Google+ Estórias Do Mundo: junho 2011

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terça-feira, 28 de junho de 2011

Mesopotâmia: O Amor de Gilgamesh


Começar pela Mesopotâmia faz um certo sentido. Pelo menos para mim. É no vale dos rios Tigre e Eufrates, acreditam os historiadores, que o homem abandonou as suas migrações constantes e se fixou, finalmente, para formar aquilo que chamamos de cidade hoje. Todavia não estamos com isso afirmando que as relações homoeróticas não existiam antes da invenção da cidade, contudo, infelizmente não existem registros históricos que nos permitam localiza-los e reconhece-los. É exatamente a invenção mesopotâmica da escrita, fruto de uma necessidade da própria cidade, que permite que encontremos registros históricos de relações homoeróticas. Podemos inclusive mencionar o poema épico, a Epopeia de Gilgamesh
A Epopeia de Gilgamesh é um poema sumério, para ser mais preciso. Um dos grupos étnicos que habitavam a  Mesopotâmia, sobretudo no sul da região, a Suméria. A atual forma do poema é oriunda de uma copilação de poemas em torno do rei-herói Gilgamesh reunidas pelo rei Assurbanipal, entre os séculos VIII e VII a.C. As narrativas contidas na epopeia deviam ser muito populares, sendo que as primeiras versões datam ainda do Período Babilônico Antigo (2000-1600 a.C). E giram em torno da relação entre Gilgamesh (um rei lendário, o quinto rei de Uruk, da primeira dinastia após o Dilúvio, e teria vivido entre 2750 e 2600 a.C.) e Enkidu, um homem criado pelos deuses como um equivalente ao rei-herói, para distraí-lo e evitar que o herói oprimisse os moradores da cidade, que estavam descontentes com a arrogância e a luxúria do rei. O amor, então, entre o herói e o homem é a matéria do livro mais antigo da literatura mundial.
Enkidu é então criado pela deusa Aruru do barro e feito a imagem e semelhança de Anu, o grande deus sumério. Ele é criado inocente, vivendo nu, entre os animais, longe da malícia da civilização. Ao saber da existência de tal homem, o rei incubiu uma das prostitutas sagradas do templo de Ishtar, a deusa do amor, a seduzir Enkidu e trazê-lo para a cidade. Seduzido, o inocente Enkidu tornou-se conhecedor da malícia do ser humano e "perdera sua força pois agora tinha o conhecimento dentro de si, e os pensamentos do homem ocupavam o seu coração".
O livro começa com o clamor do povo de Uruk no qual se conta que a luxúria de Gilgamesh não poupa uma só virgem, nem a filha do guerreiro, nem a esposa do nobre, para evitar então isso que Enkidu é criado, e ao sonhar com ele, é assim que o rei-herói toma consciência da existência de Enkidu, o rei diz que este exercia sobre ele uma atração semelhante ao que exerce o amor de uma mulher. No capítulo I, fala a mãe de Gilgamesh, a deusa Aruru, decifrando-lhe o sonho: "Esta estrela do céu que caiu como um meteoro (...); eu a criei para ti, para estimular-te como um aguilhão e te sentiste atraído como que por uma mulher. Ele é um forte companheiro, alguém que ajuda o amigo nas horas de necessidade (...). Ficarás feliz em encontrá-lo; vais ama-lo como uma mulher e ele jamais te abandonará".
Após o encontro e a imediata paixão que ambos sentem, Gilgamesh e Enkidu vivem uma série de aventuras que passam a desagradar os deuses, e como castigo a vida dada a Enkidu é retirada. O lamento deste é comovente no capítulo III: "Enkidu jazia estendido diante do amante. Suas lágrimas vertiam copiosamente e ele disse a Gilgamesh: Oh, meu amado, és tão querido por mim e eles no entanto vão tirar-me de ti. Ele tornou a falar: Devo sentar-me a entrada da casa dos mortos e jamais tornar a ver com meus olhos meu querido irmão". Com a morte, momento decisivo na epopeia, após uma canção (que deveria ser repetida por poetas em todas as cidades sumérias) em que o rei lamenta a morte do amado nas seguintes palavras:  "ouvi-me homens ilustres de Uruk, choro por Enkidu, meu amado, com lágrimas pungentes de mulher aflita, choro por meu irmão, Enkidu, meu companheiro (...)", sai Gilgamesh em busca da imortalidade, isto é, o rei busca tornar-se um deus, procurando a ajuda de Utnapishtim, o único homem a sobreviver ao dilúvio graças a intervenção do deus Ea, que ordenou-lhe que construísse um barco onde ele deveria salvar os seres viventes.
É, definitivamente após a morte de Enkidu, que as demonstrações do afeto de Gilgamesh por ele aumentam. No capítulo III ainda, temos a seguinte narração: "Gilgamesh tocou o coração de Enkidu, mas ele já não batia, seus olhos também não tornaram a abrir. Gilgamesh então cobriu o corpo do amigo com um véu, como o noivo cobre a noiva. E pôs-se a urrar, a desabar sua fúria como um leão, como uma leoa cujos filhotes foram roubados. Vagueou em torno da cama, arrancou seus cabelos e os espalhou por toda parte. Arrancou os magníficos mantos e atirou ao chão como se fossem abominações". No capítulo 4, o rei-herói diz: "Chorei por ele dia e noite e me recusava a entregar seu corpo ao funeral. Pensei que meu pranto fosse trazê-lo de volta. Desde sua partida minha vida deixou de ter sentido".
É o amor do rei sumério pelo seu companheiro, amor este forte o bastante para fazê-lo desafiar os deuses, a matéria do primeiro livro já escrito, contudo, não podemos considerar que em toda Mesopotâmia os relacionamentos homoeróticos tivessem o mesmo valor que a capital cosmopolita suméria. Mas isso fica para o próximo texto.





