, ela era comumente ignorada, relatos que envolvem homens mais velhos sendo passivos para jovens ou de garotos da mesma idade tendo relações sexuais também são comuns em várias outras referências, sinalizando que apesar deste modelo-ideal, os relacionamentos entre homens podiam ser bem mais subversivos.


sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Carta Para Te Entregar Um Dia




Natal, 10 de setembro de 2013.



O que posso te falar sobre o amor, meu Menino Bonito, o que posso te dizer sobre o que sinto em relação a você? Só posso contar que meu coração, antes triste e frio, se enche de alegria quando me vem teu nome. Só posso afirmar que eu sempre vou ter um sorriso nos meus lábios ao lembrar de como você estava nervoso no nosso primeiro encontro, como se eu pudesse, simplesmente, conseguir não gostar de você. Só posso cantar cada balada nova, lançada por algum banda ou cantor ou cantora novo ou conhecido, porque ela me faz lembrar de nós dois. Só posso imaginar o gosto de tua boca, cereja, e a textura macia de tua pele em contato com a ponta dos meus dedos e como você se anima quando minhas unhas te arranham de leve sobre os pêlos do peito. Só posso sentir a rigidez dos teus músculos contra a palma da minha mão ou sua respiração sobre minha coxa quando você deita a cabeça no meu colo me deixando fazer cafuné nos teus cabelos castanhos. Só posso ouvir entusiasmado tua animação contando sobre teus jogos, sobre um livro, sobre um filme ou um novo gadget, quem sabe um anime, nada vale mais do que ver seu sorriso neste momento. Só posso rir quando você me pede para fazer uma torta e aparecer lá em casa só para comê-la sentado na minha cama se lambuzando de chocolate. Só posso assumir que eu fico excitado quando você se aninha nos meus braços, se enrola dentro deles para que eu te proteja, e me chama para deitar de conchinha. Só posso ficar feliz quando você passa meses procurando um presente porque ainda não achou o perfeito para me dar, mesmo passando do dia do meu aniversário e você ainda não ter encontrado aquilo que gostaria de me dar. Só posso ficar encantado porque você criou um apelido só seu para no lugar do meu nome usar. E, por fim, eu só posso dizer que quando essas coisas acontecem eu te amo um pouquinho mais, mesmo sabendo que não é possível você me amar. 

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Sobre o Amor




Eu, particularmente, acredito que o amor só faz bem a uma pessoa. Não acredito no discurso repetido incansavelmente por adolescentes de todas as idades de que se apaixonar é sinônimo de sofrer, contudo eu reconheço que existe uma imensa distância entre o que eu entendo por amor e o que estas pessoas aprenderam nas novelas da Globo e nos romances românticos, foi inclusive o maldito Romantismo (com letra maiúscula) que destruiu este sentimento para a maioria das pessoas que se tornaram incapazes de experimentá-lo como ele devidamente é. Falta educação sentimental para as pessoas, mas isso até a Paula Toller já sabe.
Para mim o amor não é nada mais do que o ato de doar. Amar alguém é necessariamente doar algo a uma pessoa, seja seu carinho, seu cuidado, seu tempo, seus sentimentos, sua vida até, isto que significa amar. Porém uma doação só acontece, ela só existe, se for um ato que não espera retorno. Doar é, necessariamente, uma ação que envolve dar ao outro e não esperar nada, absolutamente nada, em troca. E isso, somente isso, é amor, qualquer outra coisa é uma invenção literária que vocês engoliram e acham que estão procurando algo real. Vocês procuram unicórnios quando a única coisa que temos são rinocerontes.
Mas aí você deve estar se perguntando: mas então eu não amo para ser amado de volta? Em uma palavra: não! E é no fato de você fazer esta pergunta que está todo o problema em relação ao amor que eu vejo entre as pessoas hoje em dia, elas não doam seu amor, elas investem (êta Capitalismo maravilhoso!), elas amam apenas e exclusivamente para que o objeto do seu amor lhe ame em retorno. É por isso que é tão fácil ver casais de namorados dizendo "eu te amo" ou batizando um ao outro de "meu amor", está imposição do amor num relacionamento que mal começou é somente uma tentativa de receber do outro o mesmo tratamento. Não é amor dado, é um amor cobrado.
E todo sofrimento de amantes desde o século XIX, arrisco dizer (não por acaso também nascimento do Capitalismo), se origina deste desejo egoísta de ser amado. Não é o amor que causa algum sofrimento, reafirmo, afinal ninguém que está cobrando ser amado ama de verdade, o que causa o sofrimento é a frustração de um desejo infantil. Lembro de Freud e de Buda pensando sobre isso. Freud fala sobre o ego em seu trabalho, fala como a satisfação de impulsos egóicos são características da infância e da imaturidade e quanto a supressão desses desejos causa sofrimento psíquico e físico ao indivíduo, porém é esta mesma repressão que permite a própria vida em sociedade. É a capacidade de abrir mão de seus desejos egoístas, que somente ocorre com o amadurecimento psíquico, que torna um ser humano capaz de abrir mão de si próprio pelo outro. Atos como pensar no seu semelhante (amor ágape), cuidar de uma criança (amor materno), ajudar um amigo (amor philia) ou fazer algo no sexo para dar prazer ao parceiro (amor erótico) só são possíveis graças a esta capacidade cotidianamente lapidada em nossa psiquê.
Já Buda fala sobre a dor e a frustração. Segundo o pensamento budista toda dor é oriunda da frustração de um desejo. Então quando o maldito Goethe criou um novo tipo de amor para entediada burguesia no século XIX cujo objetivo era encontrar duas almas que se amassem reciprocamente, a partir dali, criou-se um desejo que não existia antes (ser amado em retorno) e, com a existência de um novo desejo, uma série de pessoas frustradas, amarguradas e sofrendo apareceram, tempero para a vida sem graça da burguesia alemã. Acrescento inclusive que o livro do Goethe, Os Sofrimentos do Jovem Werther, causou uma onda de suicídios na Europa porque os jovens burgueses perceberam que nunca foram amados como o personagem e, portanto, decidiram extinguir a própria vida. Mas voltando a Buda e o amor: é o desejo de ser amado em retorno, que não é o amor, quando frustrado (seja porque ele não te deseja, seja porque ela terminou com você), que causa todo o sofrimento dos amantes. Arranca-lhe lágrimas e rouba-lhes noites de sono.
Todos querem uma receita para não sofrer de amor e eu dou-lhes a minha: cresçam! Saiam dessa fase infantil de seu desenvolvimento em que seus desejos precisam ser satisfeitos ou vocês reagem como crianças mimadas. O amor não lhes deve nada. E quando se apaixonarem deem, somente isso, deem amor, carinho, atenção, tempo, a bunda, só deem e não peçam absolutamente nada em troca. Eu aprendi uma única coisa com minha terapeuta que eu compartilho com vocês aqui: não é, de fato, justo dar mais do que você receber. É, inclusive, sensato, dar a pessoa que você ama a mesma quantidade de amor, carinho, atenção, etc, que você recebe dela, evita que você dedique seu amor a uma pessoa que não o valoriza, porque esse tipo de coisa realmente existe. Contudo, todavia, porém, entretanto não faça nenhum ato de carinho seja com um namorado, uma amiga ou sua mãe somente para receber o carinho de volta. Entregue-o para fazer bem aquele que você ama, não para retornar a você. Sejamos todos apenas doadores e assim, somente assim, poderemos conhecer o amor verdadeiro.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Visconde de Taunay



