Google+ Estórias Do Mundo: março 2012

sexta-feira, 30 de março de 2012

Homem de Atenas

, em Natal - RN, Brasil
Eu e o Peter Pan chegamos as 3h da manhã naquela sexta-feira na Vogue. Eu já estava bebendo desde as 16h da tarde, quando abri a primeira lata de cerveja ajudando o Bobtuso a preparar a festa surpresa para o namorado dele. Decorei o salão com o tema "festa infantil", balões e pirocoptéros, chapéus de papel e línguas-de-sogra, e arrumei mesas ouvindo Beyoncé no iPod, ajudei a arrumar as comidas que os convidados traziam, três mesas de doces, brigadeiros, torta de limão, bolo de aniversário de morango e chantilly, cupcakes kosher de rum; outra estação de pratos salgados, patês, cachorro quente de soja, cachupa, nachos e batata-frita e arroz com passas. Era muita comida. Bebida também: garrafas de vodca, rum, tequila e licor de jabuticaba, mais muitas cervejas. Os convidados demoraram a chegar, o aniversariante também. Mas completamente surpreendido pela festa ele chegou, assustado e vermelho. Ficamos lá, sentados, conversando, durante toda noite, comendo até se fartar, bebendo até não aguentar. Foi quando o Peter me ligou, por volta de meia-noite já. Perguntando onde eu estava. Contei-lhe da festa surpresa, e ele crash over.
Ficamos lá até os últimos convidados saírem. Porque sou do tipo que fica até o final para ajudar na faxina. Levamos a comida e a bebida que sobrou para o apartamento do Bobtuso, ainda tomei um banho por lá e, em seguida, saímos para a boate. Era tarde, e eu não esperava nada demais, ia por insistência do Peter Pan. Ao entrar decidi que já havia bebido demais e comprei apenas fichas para refrigerantes. Gosto do sistema de fichas da Vogue, você chega e compra o que vai consumir, e vai trocando no bar, no fim, não existem filas para sair da boate, o que é sempre uma vantagem imensa. Na boate, o primeiro ambiente, com música ao vivo e uma banda de samba-reggae com dois dançarinos musculosos dançando ao lado de um cantor de pernas finas, estava lotado. Muito lotado! Achei então que a boate estava bem cheia. No entanto, no segundo ambiente, em que o dj toca, poucos dançavam na pista. Encontrei um único amigo lá e perguntei se as pessoas já haviam ido embora. Ele respondeu que não. Que a noite toda fora daquele jeito.