sexta-feira, 24 de junho de 2011

"Orgulho Hétero"

Neste último dia 22 de junho, entre os tópicos mais comentados no Twitter estava o Orgulho Hétero, tudo por causa da proposta do vereador paulista (e pastor evangélico) Carlos Apolinário (DEM) que pretendia criar o Dia do Orgulho Heterossexual para o terceiro domingo de dezembro. O proposta não passou pelos vereadores da cidade de São Paulo, pois o projeto foi barrado pelo líder do PT, Ítalo Cardoso, ao pedir a suspensão da sessão.  Apesar do bom comportamento petista, a Câmara paulista queria na verdade evitar um mal estar com a aprovação deste projeto exatamente na semana do orgulho gay, que antecede a Parada do Orgulho Gay de São Paulo.
No entanto, no Twitter, a questão continuou. Inicialmente, a maioria dos usuário acreditou que se tratava de uma piada, afinal a parada paulista está para acontecer daqui há alguns dias e estamos no Brasil, onde tudo termina em pizza, impunidade e piada, não é? Contudo, quando eu o vi lá, senti um arrepio mortal perpassando minha alma (o mesmo que sinto agora enquanto escrevo este texto, talvez o mais difícil que eu já escrevi aqui). Meu asco aconteceu por causa da argumentação tortuosa e perigosa que as pessoas expuseram ao se manifestar a favor do projeto de lei do vereador democrata.
Desde as argumentações de fundo religioso: 


Deus criou HOMEM e MULHER. Orgulho Hetero.





Também a argumentação da tal Heterofobia, inventada pelo Deputado Federal Jair Bolsonaro:


 



Contudo, a argumentação mais comum é o fato de não entender porque ter um "Orgulho Hétero" é por si só uma manifestação de homofobia. Porque a simples manifestação desta ideia é tão ofensiva. Eles comentaram sobre isso também.
  




