Alexandre
estava caminhando pelas estradas arenosas da Cidade do Natal carregando seu
tabuleiro, coberto com o pao branco de algodão cru que o cobriu quando
nascera, cheio dos quitutes que agora sua mãe produzia na casa as beiras do
Tiçuru
quando passou em frente a casa da senhora Anna Marceline Wilherrn, que morava
atrás da matriz, apelidade de Hamburguesa pela cidade porque nascera em
Hamburgo, na Alemanha. Ela estava a janela, aproveitando a luz para fazer
bordados quando Alexandre chegou ao portão
de baixo.
- Algum biscoito de polvilho hoje,
dona Hamburguesa?
Ofereceu o mulato.
Ela sorriu e colocou seu bordado de
lado e levantou-se. Caminhou lenta até a janela e sorriu entre as trepadeiras
bem cuidadas do jardim.
- Tem alfinim hoje, Alexandre?
- Temos sim senhora, madama.
- Então me espere um pouco, neguinho.
Alexandre ouviu o farfalhar das
saias descendo as escadas. Ela chegou com uma bolsa pequena, de onde tirou uma
moeda e colocou na mão
do vendedor.
- Meu filho chegou de Recife. Meu
amado August. E ele adora alfinim.
Alexandre sorriu e enquanto baixava
o tabuleiro lembrou-se há quanto tempo não
via August pela cidade. Não
que fossem amigos. O menino loiro e de olhos verdes, alemão, frequentava a Igreja da
Matriz, a escola e remava no rio Grande. O mulato caminhava pelas areias
quentes, ia ao Rosário e se banhava no Tiçuru.
Mas a cidade dos reis era pequena e era impossível não conhecê-lo.
Mas quando ele passou o pequeno
pacote de biscoitos para a senhora alemã, e August apareceu a porta do palacete
buscando sua mãe a surpresa não pode deixar de ser sentida.
August crescera. Era agora um homem
alto e musculoso. As remadas no leito do rio dos camarões deixaram-no com
costas largas, peitoral forte e braços grandiosos. Usava uma camisa fina de
cambraia e suas calcas negras quando apareceu na porta. Praticamente nu.
- Menino, vá vestir-se!
Gritou Anna.
- Onde a senhora deixou minha
casaca?
Respondeu ele, com um sorriso que
enrubesceu Alexandre.
- Em cima da sua cama!
Disse a mãe.
- Não encontrei nada lá.
Respondeu o filho.
- Esses meninos... – disse Anna dirigindo-se
a Alexandre – obrigado pelos biscoitos!
- Tenha um bom dia, dona Anna.
- Tu também, Alexandre.
E virou-se subindo as escadas.
August esperava em cima dos últimos degraus pela mãe, abotoando os ultimos
botões, escondendo os pêlos do peitoral, quando ela chegou ao seu lado, o
último botão do colarinho foi fechado.
O movimento das mãos de August
foi acompanhado pelos olhos de Alexandre que mesmo continuando sua caminhada
para vender os quitutes de sua mãe não conseguia desgrudar os olhos do filho pródigo
natalense. Viu o jovem alemão apoiar a mãe para entrar dentro de casa e, antes
de entrar, olhar ao redor e ainda encontrar os olhos com os dele. Uma
eletricidade percorreu seus olhares quando eles se tocaram, mesmo tão longe,
principalmente quando August sorriu e um arrepio atacou a nuca do mulato.
Quando a porta foi fechado, Alexandre estava arrebatado.
Mas ele não sabia ainda. Não sabia
que cometera este pecado nefando. Alexandre era inocente, isso com certeza era.
Passou a passar na casa da Hamburguesa todos os dias e oferecer a ela o alfinim
que ela comprava quase todos os dias para o filho. Mas nem sempre August estava
em casa para ser contemplado pelos olhos de meu pupilo.
Um dia, em confissão, Alexandre
contou-me como se sentiu abalado quando encontrou o jovem Wilherrn na Ribeira.
Havia caído do caiaque que remava e nadara até a margem. O barco o rio levara
para o mar, seu amigos gritavam do iate que os acompanhavam zombando.
Encontrou-o ensopado. Com a roupa grudada no corpo atlético. Alexandre quase
ficou sem ar quando o rapaz retirou a roupa molhada para torcê-la. A camisa de
algodão revelou-lhe uma pele clara e músculos rígidos. Poucos pêlos
delimitavam-lhe o peitoral e desciam pela barriga estreita até regiões
pudendas.
Alexandre contou-me que não
conseguia parar de olhar. Eu o proibi imediatamente de passar na rua da
Hamburguesa novamente. Avisei-lhe que ele deveria evitar o contato com o jovem
alemão. E ele cumpriu o quanto pode. Mas sua mãe, sem saber do que afligia o
filho, reclamou que as moedas da Hamburguesa estavam fazendo falta. Por ordem
da mãe, semanas depois, Alexandre batia palmas na porta da casa da família
alemã e é atendido pelo próprio August.