Estava ainda no meu primeiro guaraná quando reencontrei um menino que deu em cima de mim semanas atrás quando eu ainda estava com o blogueiro que contei aqui (é, o verbo está certo, "estava"). Eu havia o dispensado quando ele, bem direto, me pediu um beijo. Eu beijei-lhe a bochecha e disse que era o único beijo que eu poderia dar-lhe. Ele se aproximou, dessa vez, e perguntou: "Estou com mais sorte hoje?". Eu sorri e como não tenho mais nenhum compromisso o beijei. Ele tem um sorriso bonito. Ele é negro, magro, com uma bunda bonita, boa de apertar. Tinha no máximo 19 anos. Um menino que ficava admirando minha barba e sorria quando encontrava a minha barriga com a ponta dos seus dedos finos. Foi quando ele encontrou os pêlos do meu peito que falou: "Gosto de homem assim, que parece homem!". E me beijou, me empurrando contra a parede, o que aproveitei para colocar minha mão por dentro de sua calça e sentir a pele coberta por uma fina penugem de suas nádegas. Ele, porém, foi embora logo. Seu amigo chegou dizendo que eles já estavam indo, "É tarde, João, temos que ir", e eu olhei no relógio: 4h. Ele me puxou até a porta da boate para um último beijo e saiu com seu amigo.
Foi quando eu voltei para a frente do palco. Peguei outro guaraná e fiquei conversando com o Peter Pan e ouvindo a música que a banda de samba-reggae que tocava, tentando observar a ligação entre a coreografia dos dançarinos e a letra da música, que notei inexistente. Lembrei das minhas aulas de dança, quando me foi ensinado que a coreografia devia contar uma estória, lembrei de inclusive bandas de samba-reggae como o É o Tchan que faziam isso com qualidade sim. Criando novos passos e absorvendo elementos de outras danças de salão para dentro da coreografia, agora eu observava aqueles dois homens, muito bonitos sem dúvida, dançando ali, mas percebia que não havia absolutamente nada de novo no que eles faziam. Conversando sobre isso com o Peter comprei uma Fanta e do bar eu observei um menino sambando do lado do palco, de costas para mim. Um corpo bonito, uma bunda redonda e bem feita, que ele rebolava. De fato, prendeu minha atenção.
Foi quando ele virou-se para mim e sorriu. Eu respondi fazendo o mesmo e um sorriso como tréplica soou como um convite para que eu me aproximasse. Sentei-me do seu lado e tentávamos conversar, mas o barulho da banda não permitia e eu o convidei para sentarmos no terceiro ambiente da boate, um videobar com cadeiras de metal e um único banheiro unissex. Sentamos e ele falou que era tímido e contou que tinha 21 anos e se chama Israel. "Então, se você é tímido quer dizer que eu que tenho que tomar a iniciativa para te beijar?". Ele sorriu e respondeu que sim. E eu puxei sua nuca para perto de mim e nossos lábios se tocaram pela primeira vez. Foi um beijo que começou suave e foi pegando fogo. Quando o incêndio se instalou ele sentou no meu colo, e minhas mãos buscaram sua bunda instintivamente, ele passava a mão no meu cabelo, e eu mordia seu lábio inferior, ele então me segurou a cabeça com as duas mãos e eu vi sua pele indígena contrastando com a minha pele branca e seus olhos de um castanho profundo me olhando. Ele sorriu. Um sorriso bonito e largo. Eu o beijei de novo, e ele rebolava no meu colo. Foi quando o amigo dele apareceu do nosso lado o chamando para ir, nos levantamos e ele me puxou pela mão até seus amigos os quais me apresentou e me pediu que o levasse até a porta também. Na volta eu olhei no relógio e vi que já eram 5h da manhã e reencontrei o Peter que conversava com um amigo nosso em comum. "Vamos embora, Peter?".
No carro, ao fechar o cinto, virei-me para o Peter e falei: "Será que eu devia adotar a pedofilia, não, minto, a pederastia?". Ele apenas me olhou esperando mais informação. "É que pedofilia é você ficar com pessoas menores de idade, não é?". Ele concordou. "Pois então, a pederastia é o que os homens de Atenas faziam aos 30 anos que sempre eram ativos com os meninos entre 18 e 20 anos". Ele gargalhou, mas reclamou. "Ah, não, mais competição p'ra mim?". Agora era minha vez de rir. "Ora, desde que eu adotei esse visual com cabelo raspado e barba, essa faixa etária tem dado tanto em cima de mim... eu os evito, por causa de um preconceito meu, de pensar que um relacionamento com alguém tão novo não vai dar certo". Ele mantinha-se em silêncio. "Eu quero um namorado que tivesse maturidade o suficiente para saber que, por exemplo, ele deseja ficar comigo, sabe?, que não ficasse fazendo joguinhos de conquista". Ele nem ligara o carro ainda me ouvindo falar. "Fora que não tenho paciência p'ra alguém que não sabe o que quer, né?". Peter continuava em silêncio, apenas girou a chave do carro e saímos, eu olhei pelo vidro e perguntei ao dia que começava a nascer: "Será que vale a pena eu voltar a tentar conquistar alguém, me dar a esse trabalho, e investir nestes meninos?".


terça-feira, 27 de março de 2012

Índia: O Filho de Duas Rainhas

, em Natal - RN, Brasil

Em algumas versões do Krittivasa Ramayana, o mais popular texto bengali, escrito pelo Lorde Ramachandra, uma encarnação de Vishnu, e no Padma Purana, existe uma narrativa interessante sobre duas rainhas que conceberam uma criança juntas, sem a presença masculina. Quando o famoso rei da Dinastia do Sol, Maharaja Dilipa, morreu, os demi perceberam que ele havia morrido sem um filho para continuar sua linhagem. Lorde Shiva então apareceu diante das duas rainhas viúvas e falou que elas teriam um filho. As rainhas então perguntaram: "Como seria possível se somos víuvas?". O deus então ordenou: "Vocês duas façam amor juntas e pela minha benção você terão um belo filho". As duas esposas do rei, com grande afeição uma pela outra, executaram a ordem de Shiva até uma delas conceber uma criança. Infelizmente, a criança nasceu sem os ossos por causa da ausência da potência masculina no corpo da criança. Uma das rainhas então chorou, gritando: "Porque Shiva nos abençou com tal criança?". As rainhas então decidiram abandonar a criança nos bancos de areia do rio Sarayu, onde foi encontrada pelo sábio Astavakra. O sábio abençoou a criança restaurando sua saúde, dando-lhe também força e beleza digna de Madana, o deus do amor, e este continuou a dinastia. Astavakra foi quem batizou a criança como Bhagiratha, aquele que nasceu de duas vulvas. 
Bhagiratha tornou-se rei e é creditado a ele trazer à Terra o rio Ganges das estrelas. Esta estória do Sri Bhagiratha Maharaja é contada no poema épico Bhagavata Purana (9.9). Três dos seus antepassados já haviam tentado e falhado em trazer o Ganges para a terra. Ele só conseguiu, no entanto, após severas austeridades pelos quais passou e que satisfizeram o Ganga-devi, deus do rio Ganges. Bhagiratha conseguiu também a resistência necessária para suportar a grande força da descida do rio sobre sua cabeça. O rio Ganges é considerado puro porque toca as flores de lótus plantadas por Vishnu e até o hoje o rio flui pelo subcontinente honrando os milhões de hindus.