Esta ignorância é pior do que toda a homofobia com a qual terminarei este texto (aguardem!). Porque estas pessoas simplesmente não tem absolutamente nenhum conhecimento sobre história, política ou como funciona a sociedade em que eles vivem. Existe uma palavra para falar isso: alienação! "Orgulho Hétero" é tão homofóbico quanto "White Power" e "Consciência Branca" é racismo! Então, deixa explicar primeiro o que significa o "Dia da Consciência Negra". Este é comemorado no Brasil, desde 1960, no dia 20 de novembro (dia do assassinato de Zumbi, no Quilombo dos Palmares) e ele é dedicado a reflexão sobre a inserção do negro na sociedade brasileira, isto é, dedicado a tomada de consciência de que os negros fazem parte da sociedade e tem direitos iguais. O Orgulho Gay já foi "projetado" para resgatar a auto-estima de uma parcela da sociedade que é costumeiramente humilhada no dia-a-dia, a parada gay, e repito o que sempre digo aqui, a parada deve ser sim uma festa porque ela é um momento de celebrar, com orgulho (pride), aquele que você é. As paradas de orgulho foram feitas para dizer a sociedade heterossexual que os gays não tem vergonha de ser quem são. 
Por isso, "Orgulho Hétero" não passa de uma falácia discursiva que prega uma igualdade, mas que na verdade apenas reforça uma submissão de um grupo - que agora adotou um discurso de minoria - para poder lutar, não por seus direitos, mas contra a obtenção de direitos pelo grupo oprimido. Sabendo um pouco de história é possível reconhecer que este discurso já foi usado mais de uma vez. Quando o racismo foi combatido nos Estados Unidos e África do Sul, por ex, os brancos utilizaram exatamente os mesmos argumentos de que se os negros tem direito a um Black Power, eles também teriam o mesmo direito; quando recentemente foi aprovada a Lei Maria da Penha, que penaliza mais gravemente os ataques a mulheres além de uma simples agressão física, deputados brasileiros afirmaram que haveria uma ditadura feminina a partir da aprovação da lei, o poder do macho sobre a fêmea, assim como Deus ordenou, estava ameaçado. 
Todavia, se alguém ainda não acredita que se trata de homofobia, veja abaixo:

os gays que são contra nosso movimento é simplesmente por medo \o/ ORGULHO HÉTERO

Orgulho Hétero, o orgulho do Anus intacto o/

Orgulho Hetero \o/ os bons são maioria u.u

 

@ 



E agora eu fico com medo de sair a noite. Muito medo de sair a noite e ser espancado por um idiota qualquer que acha que tem direito em escolher se eu tenho ou não o direito a viver. 