Estávamos na sala do meu apartamento, amigos da igreja que frequento bebiam cervejas jogados no tapete da sala, sentados em almofadas, ou estirados no sofá, bebíamos Devassa quando um deles vira-se para mim e olhando nos meus olhos diz:
- Foxx, você tem olhos lindos.
Eu sorri e agradeci o elogio.
- Sério, não estou brincando! São muito lindos mesmo!
Eu novamente sorri, sentindo um calor nas bochechas.
- E... nossa! Você se considera tão esperto, mas olha só... - e chamou atenção de todos para olharem para mim - vejam quanta inocência tem nos olhos desta criatura!
- Eu não me considero esperto...
- Mas também não acha que tem toda essa inocência dentro de você - me interrompeu ele - se acha sofrido, magoado, machucado, mas olha todo esse amor aí dentro, esse amor inocente.
Eu sorria, todos me olhavam naquele momento.
- O problema é essa barba, de fato! Ela cria uma imagem completamente diferente de você! De homem maduro e vivido, e esconde esta criança inocente que vive ai dentro.
Ele falou e tomou outro gole de Devassa.

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Fenícia: Os Servos do Rei




Moloch era o deus de Cartago e todas as colônias que esta cidade havia criado. Todos aqueles que eram descendentes dos cartagineses era também cultuadores de Moloch. Seu nome significa rei. Cartago se localizava no norte da África, onde hoje fica a Tunísia e foi um poderoso império marítimo porque controlava o estreito que existe entre a África e a ilha da Sicília, na Itália. Cartago, como várias outras culturas que existiam na costa norte da África, compartilhava uma história de acomodação do comportamento homoerótico e transgênero.
Cartago fora fundada por fenícios do século XX a.C., vindos do antigo Líbano para o Marrocos, a altura do século IX a.C, eles já havia se tornado um grande e importante império que passou a competir com o Império Romano causando as duas Guerras Púnicas que em 146 a.C., em sua última batalha, destruíram a cidade de Cartago completamente. Nesta migração eles trouxeram junto seus sacerdotes transgêneros, servos e concubinas. Sua cultura politeísta que incluía um deus supremo, Baal, e uma deusa suprema, Baalit, chamada em Cartago de Tanit, os templos desta deusa eram sempre cheios de sacerdotes cortesãos, isto é, que se prostituíam em nome da deusa, e também travestidos.
Moloch também era um deus do fogo. E a maior parte das informações sobre seu culto estão na parte judaica da Bíblia. São oito referências que proíbem os judeus e não-judeus de prestarem culto ao deus fenício. São citações como: "Não darás nenhum dos teus filhos para ser sacrificado a Moloch; e não profanarás o nome de teu Deus, Eu sou o Senhor" (Lev 18:21) ou "Todo israelita ou estrangeiro que sacrificar um dos seus filhos a Moloch, será punido de morte. O povo da terra o apedrejará. Eu voltarei o meu rosto contra ele e o cortarei do meio de seu povo, porque manchou o meu santuário e profanou o meu santo nome, dando um de seus filhos a Moloch. Se o povo da terra não se importar por esse homem ter dado um de seus filhos a Moloch, e se não o matar, eu voltarei meu rosto contra ele e contra a sua família" (Lev 20:02-04). Em Jeremias temos uma referência parecida: "Ergueram-se altares a Baal no vale de Ben-Enom, para ai queimarem os filhos e as filhas em honra de Moloch" (32:35). São basicamente citações que falam sobre a principal característica do culto de Moloch: os sacrifícios humanos e, especificamente, os que mais agradavam ao deus, o sacrifício de crianças.
Outras referências a Moloch que temos são de origem grega e latina que falam das crianças sendo consumidas pelo fogo em Cartago. Cleitarco, Diodoro da Sicília e Plutarco mencionaram a queima de crianças como oferenda ao deus também chamado de Baal Hammon. Comentaristas, no entanto, reconhecem que estas descrições são muito exageradas já que Cartago era a cidade inimiga e, engajados numa propaganda pós-guerra, era necessário fazer seus arqui-inimigos se tornarem cruéis e menos civilizados como afirmam Astin, Walbank e Frederiksen em Rome and the Mediterranean to 133 B.C..