sexta-feira, 23 de março de 2012

Quem Cala, Consente

, em Belo Horizonte - MG, Brasil
A famosa liberdade de expressão, clamada de forma tão veemente no Brasil por jornalistas, os donos da Rede Globo de Televisão e evangélicos, não significa que podemos falar qualquer coisa. Ela precisa, também, de leis que a regulem. Precisa de limites para que um cidadão seja protegido do outro, afinal isto não é uma anarquia. Acho a anarquia belíssima, pois, segundo seus idealizadores, o que corrompe o homem, que já nasce bom, é a sociedade, os governos, as leis. Infelizmente acredito no exato posto. O homem nasce mau. Sem moral ou ética. Sem qualquer traço de bondade. Contudo, vivendo em sociedade, sob um governo que dita leis e pune infrações, contemos nossos impulsos primevos. É por isso que a liberdade de expressão, ao ser garantida (sempre com o objetivo de permitir que tudo possa ser questionado e abertamente discutido), também precisa ser mediada. Porque o homem é mau e qualquer liberdade em demasia se tornará uma arma contra outro ser humano.
Se, então, a liberdade de expressão usada sem limite é um perigo, estaríamos dizendo que a censura é uma benção? Qualquer um no Brasil com mais de trinta anos, com certeza, vai se arrepiar com a possibilidade de uma resposta positiva para esta pergunta. Mas, convenhamos, alguma censura é sim necessária. Há um limite. Tem que haver.
O caso do Projeto de Lei Complementar 122 e as igrejas evangélicas tem deixado, ultimamente, isso muito claro. As igrejas são contra o projeto não porque ele fere o conceito constitucional pétreo da liberdade religiosa, ao contrário do que propagam. O Direito de manifestar fé em Jesus Cristo não pode e não faz parte da matéria do projeto. O temor evangélico é ver tolhido o seu direito de falar aberta e claramente sua aversão ao "homossexualismo". A grande questão, neste caso, que permeia o discurso destas igrejas é: Até onde vai o direito do evangélico de ser contra o homossexual e onde começa o momento em que ele estará se tornando preconceituoso?
Uma linha tênue da moralidade social é posta em evidência. Isto porque na sociedade capitalista pós-Apartheid nenhum preconceito é mais tolerado. No entanto os preconceitos de raça (negros, índios e judeus), de gênero (mulheres), a xenofobia (nordestinos, árabes e hindus), os portadores de necessidades especiais (Síndrome de Down, cadeirantes, surdos, mudos, etc.), entre outros, são absolutamente mais claros. Não tem como dizer que você não é a favor de negros casando com brancos, por exemplo, sem estar sendo racista. A dúvida evangélica se torna, para eles, mais perturbadora: É possível ser contra a prática homoerótica (elemento importante de sua fé, dado o número de convertidos ex-homossexuais que eles alardeiam) sem ser preconceituoso, isto é, sem estar cometendo um crime? De fato, a única forma de ser contra os homossexuais e não ser preconceituoso é dizer: "Olha, eu provei e não gostei". O que coloca qualquer pastor numa situação extremamente desconfortável. Aí que nasce todo este problema que vemos explodir na nossa Câmara dos Deputados e Senado.
Não obstante os evangélicos seguirem pela apelação dramática do "fim da liberdade religiosa no Brasil", eles sabem que o projeto atinge somente o seu direito a expressão. Eles sabem que o projeto não pode obrigá-los a casar homossexuais, por exemplo, afinal o Estado não tem poder de fazer com que a Igreja Católica case homens e mulheres que já se divorciaram, apesar da contração de segundas núpcias, após o divórcio, ser permitido pelas leis brasileiras. Eles, os pastores evangélicos, sabem! Eles sabem que tudo resolveria se eles se calassem, mas eles entendem o perigo, e é isso que eles mais temem, afinal quem cala, consente.

terça-feira, 20 de março de 2012

Experiência Cultural

, em Natal - RN, Brasil
Este texto é uma homenagem ao Bruno, que veio me visitar aqui em Natal e sofreu bastante com a diferença cultural. Eu acabei me tornando o tradutor dele na maioria das conversas. 


