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terça-feira, 19 de março de 2013

China: A Dualidade Taoísta




Robert Ingersoll afirma, em Sociologia do Mito, que o Taoismo tem como sua principal característica a crença na natureza cíclica do universo e suas mudanças incessantes, provavelmente inspirados no movimento dos astros e as estações do ano, tal ideia é congruente com os arquétipos do yin e yang, a definição de duas forças complementares que, opostas, fazem parte uma da outra se complementando. Afirma Ingersoll que o Taoísmo se baseia profundamente na existência de um todo único composto de duas metades entrelaçadas e opostas (o yin/yang, claro/escuro, inverno/verão, bom/ruim, seco/úmido e homem/mulher) por isso não é de surpreender que encontremos entre os mitos taoistas várias referências a personagens de sexualidade dúbia. O Tao pressupõe que dentro de toda criatura existe a complementaridade dos dois opostos yin e yang, e que as atitudes humanas devem estar sempre de acordo com essa natureza dual que forma as criaturas, sendo que os homens devem buscar o equilíbrio desta natureza yin (feminina) e yang (masculina).
O Taoismo é considerado uma religião politeísta. Suas divindades, embora unificadas pela ideia da prática do Tao (o caminho), são muitas vezes retratados como parte de uma hierarquia celestial que espelha a burocracia da China imperial. De acordo com a crença religiosa taoista, as divindades poderiam ser promovidos ou rebaixados de suas funções, aos quais eram especialmente designados. Algumas divindades também são seres humanos exaltados, heróis, que por causa de grandes ações que haviam realizado ascendiam. Sendo criaturas, os deuses também viviam o Tao e como tal possuíam em seus corpos uma complementaridade que une também o masculino e o feminino.
Um exemplo dos deuses taoístas de sexualidade dupla é o ambíguo, Lan Caihe, um dos Oito Imortais (ou Baxian) do Taoísmo, estes são heróis muito populares que representam aspectos da vida: a juventude e velhice, a pobreza e fortuna, a nobreza, cordialidade, feminilidade e masculinidade. Sua idade e sexo normalmente são apresentados de forma extremamente ambígua, não se localizando se trata-se de um menino ou uma menina, ou um homem velho ou uma jovem. Lan era um músico, de qualquer forma, que carrega castanholas de bambu com as quais marcam o tempo de seu canto e, através de sua música, também é capaz de prever o futuro. Bondoso, um dia ele recebeu por uma apresentação que estava fazendo de música e em seguida Li-Tieguai, um dos Oito Imortais, disfarçado como mendigo pediu ajuda. Lan não se recusou a ajudar e deu o dinheiro que tinha conseguido com suas apresentações musicais ao mendigo, também lavou-lhe as feridas e colocou-lhe unguentos nos furúnculos. Li-Tieguai então concedeu-lhe a imortalidade. Tornou-se padroeiro dos floristas e é responsável por fazer as nuvens ao deitar seu corpo quente e nu na neve, fazendo-a derreter e evaporar, mas sua principal função é cuidar daqueles que estão empobrecidos.
Um outro exemplo é Yu, o Grande. Este semi-deus, protetor contra as enchentes e inundações, era hermafrodita e imperador da China que teria reinado entre 2200 e 2100 a.C.. Sua lenda conta que quando  fora governador, um grande dilúvio tomou a terra. No começo, o pai de Yu, Gun, um antigo deus da terra, foi designado pelo imperador Shun para domar as águas furiosas. Em nove anos, Gun construiu barragens por todo o reino na esperança de conter as águas, mas estas colapsaram em todos os lugares e por causa do seu fracasso, Gun fora executado por Shun, mas em outra versão, Gun foi salvo pelo demônio Gong Gong, grande inimigo do Alto Governante do Universo, com o qual se associou, algumas interpretações entendem esta associação como uma relação homoerótica entre o demônio e Gun.
O imperador recrutou então Yu para suceder o pai que seguiu um plano diferente, não criou novas barragens, mas abriu canais fluviais novos que serviram para escoar as águas e irrigar os campos, alargando inclusive um canal que levaria direto ao rio Amarelo, chamada Porta de Yu (Yu-bu). Yu, apesar de hermafrodita, era casado, porém, por causa de sua batalha contra o dilúvio, ficou apenas quatro dias casado, e durante os treze anos da enchente, ele visitou a família três vezes, quando sua esposa estava em trabalho de parto, quando seu filho, Qi, aprendeu a falar e quando ele fez treze anos. Em cada vez, Yu recusava-se a passar pela porta, dizendo que a inundação deixou incontáveis desabrigados e por causa disso ele não se permitia descansar.
A principal questão é que para a religião chinesa é exatamente essa dualidade que está presente em todos os seres. O feminino faz parte do masculino tanto quanto o masculino é parte constituinte do feminino, é uma questão filosófica que se distancia completamente da construção das ideias de masculinidade e feminilidade do mundo ocidental hodierno em que separamos em classificações estanques, em que nada do masculino pode conviver com o feminino. Essa definição na China Antiga não funciona. Ser homem ou ser mulher na China não são modelos opostos de vida, em que o que um deles faz o outro também não pode fazer, são na verdade modelos complementares em que se integram formando um único indivíduo. Poderíamos dizer que na China os gêneros não são opostos, mas complementares.