Traduzimos, a partir da versão de Paul G. Fly, uma referência retirada do comentário de Cleitarco a República de Platão:

Não está em seu meio uma estátua de bronze de Saturno (era costume entre os romanos de traduzirem os nomes dos deuses de outros povos, Saturno será comparado a Moloch nestes textos), suas mãos estendidas sobre um braseiro de bronze, no qual as chamas engolem uma criança. Quando as chamas caem sobre o corpo, o contrato de membros e a boca aberta parece estar rindo até que o corpo desliza silenciosamente para o braseiro. Assim é que o "sorriso" é conhecido como "riso sardônico", uma vez que eles morrem de rir.

Já Diodoro da Sicília (20.14) escreveu:

Havia em sua cidade uma imagem de bronze de Saturno estendendo suas mãos, palmas para cima e inclinada para o chão, de modo que cada uma das crianças, quando colocado nelas rolava e caia uma espécie de cova aberta cheia de fogo.

É Diodoro também que relata que os parentes estavam proibidos de chorar a morte de suas crianças, porém é o historiador romano também que nota que o comum era o sacrifício de crianças de classes sociais menos abastadas, tanto que quando Agatócles é derrotado, os nobres cartagineses acreditaram que haviam ofendido os deuses e substituíram as crianças dos sacrifícios por seus próprios filhos, foram desta vez 200 crianças mortas das melhores famílias da cidade.
Em Plutarco, no Das Supertições, temos:

"... mas com pleno conhecimento e compreensão que eles mesmos oferecem os seus próprios filhos, e aqueles que não tiveram filhos iriam comprar pequenos de pessoas pobres e cortar-lhe as gargantas como se fossem cordeiros ou aves jovens, enquanto isso a mãe fica sem nenhuma lágrima ou gemido, mas se ela proferir um único gemido ou deixar cair uma única lágrima, deve desistir do dinheiro e o sacrifício do seu filho foi inútil; no entanto, toda área em torno da estátua era preenchida por um barulho de flautas e tambores que deviam abafar os gritos de lamentação, não deixando que estes chegassem aos ouvidos do povo.

Outra característica do culto a Moloch era a prostituição sagrada. Existe uma referência bíblica que fala sobre isso: "e o cortarei do meio do seu povo com todos aqueles que se prostituem como ele, prestando culto a Moloch" (Lev 20:05). Nota-se que a principal proibição judaica é o sacrifício das crianças em nome de Moloch, mas eles também citam outra parte do culto ao deus fenício: a realização da prostituição ritual em nome do deus, seja agindo como o prostituto ou prostituta ou pagando pelos serviços de um dos servos do deus. Neste caso, estes servos também podiam ser crianças que eram doadas ao templo, porém, no lugar delas serem atiradas ao fogo, estas se tornavam servos do deus, e cresciam como prostitutos do templo.
Era comum em diversas religiões ligadas a fertilidade o que é chamado de Hierogamia, o casamento mágico entre o deus e o seu fiel, isto se dava sempre através do sexo com um sacerdote ou de uma sacerdotisa ou mesmo um sacerdote transgênero. No caso de Moloch, considerado o depositário da potência masculina da fecundação, encontramos sacerdotes masculinos e transgêneros. O ritual normalmente se dava somente com a relação sexual, sobretudo anal, entre o sacerdote e o fiel. Muitos historiadores afirmam, no entanto, que tudo isto não passava de uma oferenda ao deus, que não havia prazer nenhum em pagar por este tipo de prostituição, pois ela se daria somente no contexto religioso. Não haveria uso fora desta situação muito particular para estes servos do deus.