Dois amigos gays estão na parada de ônibus quando o celular de um toca:
- Digaê, galado! Falam do outro lado da linha.
- Fala, galado.
O outro amigo fica atendo a conversa.
- Esse omi é muito arrombado mermo! Dizem novamente do outro lado da linha.
- Eita píula! O que foi que eu fiz, caba?
- Ah, a boyzinha que esse omi pegou na resenha de ontem. Esse galado é um afulibado mermo.
- Num é p'ra fazer pabulagem não, mas a doidinha era gostosa divera...
- Pois enquanto 'cê pegou só essa boyzinha, eu peguei umas três rapariga num brega lá na baixa da égua...
- Divera, boy?
- Divera, omi! Mas a gente sabe que esse omi é um cagado mermo! Enquanto a gente fica na bronha, esse omi sempre descola uma doidinha cabaço p'ra bulir...
- N'é assim também não, caba. Até porque boyzinha cabaço só rola canjerê no final. Melhor só cherar o cangote de uma doidinha no forró, ficar no sarro, do que bulir e ter aquela caninga no teu pé. Mas, mudando de assunto, eu bem que vi 'ocê se chamegando p'ra uma lá.
- Iapois, eu já tava com o grau, n'é? Já tava dando até entojo. Fiz aquele bafulê de bebida da bixiga. Ai eu imboquei num chafurdo que eu não sei como, só sei que começou porque eu tava agarrado com uma doidinha lá. Pior que a doidinha tinha namorada, boy. A sapatão ficou enfesada! Queria sair já nos catiripapos!
- E como tu saiu dessa, boy?
- Ixe, omi! Eu não ia sair batendo em mulher n'é? Ai tentei sair na maciota,  sabe? Mas pior que não deu! A sapatão me pegou e me lasquei todinho. Ai eu fui me defender, mas quem disse que eu consegui. Fiquei lesadinho! Só sei que sai de lá todo reado.
O rapaz que conversava no telefone na parada gargalhou alto naquele momento, mas também notou que o outro olhava estranho para ele. Parecia curioso com o rumo da conversa da qual ele consegui ouvir muito pouco, mas ainda conseguia.
- E o pior é que quando cheguei em casa levei um esbregue da minha mãe. E riu alto do outro lado do telefone. 
- Votz, e por quê!?
- Ah, porque além de chegar da resenha todo torado por uma sapatão, melado, eu ainda trisquei no carro do meu pai na hora de estacionar o carro na garagem.
- De subejo, lascô!
- Pois é, 'tô c'a bixiga!
Nesse momento o outro amigo começou a rir.
- Omi, tenho que desligar aqui.
- 'Tá certo, galego! Depois a gente se fala então. 
O que estava no telefone desligou o celular e virou-se para o amigo perguntando-lhe:
- Que houve?
- Ah, mesmo? - e fez uma pausa dramática - Mulhé, melhore! Pelo... Amor... diDeus! A sinhora ai dando o L pr'o KF p'ra dizer que é HT? 
- Ah, vá se rear!

TRADUÇÃO

Dois amigos gays estão na ponto de ônibus quando o celular de um toca:
Fala, cara! Falam do outro lado da linha.
- Fala, cara.
O outro amigo fica atendo a conversa.
- Esse cara é muito sortudo mesmo! Dizem novamente do outro lado da linha.
- Eita porra! O que foi que eu fiz, cara?
- Ah, a menina que esse cara pegou na festa de ontem. Esse cara é bom mesmo.
- Num é p'ra me gabar não, mas a menina era gostosa de verdade...
- Pois enquanto 'cê pegou só essa menina, eu peguei umas três prostitutas num bordelem um lugar muito longe...
De verdade, cara?
De verdade, cara! Mas a gente sabe que esse cara é um sortudo mesmo! Enquanto a gente fica na masturbação, esse cara sempre encontra uma menina virgem para desvirginar...
- N'é assim também não, cara. Até porque menina virgem só rola confusão no final. Melhor só cheirar o pescoço de uma menina no forró, ficar se agarrando, do que tirar sua virgindade e ter aquela perturbação no teu pé. Mas, mudando de assunto, eu bem que vi 'ocê dando em cima de uma lá.
Pois, eu já tava bêbado, n'é? Já tava dando até vontade de vomitar. Fiz aquela misturada de bebida da porra. Ai eu entre numa briga que eu não sei como, só sei que começou porque eu tava agarrado com uma menina lá. Pior que a menina tinha namorada, cara. A sapatão ficou com muita raiva! Queria sair já caindo de porrada!
- E como tu saiu dessa, cara?
Ah, cara! Eu não ia sair batendo em mulher n'é? Ai tentei sair como se nada estivesse acontecendo sabe? Mas pior que não deu! A sapatão me pegou e sai todo machucado. Ai eu fui me defender, mas quem disse que eu consegui. Fiquei abobalhado! Só sei que sai de lá todo machucado.
O rapaz que conversava no telefone na parada gargalhou alto naquele momento, mas também notou que o outro olhava estranho para ele. Parecia curioso com o rumo da conversa da qual ele consegui ouvir muito pouco, mas ainda conseguia.
- E o pior é que quando cheguei em casa levei um esporro da minha mãe. E riu alto do outro lado do telefone.
- Eita, e por quê!?
- Ah, porque além de chegar da resenha todo torado por uma sapatão, melado, eu ainda trisquei no carro do meu pai na hora de estacionar o carro na garagem.
- Por fim, se fudeu!
- Pois é, 'tô com ódio!
Nesse momento o outro amigo começou a rir.
Cara, tenho que desligar aqui.
'Tá certo, loiro! Depois a gente se fala então.
O que estava no telefone desligou o celular e virou-se para o amigo perguntando-lhe:
- Que houve?
- Ah, mesmo? - e fez uma pausa dramática - Mulher, melhore! Pelo... Amor... de Deus! Você ai mentindo pr'o cafuçu p'ra dizer que é hétero?
- Ah, vá se fuder!