terça-feira, 21 de junho de 2011

Novos Sonhos




Sebek: Você precisa aprender a reamoldar seus sonhos...
Foxx: É, eu também acho. Só não tenho mais sonhos agora. É uma fase de transição, né? Estou abandonando um sonho que descobri impossível!
Sebek: sim, logo vao nascer sonhos novos, como comprar uma casa, ter seus amigos novos sempre perto quando eles puderem te visitar, ter um emprego estavel, ter seus discos e livros...
Foxx: aham...
Sebek: ... e lutar por ti mesmo. Você pode ser bonito, causar furor onde passa, fazer varios terem tesao por ti, algo tipo um principe nordico.
Foxx: Como assim "eu ser bonito"? Oi? Ahnnn? Não entendi.
Sebek: Pode sim, só investir em um pouco de músculos, afinal você nao é feio, só precisa de um pouco de músculos e o resto de autoestima.
Foxx: Por favor, Sebek, eu não quero isso, não quero alguém que vá gostar de mim porque eu tenho músculos.
Sebek: Não, eu estou falando que você precisa investir na sua  imagem, independente de gostarem de você ou não. Você precisa se amar na prática!
Foxx: Não, eu me amo e me cuido, sinceramente não entendo porque alguém pode achar que eu não tenho autoestima. Só porque eu digo que ninguém se interessa por mim? Não é porque eu acho que sou desinteressante, é porque eles acham que eu sou, e me revolto porque eu discordo deles completamente. Além disso, não vou me matar numa academia só pra cumprir um ridiculo padrão que eu não concordo, nem acho bonito e nem minha genética permite sem uso de "aditivos".
Sebek: Nem eu, eu so ofereci idéias...
Foxx: Sim...
Sebek: Que seja...
Foxx: Vou dedicar-me a perder minha barriga, mas apenas isso... minha autoestima DEFINITIVAMENTE não é um problema! Eu me olho no espelho e me acho gostoso, bonito e tudo mais, me irrita profundamente é que ninguém mais vê o que eu vejo. Repito: as pessoas acham que porque eu digo que ninguém me acha interessante eu estou dizendo q eu não me acho e é exatamente o contrário, eu me acho, eles não! O que é errado! ERRADO!!!
Sebek: Entendo, o que você precisa é dedicar-se a ser feliz sendo você mesmo... e sem depender de ninguem.
Foxx: Mas assim... me dedicar a apenas minha vida acadêmica e posses materiais é tão vazio para mim...
Sebek: Entao faça algo pelos outros, já que isso te faz tão bem, porque não abre aquela ong que você me contou a idéia... aquela para os meninos gays que sofrem com seus pais... já teria um objetivo pelo qual viver.
Foxx: Boa idéia! Mas eu teria que aprender a fazer isso...
Sebek: Ora, existem cursos... aqui em Sampa tem de graça, que dão suporte para abrir ongs e tem os via internet também. Dr. Lenin Soares, presidente da ONG GSBHP (Garotos que sofrem bullyng homofobico dos parentes e amigos).
Foxx: Eu tinha te falado sobre nisso né? Juntar psicologos para dar consultas grátis aos pais e as crianças, e também um espaço de convivência entre os adolescentes... aulas de teatro e artes, dança também, um coral gay, falta dinheiro para isso. E não sei como faz pra conseguir.
Sebek: Entao... já tem o que fazer... pensa nisso com calma, arquiteta seu projeto e vou ver se consigo ver esse curso de como montar ong pra você tipo a distancia, pode ser?
Foxx: Aham...
Sebek: Ótimo, já tem pelo que sonhar.
Foxx: Preciso assumir para os meus pais primeiro e, para isso, ser financeiramente independente deles. Tarefas a fazer agora:
1) emprego estável
2) assumir para meus pais
3) a ong












Samuel Bryan: Olá Foxx, boa noite!
Foxx: Oi, meu príncipe! Tudo bom?
Samuel Bryan: E como você esta?
Foxx: Ah, estou bem melhor do que eu estava durante a semana! Estou começando a perceber que eu posso construir outros sonhos na minha vida, já que os que eu quis até agora não vão se realizar
Samuel Bryan: Bom saber que você está melhor, você me preocupa às vezes, mas eu fico de mãos atadas, eu não sei como te ajudar, não sinto como posso
Foxx: Agradeço a preocupação, mas saber que você está próximo, que posso conversar se precisar, já vale a pena! Muita gente tem me abandonado nesse momento. Eu estava mal mesmo, Samuel, de verdade.
Samuel Bryan: Eu sei, eu vejo. Mas é como eu mesmo admito, eu sinto que não sou capaz de te ajudar, te conheço já há tanto tempo, mas você está numa fase muito aquém do que eu posso ir.
Foxx: É, você me conhece há bastante tempo, sabe que eu não era assim tão desesperançoso...
Samuel Bryan: Não era mesmo! Você perdeu muito sua alegria de viver! Isso me assustou!
Foxx: Sim, exatamente isso! Eu não tinha mais um motivo para sentir felicidade. Mas eu tow começando a pensar em outras coisas, já que amor não vai acontecer MESMO. Hoje eu criei novas coisas a conquistar... hoje eu comecei a preparar planos... fiz uma lista:
1) ser professor universitário;
2) me assumir pra meus pais;
3) criar uma ong pra ajudar crianças/adolescentes que são ameaçadas pelos pais porque são gays;
decidi focar minha vida nisso...
Samuel Bryan: Mas seu objetivo com o doutorado já não era ser professor universitário?
Foxx: Sim, contudo o que eu estou dizendo é que vou me focar nisso agora, APENAS NISSO. Ser professor, meu pais e evitar que se formem mais pessoas com meus problemas no mundo.
Samuel Bryan: Isso é muito bacana! Mas eu não sabia que seus pais não sabiam de você... achava que eles sabiam faz tempo...
Foxx: Não, eles sabem, mas eu não disse, entende? Afinal eu apanhava por ser gay...
Samuel Bryan: Entendo... é... isso é pessimo para construir o caráter...
Foxx: Nada, como diz o pai do Calvin, é ótimo para construir o caráter, é ruim para construir a vida emocional. Então vida emocional eu vou matar... quer dizer pra matar tinha que existir algo né?