13 comentários:

  1. interessante ... eu creio e de alguma forma me ligo nesta lógica filosófica ...

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  2. Sabes que também me "gustou" essa lógica filosófica?!
    PS1: O senhor enviando "saliências" por e-mail?!? #numcreio! Hahahaha!
    PS2: Homenagem, ué? Não conhece, não?! Não vais dizer que nunca me rendeu nenhuma?! #meumundocaiu!
    Hahahahahahaha! Bjs!

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    1. eu enviei saliências por e-mail? pra quem, meu Deus?!?

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    2. Infelizmente pra mim não foi! A não ser que FB conte... hahahahaha! E minha idade já tá na boca do povo mesmo... #fazeroquê? Hehehe! Bjs!

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  3. Complementares... Adorei...

    E querido quando 3 ou 4 dos sobrenomes mais conhecidos de uma cidade se encontram em um evento fechado, eu costumo chamar de um local bem seleccionado...

    Sabes como Sou né?

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  4. gente... realmente, agora faz sentido..
    bj foxxx

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  5. A cultura chinesa é bem interessante. Mas acho que mais importante que isso, é usarmos como exemplo para comprar com nossa realidade ocidental e refletir um pouco mais se é o melhor caminho...

    Beijos canadenses, Foxx...

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    1. A ideia é exatamente essa, Júlio, que a partir dos exemplos de outras culturas possamos questionar a nossa e notar como aquilo que consideramos natural, como a divisão entre homens e mulheres em outras culturas nem sequer existe. Acredito que a História (ciência e disciplina) só tem essa dever na vida humana: demonstrar o quanto aquilo que nós acreditamos como natural foi algo inventado em dado momento de nossa passagem sobre o planeta.

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    1. que bom que gostou! =) é sempre bom saber disso.

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  7. Com certeza, Foxxito... tinha muita coisa bacana na obra do Emílio! Boa quinta, Raposudo! Bjs!

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  8. Uma das características mas marcantes do pensamento chinês, é a grande utilização de sua simbologia. Muito anterior ao período Taoista, mas que é absolvido por este.
    É interessante que, as representações das divindades chinesas que chegaram até os nossos dias, estão sempre relacionadas com símbolos que indicam essa complementariedade. Tanto os símbolos do reino animal, vegetal ou mineral que, hora indicam um aspecto ‘masculino’ ou ‘feminino’ ou mesmo os símbolos fantásticos como o dragão e a fênix. E mesmo os lugares de culto – no caso dos Imortais, nas grutas das montanhas – que possuem também essa ambivalência.
    Pena que no ocidente, se perdeu muito dessas características com o passar dos séculos, ainda que, nas origens, elas estavam presentes.

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    1. menino, esse homem fala bem sobre tudo. benza Deus. Mas não gosto de usar a ideia de que o Ocidente perdeu coisas que estavam na origem. Quem disse que estavam? E se o ocidente foi sempre assim? Nem sei responder, mas pressupor que o passado era melhor também não é uma boa política sabe?

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" Gosto de ouvir. Aprendi muita coisa por ouvir cuidadosamente."

Ernest Hemmingway