sexta-feira, 16 de março de 2012

Tentativa de Fuga

, em Natal - RN, Brasil
Eu subi no ônibus cantarolando a última música do ensaio do coral que faço parte daquela noite. Pisei no primeiro degrau repetindo a nota final de agnus dei, qui tollis pecata mundi para não esquecer que ela é a mesma que começa miserere nobis. Cantava baixinho quando paguei os R$ 2,20 da passagem e ouvi a máquina anunciar aos outros passageiros "inteira". Até ali, não havia reparado em quem estava dentro do ônibus, somente em uma menina de batom vermelho, sentada ao lado do cobrador, que reparava na marca da minha camisa pólo. Ao, no entanto, cruzar a roleta, me deparei, frente a frente, com ele. Olhos escuros, de ressaca, loiro, alto e com músculos que se faziam aparentes na manga da camiseta que usava. Ele me olhou no fundo dos olhos e como uma vítima hipnotizada eu me deixei ficar dentro deles por alguns segundos. Mas me recuperei, me recuperei e fui para o fundo do ônibus. Longe dele.
Eu continuava cantando, em pé, no fundo do ônibus, resolvi não sentar, o fundo do ônibus estava lotado de adolescentes vindos da escola. Agnus dei, quie tolli pecata mundi, dona nobis pacem, baixinho. Quando vejo os mesmos olhos magnéticos me sugando lá da frente do ônibus. Resolvo sentar, entre os estudantes mesmo. Pensava eu com meus botões abertos que aquilo não tinha como resultar em coisa boa. Sentado, desta vez reparei em um menino, também loiro, não mais de quinze anos, de lábios bem rosados. Reparei que ele virou-se no banco, dando as costas para a frente e virando-se para mim. Ele me encarava sem vergonha, como os adolescentes costumam fazer, ao mesmo tempo que continuava conversando animado com seus amigos de escola. Ele ainda estava com seu fardamento, uma escola católica administrada por freiras. Até que ele sorriu para mim. Somente o canto esquerdo de sua boca subiu, mostrando os dentes brancos e movendo junto sua sobrancelha. E eu baixei a cabeça, abri minha pasta de partituras e fiquei relembrando mentalmente a nota de mundi que continua em miserere, até chegar o meu ponto, onde levantei, me preparando para sair.
Caminhei no ônibus olhando para frente, fugindo do olhar do adolescente, a porta ficava no meio do caminho, mas de pé, encontrei outro olhar que esbarrou no meu e demonstrando surpresa passou a me admirar interessado. Moreno desta vez, com cachos caindo sobre sua testa, olhava-me com insistência, porém desceu antes que eu precisasse fugir. Mas desceu no mesmo ponto que eu. Ao descer, eu o vi ainda parado por lá, como se esperasse por algo. Olhava para o horizonte, tentando parecer, imagino, que não esperava ninguém em específico, talvez um segundo ônibus. Todavia, no momento que eu passei por ele, miserere nobis, miserere nobis, eu percebi que ele começou a me seguir. Vinha conversando no telefone, falava bem alto, mas eu não prestei atenção a nenhuma de suas palavras, até que passamos pela esquina de uma rua escura, ele do meu lado, virou-se rápido para mim, dizendo: "Eu vou por aqui, me segue?". Eu fingi que nada acontecera e segui meu caminho direto.
Alguns quarteirões depois, entro a esquerda e já estou perto de casa, quando cruzo com um vizinho, o qual eu admirava em minha juventude adolescente. Sem sombra de dúvida, o mais bonito de todos os jovens homens que moravam por ali. E, por anos, brincávamos de um flerte inofensivo que nunca passou de longos olhares, sorrisos e cumprimentos: "Oi, tudo bem?". Ele se chama Mike. E agora o menino bonito que ele fora se transformou em um homem muito bonito. O corpo continua o mesmo de cinco anos atrás, quando deixei Natal, saradíssimo, mas agora ele aparenta a maturidade dos trinta anos que se aproximam. Ele passou por mim e me cumprimentou, eu respondi o de sempre: "Oi, tudo bem?" também. Continuei então meu caminho somente para alguns passos depois ouvi-lo me chamar, pedindo que eu o esperasse. Chegou sorrindo, apertando seus olhos negros que contrastam com sua pele clara. Falou com voz de malandro que a gente se conhecia há muito tempo e apertou minha mão. Dona nobis pacem, dona nobis pacem. E tocou meu ombro, apertando. "Quando vamos marcar esse rolé então? Já está na hora!". Eu tentei balbuciar uma resposta, surpreendido, mas ele antes disse algo: "Aí, boy, ser que tu não tem cinco reais p'ra me emprestar não?".