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Cheirou Uma Carreira de Pó

Cheirou a carreira de pó com a nota de cinquenta reais daquele amigo passageiro que conhecera num bar próximo ao seu apartamento. Cheirou a carreira que havia sido separada com seu cartão, o cartão da poupança da Caixa Econômica Federal que abrira quando fora contratado em seu primeiro emprego. Cheirou a carreira, uma entre várias, expostas no vidro da mesa de centro daquele apartamento que alugara com dois amigos gays como ele. Cheirou a carreira e com o dedo buscou os grãos que sobraram e espalhou pelas suas gengivas para deixar, além de sua alma, seu dentes dormentes. Cheirou uma carreira e tomou um copo de cerveja enquanto aprendia o sotaque britânico da namorada do amigo passageiro que conhecera no bar. Cheirou uma carreira de pó e não percebeu que o sol já nascera há tempos, pois as cortinas estavam cerradas, pois o amigo passageiro conhecia alguém no outro prédio e não queria ser visto ali, no apartamento de três viados, mas de qualquer forma já era quase meio-dia. Cheirou uma carreira pouco se importando com as consequências sociais daqueles três jovens, sentados no chão da sala, terem encomendado o pó pelo telefone. Cheirou aquela carreira de pó como se sua vida dependesse disso. E dependia, a sede de experiências que ele necessitava, experiências como aquela, eram o que lhe movia, e só elas podiam acabar com aquela parca e ressecada vida que ele achava que vivia. 

terça-feira, 14 de junho de 2011

Chocolate, Vinho e Marylin

Chove lá fora, as janelas vibram com força, com o vento chicoteando as gostas de chuva contra o vidro. Chuva essa inesperada em Belo Horizonte, afinal só deveria chover agora de novo em dezembro, mas a previsão do tempo havia avisado. Eu comprei chocolate, mais cedo, chocolate com castanhas de caju, o que mais gosto, porém do mais barato, não posso fazer grandes extravagâncias, só das pequenas. Tive que passar no shopping e aproveitei e me fiz esse pequeno mimo. Uma barra de chocolate. Também peguei a garrafa de vinho que deixei resfriando na geladeira, comprei para o Bobtuso, mas não chegamos a nem tocar nela. Vinho tinto, nacional, da serra gaúcha, seco e nada saboroso. A taça de vidro vem para o quarto, junto com a garrafa. Na bandeja,  chocolate e vinho. Deito na cama, no meu colchão que repousa num estrado no chão, e uma colcha amarela embaixo de um edredom laranja, tudo coberto por uma manta xadrez me protegem do frio que faz do lado de fora. No computador já roda O Pecado Mora Ao Lado, com Marylin Monroe e Tom Ewell, o famoso filme em que o vestido da loira Marylin é levantado pela "brisa do metrô". Os quadrinhos coloridos antes de revelar o título em inglês, The Seven Year Itch, já são exibidos na tela quando me aninho. Ouço Marylin com sua voz doce dizer que tudo é just elegant, na dúvida se toma um gin com soda, com água tônica ou com vermouth e revelar, ao decidir-se pelo espumante, que é melhor sair com os homens casados, porque estes nunca irão te pedir em casamento, evitando problemas futuros, exatamente porque já são casados. Também me canso da comédia física de Tom Ewell antes de terminar a segunda taça, mas sorrio, lembrando do passado, quando ele afirma, categoricamente, que ninguém é ciumento se tem um marido fiel. E, relaxo, quando imagino que estas podem ser as minhas noites solitárias de agora em diante. Tenho que ter então um kit guardado em casa: chocolate, vinho e Marylin. 

