Google+ Estórias Do Mundo: As Almas de São Bartolomeu - Capítulo V

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

As Almas de São Bartolomeu - Capítulo V

, em Natal, RN, Brasil



Alexandre estava caminhando pelas estradas arenosas da Cidade do Natal carregando seu tabuleiro, coberto com o pao branco de algodão cru que o cobriu quando nascera, cheio dos quitutes que agora sua mãe produzia na casa as beiras do Tiçuru quando passou em frente a casa da senhora Anna Marceline Wilherrn, que morava atrás da matriz, apelidade de Hamburguesa pela cidade porque nascera em Hamburgo, na Alemanha. Ela estava a janela, aproveitando a luz para fazer bordados quando Alexandre chegou ao portão de baixo.
            - Algum biscoito de polvilho hoje, dona Hamburguesa?
            Ofereceu o mulato.
            Ela sorriu e colocou seu bordado de lado e levantou-se. Caminhou lenta até a janela e sorriu entre as trepadeiras bem cuidadas do jardim.
            - Tem alfinim hoje, Alexandre?
            - Temos sim senhora, madama.
            - Então me espere um pouco, neguinho.
            Alexandre ouviu o farfalhar das saias descendo as escadas. Ela chegou com uma bolsa pequena, de onde tirou uma moeda e colocou na mão do vendedor.
            - Meu filho chegou de Recife. Meu amado August. E ele adora alfinim.
            Alexandre sorriu e enquanto baixava o tabuleiro lembrou-se há quanto tempo não via August pela cidade. Não que fossem amigos. O menino loiro e de olhos verdes, alemão, frequentava a Igreja da Matriz, a escola e remava no rio Grande. O mulato caminhava pelas areias quentes, ia ao Rosário e se banhava no Tiçuru. Mas a cidade dos reis era pequena e era impossível não conhecê-lo.
            Mas quando ele passou o pequeno pacote de biscoitos para a senhora alemã, e August apareceu a porta do palacete buscando sua mãe a surpresa não pode deixar de ser sentida.
            August crescera. Era agora um homem alto e musculoso. As remadas no leito do rio dos camarões deixaram-no com costas largas, peitoral forte e braços grandiosos. Usava uma camisa fina de cambraia e suas calcas negras quando apareceu na porta. Praticamente nu.
            - Menino, vá vestir-se!
            Gritou Anna.
            - Onde a senhora deixou minha casaca?
            Respondeu ele, com um sorriso que enrubesceu Alexandre.
            - Em cima da sua cama!
            Disse a mãe.
            - Não encontrei nada lá.
            Respondeu o filho.
            - Esses meninos... – disse Anna dirigindo-se a Alexandre – obrigado pelos biscoitos!
- Tenha um bom dia, dona Anna.
- Tu também, Alexandre.
E virou-se subindo as escadas. August esperava em cima dos últimos degraus pela mãe, abotoando os ultimos botões, escondendo os pêlos do peitoral, quando ela chegou ao seu lado, o último botão do colarinho foi fechado.
O movimento das mãos de August foi acompanhado pelos olhos de Alexandre que mesmo continuando sua caminhada para vender os quitutes de sua mãe não conseguia desgrudar os olhos do filho pródigo natalense. Viu o jovem alemão apoiar a mãe para entrar dentro de casa e, antes de entrar, olhar ao redor e ainda encontrar os olhos com os dele. Uma eletricidade percorreu seus olhares quando eles se tocaram, mesmo tão longe, principalmente quando August sorriu e um arrepio atacou a nuca do mulato. Quando a porta foi fechado, Alexandre estava arrebatado.
            Mas ele não sabia ainda. Não sabia que cometera este pecado nefando. Alexandre era inocente, isso com certeza era. Passou a passar na casa da Hamburguesa todos os dias e oferecer a ela o alfinim que ela comprava quase todos os dias para o filho. Mas nem sempre August estava em casa para ser contemplado pelos olhos de meu pupilo.
          Um dia, em confissão, Alexandre contou-me como se sentiu abalado quando encontrou o jovem Wilherrn na Ribeira. Havia caído do caiaque que remava e nadara até a margem. O barco o rio levara para o mar, seu amigos gritavam do iate que os acompanhavam zombando. Encontrou-o ensopado. Com a roupa grudada no corpo atlético. Alexandre quase ficou sem ar quando o rapaz retirou a roupa molhada para torcê-la. A camisa de algodão revelou-lhe uma pele clara e músculos rígidos. Poucos pêlos delimitavam-lhe o peitoral e desciam pela barriga estreita até regiões pudendas.

    Alexandre contou-me que não conseguia parar de olhar. Eu o proibi imediatamente de passar na rua da Hamburguesa novamente. Avisei-lhe que ele deveria evitar o contato com o jovem alemão. E ele cumpriu o quanto pode. Mas sua mãe, sem saber do que afligia o filho, reclamou que as moedas da Hamburguesa estavam fazendo falta. Por ordem da mãe, semanas depois, Alexandre batia palmas na porta da casa da família alemã e é atendido pelo próprio August.

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Ernest Hemmingway