MORAL DA ESTÓRIA:
Por mais que você fuja, quando algo tem que acontecer, sempre acontece.

terça-feira, 13 de março de 2012

Índia: O Terceiro Gênero

, em Natal - RN, Brasil


O Manusmriti fala sobre as origens biológicas do terceiro gênero, isto é, um gênero colocado entre os dois utilizados por nós, o masculino e o feminino. No capítulo III, verso 49: "uma criança masculina é produzida quando existe uma quantidade maior de semente masculina, uma criança feminina é produzida quando existe uma prevalência da semente feminina; se ambos são iguais, uma criança do terceiro sexo [napumsaka] ou duas crianças gêmeas são produzidas; se os dois são fracos ou deficientes em quantidade, a concepção não se dá". Abaixo vou listar os tipos mais comuns de terceiro gênero encontradas no Hinduísmo. Ele são estimados em, mais ou menos, meio milhão de eunucos crossdressing, associados a vários templos e deidades hindus. Apesar deles serem chamados de eunucos, no entanto, a maioria dessas pessoas (91%) não praticam a castração.


Os Aravani ou Ali
Este é o grupo mais numeroso de terceiro gênero (estimado em 150 mil pessoas). Eles vivem basicamente no sudeste da Índia e são o grupo mais típico. São formados tanto por homens que se tranformaram em mulheres como por mulheres que se transformam em homens. Tem uma importância grande no festival de Koovagam, celebrado entre abril e maio, em homenagem ao deus Aravan, e não praticam a castração.

Os Hijira
Estes são o grupo mais bem conhecido de terceiro gênero da Índia, e estima-se que sejam por volta de 50 mil. Vivem basicamente no nordeste do país, e são o único grupo que pratica a castração, um costume introduzido após a invasão muçulmana no século XX. Inclusive a castração masculina não é recomendada nos Vedas e não aprece em nenhuma outra prática hindu.  Existe uma crença de que os hijiras da Índia seriam hermafroditas (intersex) e que, neste caso, entrariam no comunidade ao nascer ou numa tenra infância, contudo as entrevistas feitas por Serena Nanda em Neihter Man Or Woman: The hijiras of India demonstraram que estes entravam no grupo voluntariamente e sempre após a adolescência.Sinha, em 1967, falando dos hijiras do norte do país, de Lucknow, afirmou que a entrada no grupo costumeiramente acontecia por causa da satisfação dos desejos homossexuais daquelas pessoas. Nanda também afirma: "Não existe a menor dúvida que no fim alguns hijiras - talvez a maioria - são prostitutos homossexuais". Eles são especialmente protegidos pela Bahuchara-devi, deusa que protege os transexuais.

Os Jogappa
O grupo menos conhecido de terceiro gênero da Índia que habitam o sul do país (Karnataka e Andhra Pradesh) e intimamente associado a prostituição. Contudo eles também são grandes dançarinos e participam do culto no templo como devadasis, isto é, servos da deusa, que no caso é Yellamma-devi, deusa extremamente popular em Durga. O  grupo inclui tanto homens que se travestem de mulher como mulheres que se travestem de homens e também não praticam a castração.

Os Sakhi-Behki
Este grupo, que vem se reduzindo ultimamente, era muito comum na região de Bengala, Orissa e Uttar Pradesh. Estas pessoas não são necessariamente transgênero ou homossexuais, em alguns casos são, porém na maioria dos membros deste grupo se vestem como mulheres para reforçar a identidade de sakhis (namorada) de Krishna e para atingir a emoção espiritual conhecida como sakhi-bhava. Recentemente, eles passaram a ser condenados sobretudo porque alguns membros do grupo realizavam shows públicos nos quais para mostrar seu amor a Krishna um sakhi-bekhi tinha relações sexuais com um cudadharis (um homem vestido como Krishna coroado com penas de pavão). Hoje em dia, a maioria dos sakhi-bekhis se veste apenas na privacidade da sua casa, sendo mais discretos, se vestindo como Sri Radha, a consorte de Krishna, mas alguns também tem se vestido como Caitanya, uma imagem que reúne Radha e Krishna juntos e são conhecidos como gauranga-nagaris. Nenhum desses grupos, no entanto, pratica castração.