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Terapia de Dia dos Namorados

É um fato que eu tenho uma necessidade (quase) patológica de companhia, que estar sozinho para mim é uma tortura, apesar de não ser uma fobia. Incomoda, realmente, contudo não impede que eu realize tarefas cotidianas, e impediria mesmo já que passo a maior parte do meu tempo completamente sozinho, mas acredito que esta seja a fronteira que torna isto uma característica da minha personalidade e não uma doença. Mas por que sou assim? Isso é simples de responder.
Sempre acreditei que minha família não me aceitava. Dado as situações que fui exposto desde muito pequeno. Surras, ameaças (inclusive de morte), vários tipos de bullying, eu enfrentei dentro da casa dos meus pais, de meus irmãos, de meu pai, de minha mãe. Minha casa não era o ambiente seguro que eu precisava para crescer, minha família nunca demonstraram ser as pessoas que me apoiariam em qualquer momento da minha vida, por isso, eu projetei para fora daquele ambiente a busca por aceitação e proteção.
Procurei por amigos, tentei remontar neles a família que eu não tinha; mas sobretudo procurei ser amado. Dei uma importância a isso que realmente, e tenho consciência disso, ela não tem na vida de ninguém. Contudo, ao ser criado basicamente como um órfão de pais vivos, eu esperei poder encontrar um dia alguém que me permitisse escapar daquele ambiente que era, no mínimo, perigoso para mim. Projetei essa busca então como a grande finalização! The big happy ending! Que, não por acaso, também seria quando a minha formação intelectual e profissional estivesse completa. 
Agora, eu chego ao final da minha formação. O doutorado está se encerrando, daqui a no máximo seis meses eu serei um professor doutor, isso abrirá inúmeras possibilidades de concursos e eu vou poder ser o professor universitário que sonhei aos dezessete anos (e eu chego aos meus trinta anos também agora em agosto). Contudo, ao mesmo tempo, nada do que eu planejei para minha vida social e amorosa chegou a se esboçar. Não tenho amigos ao meu lado, os poucos que eu consegui vivem a distantes quilômetros e eu só tenho acesso a eles pela internet ou por telefones; e nem preciso dizer que minha vida amorosa é um fracasso tão retumbante que se torna praticamente ensurdecedor.
Por isso, exatamente por isso, tenho me sentido tão mal ultimamente. Vejo meus planos, meus sonhos, esvaindo-se rapidamente pelos meus dedos e não consigo, absolutamente não consigo, fazer algo para evitar. Simplesmente só consigo ficar parado esperando pelo pior. Esperando por voltar a Natal e ver meu maior medo de se realizar: tornar-me um homem cínico e amargurado porque meus sonhos simplesmente foram esmagados. Não quero ser o professor mal-amado do qual comentarão. Mas não sei mais como evitar porque simplesmente toda fé, toda esperança, se esvaiu. Não que eu ache que eu não mereço, eu mereço sim ter todos os sonhos que eu sonhei. Porém, infelizmente, eu não acredito mais que qualquer um deles: os amigos ao meu redor, alguém que me ame, qualquer um deles, possa acontecer. Os sonhos morreram.
Agora me resta aprender a lidar com isso. Com toda essa decepção que tomou meu coração e fraquejou meus braços. Antes que a decepção se torne cinismo eu preciso transformá-la em outra coisa, mas não sei o quê. Não sei. Chego ao fim dessa estrada com meus planos e sonhos esmagados, e agora me vejo olhando para o vazio sem enxergar absolutamente nada pelo qual lutar. Meu problema no fim é apenas este: eu não tenho mais pelo quê lutar. 

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Luto

Não consigo evitar não vê-lo nas sombras quando desligo a luz do quarto, parece cocaína, no entanto, é só tristeza, juro. Vejo, quando deito, e olho para o teto, ele tomando forma entre os livros, nas paredes, na luz filtrada que entra pela cortina, atrás do aquário. Consigo vê-lo acima dos meus ombros enquanto caminho pelas sombras do corredor impaciente e indeciso. Não deixo de vê-lo e às vezes o que eu vejo, quase ninguém vê. 
Não consigo deixar de sentir sua falta. O que há de errado comigo? Ele que morreu jovem honrando as músicas que gostava de ouvir quando se sentia triste. Não consigo não sentir falta das tardes que passamos juntos em que ele me concedeu sorrisos e esperanças. Não consigo não sentir sua fala ao meu lado, dos únicos momentos, com ele, que eu me sentia capaz de conseguir o que queria. Já você acha que sabe, mas você não vê.
Mas ele morreu. São só palavras, dirá você, teço, ensaio e cena. Arrancado do meu peito, ele morreu se afastando do abismo. E jaz agora enterrado em um túmulo sem nome, pois fora encontrado na sarjeta de uma rua qualquer em Belo Horizonte, parcialmente roído. Eu sei que alguma coisa aconteceu, pois ao morrer ele levou junto minha esperança de dias melhores e a capacidade de sonhar. Está tudo morto e enterrado agora, sabe?

terça-feira, 7 de junho de 2011

Incrível Mesmo

- Olá, sr. Foxx!
- Oi, seu lindo! Tudo bom?
- Adoro você me chamando de "seu lindo".
- Ora, você é lindo, tenho que falar mesmo. Tudo bom contigo?
- Tudo! Chegou ontem do Mineiro que horas?
- Acho que saímos de lá por volta de 1h da manhã. O Bobtuso tinha que pegar o voo muito cedo. 
- Ah tá! Ele é de Natal é?
- Sim, veio me visitar neste fim de semana. 
- Tenho que falar viu: uau!!
- Uau?
- É, uau! Ele é lindo, interessantíssimo...
- ...
- Teria ficado muito fácil com ele...
- É, ele é incrível mesmo! O Bobtuso é uma das pessoas mais incríveis que tive o prazer de conhecer. Mas eu falaria o mesmo de todos os meus amigos. São todos interessantíssimos para dizer a verdade. Você, inclusive.
- Ow, querido, obrigado...
- Mas porque você não fez nenhum movement?
- Ah, porque o Bill também ficou interessado nele. E eu preferi não disputar com meu amigo, sabe?
- ... seu amigo também ficou interessado pelo Bobtuso?
- É!
- ... os dois?
- É!
- Não é de surpreender! O Bobtuso é incrível mesmo! 

quinta-feira, 2 de junho de 2011

O Segundo

Os meninos pulavam na água quente que abraçava seus corpos imberbes. Meninos que moravam naquela praia no fim de semana e desciam a rampa que dava-lhes acesso a areia e corriam para a água salgada de abraços abertos como quem abraça saudoso um amigo. O mar de Santa Rita devolvia-lhes o abraço e encobria os corpos que retesavam no primeiro contato, mas relaxavam em seguida, quando finalmente seus cabelos se cobriam de sal. O sol, que brilhava distante, era o único a observar aquela praia deserta e os dois meninos que nadavam agora em direção as profundezas. Os músculos tensos das braçadas, as nádegas e as coxas rijas da natação eram os motores que os levavam para mais fundo. Nadavam até ficarem cansados e aí subiam em uma das jangadas ancoradas quando a maré estava baixa. Subiam naqueles pedaços de madeira flutuantes, presos com cordas grossas ao fundo inalcançável por eles, afinal meros meninos. Subiam impulsionados pelos braços cansados e ajudados pelo mar amigo, e deitavam na madeira levemente apodrecida por ser constantemente molhada, seus corpos também molhados e inocentes. Aquele frágil pedaço de madeira chegava a distâncias, mar a dentro, que só figuravam na imaginação fértil daqueles dois meninos, os mais velhos dos filhos de duas famílias amigas, os caçulas tinham medo do mar. Deitavam, olhando para o céu, sem se verem, apenas advinhavam a presença um do outro, enquanto a jangada balançava e o mar os ninava, alimentando sonhos. Sonhos diferentes, com certeza, porque quando se erguiam, um, sentava-se a borda, olhando a terra, com água pelos joelhos; o outro subia no pequeno banco preso a pregos aquela madeira e olhava o horizonte distante. Eu era este segundo.


(Post inspirado neste post aqui do primo Lobo)