sexta-feira, 9 de março de 2012

O Verdadeiro Inimigo

, em Natal - RN, Brasil
O Dia Internacional da Mulher, comemorado neste 8 de março, nos faz pensar sobre o inimigo em comum que persegue mulheres e homossexuais: o machismo. Madonna já dizia, em 2000, em What it feels like for a girl que girls can wear jeans and cut their hair short, wear shirts and boots, 'cause it's OK to be a boy, but for a boy to look like a girl is degrading, 'cause you think that being a girls is degrading. E nestes versos explica-se a origem de toda a homofobia na história recente da humanidade. A homofobia, que tem sido a causa da morte de muitos homossexuais, se origina basicamente do rompimento da relação de dominação existente entre homens e mulheres em nossa sociedade ocidental (falo ocidental porque a homofobia em países árabes, por exemplo, tem uma origem diversa). Em nossa sociedade, os homens se colocam numa posição superior de dono, de dominação, de subjugador, enquanto a mulher é reservado o lugar oposto, de coisa, de passividade, de ser dominado. Esta situação é expressa também no sexo, em que ao homem cabe a posição ativa de conquistador ao qual a mulher, que não gosta de sexo, sede, graças as habilidades extraordinárias dos homens.
O homossexual, no entanto, rompe este paradigma. Primeiro, porque ele se permite subjugar. Este homem, no sexo, se coloca na posição de possuído, de passivo, de fodido. Ele intencionalmente abdica de seu poder de homem para ocupar uma posição feminina. Ele abre mão do seu poder, o que é inadmissível. Outro problema é que, como ele se relaciona com outro homem, a relação entre eles tende a se tornar uma baseada em igualdade, em que ambos tem as mesmas responsabilidades. Não existem papéis pré-definidos. O relacionamento heterossexual, então baseada numa divisão de gênero que tende a se naturalizar, é ameaçada. Os namoros e casamentos gays comprovam que os entre homens e mulheres heterossexuais não são, simplesmente, naturais e que os papeis definidos para cada um deles não foi colocado por Deus. "Disse também à mulher: 'multiplicarei os sofrimentos de teu parto; darás à luz com dores, teus desejos te impelirão para teu marido e tu estarás sob o seu domínio".
O machismo tem como seu modus operandi exatamente criar um modelo de homem e outro de mulher no qual os papéis são colocados e obrigados a serem mantidos sob o risco destas pessoas, que fogem a regra, serem expulsos do sistema. A homofobia também é resultado disso, e ela começa com o bullying homofóbico. O bullying é a reação infantil de exclusão de outra criança que não cabe dentro do modelo machista. Em outras palavras, o bullying parte sempre de uma criança que é educada a acreditar que os papéis para homens e mulheres são claros e opostos, preto e branco, que existem comportamentos que só podem ser realizados por homens e outros apenas para mulheres. Esta criança então, de repente, na escola, local onde ela realiza sua primeira socialização, é exposta a uma outra criança que não cabe nas expectativas dela. Exposta a uma menina que não combina com o que ele considera como feminina, ou um menino que não corresponde ao papel de "macho" que ele foi ensinado a esperar. Um exemplo simples: é um menino que apesar de heterossexual é chamado de viadinho na escola porque não gosta de futebol. As outras crianças foram educadas, por seus pais, a acreditarem que todo homem gosta de futebol, para ser homem então, acreditam eles, que é necessário gostar de futebol.
O machismo ataca as mulheres que se recusam a assumir o papel que as reserva. Mulheres apanham de seus maridos porque tentam ocupar um espaço que não lhes pertenceriam, maridos acabam casamentos porque suas esposas passam a ganhar mais que eles, empresas pagam 40% menos para mulheres que ocupam o mesmo cargo que homens. O machismo também persegue os homossexuais exatamente porque estes homens também se recusam a seguir esse modelo. Ironicamente, o machismo faz uma exceção, no caso dos homossexuais. O gay que continua participando da regra machista,  o que continua a replicando, isto é, o que fala "eu sou gay, mas sou homem", ele se torna permitido neste ambiente. Não aceito, mas sua existência não é mais uma ameaça porque ele continua apoiando o machismo e garantindo sua existência. Por isso mesmo, não é a toa, que os homossexuais que mais rompem com o paradigma do homem macho, os travestis e efeminados, são os que mais são atacados em crimes de motivação homofóbica e que, normalmente, terminam em morte. Do outro lado, as lésbicas, uma segunda exceção, são permitidas porque elas são encaixadas na fantasia do harém (nada mais machista) e na certeza de que elas, quando encontrarem o homem que lhes falta, abandonaram esta vida. 
O Dia Internacional da Mulher precisa ser comemorado também pelos homens homossexuais, a mesma luta precisa ser feita. Todos os homossexuais precisam também se erguer para defender as mulheres, porque lutar pela igualdade entre homens e mulheres é também lutar para o fim da discriminação que sofremos todos os dias. 




terça-feira, 6 de março de 2012

Aplauso aos Parlamentares

, em Natal - RN, Brasil
Caros senhores, parlamentares desta nação, eu não vim aqui para acusá-los de homofóbicos, palavra tão feia, muito menos vim para dizer-lhes o quanto é segregador este discurso de que gays, lésbicas e seus congêneres não são normais; também não vim implorar pelas crianças que se suicidam por causa do bullying homofóbico ou relatar que mais de duzentos crimes com expressa motivação homofóbica ocorrem anualmente neste pais e que pessoas como eu e meus amigos correm risco de vida simplesmente por existirem. Eu não vim aqui para isso, vim aqui para aplaudi-los. 
Aplaudo vosso trabalho, senadores, deputados e vereadores do pais em que nasci e vivo. Aplaudo porque é óbvio que os heterossexuais precisam de proteção contra a horda de viados que vem invadindo a pacata nação brasileira. Nos meus 30 anos de vida vejam o quanto tudo mudou. Vejam, nos anos 80, somente Rogéria e Roberta Close eram permitidas na TV; os anos 90 adicionaram Vera Verão ao circo, e hoje, além de mostrarem casais homossexuais que são praticamente "normais" (as aspas é porque se é um casal gay é óbvio que o adjetivo normal não se aplica), querem permitir o beijo gay na TV, em frente as inocentes crianças heterossexuais de vossas senhorias. Outra coisa, na década de 1980 ser gay era o que deveria ser: vergonhoso! Os militares, através da Delegacia de Ordem Política e Social, prendiam-nos, os desviados, por vadiagem. Isto sim um trabalho digno. E agora, nós, gays, nos atrevemos a ter orgulho do que somos, orgulho o bastante para não ter vergonha de demonstrar afeto em público àqueles que amamos. Nós tivemos a ousadia de sair do gueto, de criar bares e boates tão sofisticados que atraíram os filhos héteros das boas famílias brasileiras. E tivemos a empáfia de permitir que vocês convivessem em paz em nosso meio. Por isso, vos aplaudo.
Diante desta situação ridícula de ditadura gay que se instalou era imprescindível que os defensores de Deus, da família e da nação tinham que agir. A bomba na parada de São Paulo e os ataques na Av. Paulista deveriam ter nos servido de aviso. O tiro nas costas de um viado no Rio também. Vocês nos avisaram para voltarmos ao nosso lugar, nos avisaram que não permitiriam que tomássemos o que é de vocês por direito. Vocês então aprovaram o dia do orgulho heterossexual, com toda razão, pena que o viado do Kassab vetou. Mas eu ainda aplaudo a perseverança de vossas senhorias.
Senhores parlamentares há algo mais nacionalista do que ignorar a Organização Mundial da Saúde, órgão da ONU, ou seja, completamente subserviente ao controle dos demoníacos norte-americanos, e propor que a homossexualidade volte a lista de doenças mentais, volte a ser homossexualismo, como vocês sabiamente sempre a trataram. Aplausos! Também é necessário mostrar ao Conselho de Psicologia que eles não têm o direito, em um estado democrático, de serem independentes em relação ao Estado. Um autarquia? Anarquia isso sim! Um psicólogo não deve tratar o distúrbio egodistônico que faz com que o homossexual não se aceite como é, deve tratar a raiz do problema. Se ele não fosse homossexual, não sofreria com o preconceito e não sofreria também pelo seu próprio preconceito, a culpa é do homossexualismo. Por exemplo, se o menino que se suicidou na escola em que eu trabalhava por que era gay não teria se matado se fosse hétero, por que ele não sofreria nenhum preconceito, então o correto é tratar seu homossexualismo e poupar-lhe tanto sofrimento. Eu sinceramente vos aplaudo, parlamentares brasileiros. Só que não!

sexta-feira, 2 de março de 2012

"Amor à Distância"

, em Natal - RN, Brasil

And you and I climb, crossing the shapes of the morning
And you and I reach over the sun for the river
And you and I climb, clearer towards the movement
And you and I called over valleys of endless seas
Yes - And You And  I



Sinto-me meio estranho ao sentir isso, não em expressar, é tolice ter algum problema em expressar algo que já se sente, mas é estranho sentir. Ele está tão longe, nunca nos vimos, mas as conversas diárias são esperadas ansiosamente, "Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz" e elas fazem uma imensa falta quando não acontecem. Contudo, me sinto estranho por esta presença me afetar tanto. Por que não é uma presença, ele não está aqui. Ele são letras no MSN e uma voz no telefone. Ainda não é uma pessoa, não posso lembrar de nossos momentos juntos, apenas posso sonhar com o futuro (que por mais que doa pensar assim) talvez não aconteça. Não sabemos do porvir, algo pode se interpor aos planos que fazemos nestas madrugadas.
Nada disso, de fato, é real. E é isso que eu acho estranho, porque não sinto assim. Sinto como se ele estivesse próximo, do jeito que ninguém jamais esteve, ele entende o que eu penso e até reconhece minhas idiossincrasias, no fim, sempre parece que nós nos encontramos todo dia, e sentamos juntos, enquanto tomo um chá e ele uma xícara de café, e conversamos sobre nosso dia. Também não parece que não temos momentos juntos porque quando saio aqui em Natal, sozinho, acabo por leva-lo comigo, junto a meus pensamentos, e questões sobre como ele agiria, como faria, o que pensaria, o que diria, será que gostaria, pipocam o tempo todo na minha mente. Parece que tenho memórias ao lado dele, porque ele está comigo sempre. Do meu lado, no meu coração. Apesar de estar tão longe, nunca esteve tão perto.